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Ao entrar em um curso de formação profissional para docência, o futuro profissional traz consigo um repertório de aprendizado adquirido por meio de observações de professores e, possui concepções sobre o que é ser professor, a partir de experiências pessoais vividas no papel de aluno (Graça, 2014). Esse processo de socialização antecipatória, que ocorre a partir das trocas entre indivíduo e sociedade, promove aprendizagens e experiências que capacitam as pessoas para a vida ativa, sendo primordial para a concepção da profissão (Barros, 2011).
Dentre essas aprendizagens anteriores à formação inicial, encontra-se a aprendizagem da ginástica na escola, a qual possui um papel relevante na formação dos alunos. Sua vivência nas aulas de educação física (EF) apresenta forte potencialidade no desenvolvimento de ricas experiências e construção de conhecimento aos educandos (Andrade, Da Silva Rocha, Paraíso Alves & Vinciprova Fonseca, 2016; Ramirez Costa, de Carvalho Macías, Da Cunha Faro & da Silva Matos, 2016). Ainda dentro do conteúdo gímnico, encontram-se as diferentes modalidades de competição, as quais se legitimam como práticas altamente ricas e positivas para o contexto escolar, visto que podem oferecer possibilidades de estimulação e exploração motora, cognitiva, afetiva e social, além de proporcionarem momentos de alegria e prazer aos educandos a partir de uma aula diferenciada e desafiadora (Merida, Nista-Piccolo & Merida, 2008; Soares et al., 2009).
No entanto, diversos estudos evidenciam a ausência do ensino da ginástica na escola. Dentre os principais motivos apontados para esta situação, destaca-se a capacitação profissional insuficiente para este conteúdo, a falta de equipamentos e materiais adequados, a incoerência entre os conteúdos aprendidos na formação inicial e a realidade escolar, a insegurança de trabalhar um conteúdo “perigoso” que pode comprometer a segurança dos alunos e a visão esportivizada da ginástica (Ayoub, 2007; Ramirez Costa et al., 2016; Porto, 2014; Schiavon & Nista-Piccolo, 2007).
Assim, a presença (ou ausência) das ginásticas no período escolar dos sujeitos reflete na formação acadêmica e profissional daqueles que, futuramente, optarem por seguir carreira docente em EF. O repertório de experiências ginásticas aprendidas na vida escolar prepara os futuros professores para a aquisição de novos conhecimentos acerca das modalidades gímnicas, que aprenderão no curso de formação inicial (Barbosa-Rinaldi & Machado de Souza, 2003).
Assim, ao considerar que os alunos que ingressam nos cursos de licenciatura vivenciaram a disciplina EF escolar na sua Educação Básica, surgem os seguintes questionamentos: quais foram as modalidades de ginásticas competitivas vivenciadas pelos acadêmicos do primeiro ano de graduação de universidades públicas do Estado do Paraná? Qual/Quais foi/foram a/as estratégias de ensino vivenciadas pelos estudantes para o desenvolvimento deste conteúdo? Qual é a percepção que eles/elas têm acerca da influência destas experiências na sua vida e futuro profissional? Desse modo, o objetivo do estudo foi analisar as experiências vivenciadas pelos acadêmicos ingressantes de cursos de Licenciatura em Educação Física do Estado do Paraná com a ginástica de competição na Educação Básica.
Metodologia
A pesquisa foi descritiva com abordagem qualitativa dos dados (Cervo & Bervian, 1996). A amostra foi composta por 168 estudantes (84 mulheres e 84 homens) do curso de licenciatura em EF, ingressantes no ano de 2017, em quatro universidades públicas do Estado do Paraná. A idade média dos participantes foi 19,66 anos (desvio padrão 3,68 anos). Como instrumento foi utilizado um questionário com informações sócio demográficas e questões abertas e fechadas sobre o ensino do conteúdo ginásticas de competição no ensino fundamental e médio.
O questionário foi construído para fins desta pesquisa e passou por uma avaliação de conteúdo e clareza da linguagem por parte de três professores de EF, especialistas na área de ginástica. Em cada pergunta, os especialistas indicaram se a questão era: ‘Não válida’; ‘Pouco Válida’ ou ‘Válida’, bem como puderam indicar sugestões ou comentários para a construção do instrumento (Dos Santos & Gheller, 2012). Assim, o questionário foi adequado seguindo as sugestões dos professores especialistas na área.
Para a análise de dados foi utilizada a análise de conteúdo (Bardin, 2011) das informações obtidas a partir das questões abertas e a análise estatística descritiva para analisar as informações sócio demográficas. A pesquisa iniciou-se após a aprovação do Comitê Permanente de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Estadual de Maringá (Parecer n° 2.410.354).
Apresentação e discussão dos resultados
Ao avaliar os dados sócio demográficos, observou-se que dos 168 participantes do estudo, 50 pertenciam à universidade 1 (U1), 39 à universidade 2 (U2), 47 à universidade 3 (U3), e 32 à universidade 4 (U4). Todos os estudantes estavam cursando o 1º ano do curso de EF Licenciatura, 57 no período matutino, 45 à noite e 66 no período integral (curso com aulas no período matutino e vespertino).
Ao analisar o conhecimento que os estudantes tinham sobre ginástica de competição, observou-se que grande parte deles a entendem como uma competição propriamente dita, na qual se classificam e premiam os melhores (85 citações). Também, entendem-na como ginástica artística/olímpica e rítmica (38 citações) e como uma modalidade esportiva de alto rendimento e perfeição técnica (33 citações).
Somente 31 estudantes relataram ter tido ginástica de competição nas aulas de EF na sua educação básica, destes, 21 manifestaram ter vivenciado o conteúdo ginástica artística, 15 ginástica rítmica, 16 ginástica aeróbica e 01 roda ginástica e trampolim acrobático, respectivamente.
Percebe-se que o saber acerca da ginástica de competição dos estudantes está de certa maneira influenciado pela mídia (Araújo, 2017), pois entre as modalidades mais citadas pelos estudantes estão aquelas que possuem maior divulgação na mídia: a ginástica artística e rítmica. É impossível dissociar o esporte da mídia e essa relação vem alterando progressivamente as percepções e o modo como o esporte é praticado (Betti, 1997). Porém, o significado de esporte que a mídia traz não reflete a sua totalidade e isso acarreta em prejuízos para o esporte educacional (Lisbôa & Pires, 2016).
Entre os estudantes que tiveram o conteúdo nas aulas de EF, observou-se oito abordagens metodológicas vivenciadas: a demonstração para posterior execução de movimentos (19 citações); a utilização de vídeos (18 citações); a leitura de textos, livros e pesquisas na internet (16 citações); a criação de coreografias (12 citações); a observação de apresentações (9 citações); os trabalhos em equipes ou pequenos grupos com ajuda e correções entre os próprios colegas (9 citações); a utilização de progressões para o ensino de movimentos mais complexos (7 citações) e a utilização de circuito de aparelhos (3 citações).
Nas abordagens elencadas observa-se certo equilíbrio entre experimentar os movimentos de forma ativa e pensar sobre o movimento. Em estudo realizado com alunos de 8º ano do ensino fundamental, no qual se trabalharam os conteúdos de ginástica artística, acrobática e rítmica, evidenciou-se essa preocupação de englobar as três dimensões do conteúdo (procedimental, conceitual e atitudinal), que estimula o pensamento crítico do aluno, além de fazê-lo refletir sobre a ginástica (Maldonado & Bocchini, 2015).
A ginástica na EF escolar deve ser considerada um tema da cultura corporal, sendo trabalhada, experimentada, problematizada, conhecida e transformada (Marcassa, 2004). A experiência é uma boa forma de aprendizagem da ginástica, pois sua prática desenvolve aspectos cognitivos, motores e sócio afetivos (Ramirez Costa et al., 2016).
Daolio (1996) propõe que na EF escolar, nos anos iniciais, os alunos devem experimentar a maior quantidade possível de gestos motores, entender seus significados e suas formas de execução. Nas séries intermediárias, o aluno deve desenvolver e reconstruir as técnicas esportivas, não enfocando na técnica e sim nas relações com o espaço, com os colegas ou com os materiais. Nas séries finais deve-se ampliar os objetivos da EF, levando os alunos a pensarem hipoteticamente a cultura corporal, compreendendo-a e criticando-a.
As consequências da falta ou presença de vivências na ginástica de competição foram analisadas conforme sua incidência na vida do estudante e na formação profissional (Tabela 1).
Indicadores temáticos das consequências da falta ou presença da vivência da ginástica de competição na EF escolar | Nº de citações* |
---|---|
Consequências para a vida dos estudantes | - |
Falta de conhecimento sobre as características da ginástica e suas distintas modalidades. | 48 |
Falta de conhecimento corporal e motor. | 15 |
Pouco conhecimento ofertado estimulou os estudantes que tiveram o conteúdo a procurar saber mais sobre o assunto. | 07 |
Consequências para a formação profissional em EF | - |
Falta de conhecimento e experiência prática dificulta a aprendizagem na graduação. | 11 |
Não ter a vivência do conteúdo por parte dos professores de EF escolar, desperta novas atitudes para reverter isto no futuro como professor de EF. | 04 |
Não teve consequências para a vida e no futuro profissional na EF | 16 |
Não responderam, pois não tiveram o conteúdo na EF escolar | 25 |
* Os indicadores temáticos podem ter sido citados mais de uma vez, ou nenhuma vez por cada participante. Por isso, neste caso, há menos citações que número de indivíduos participantes da pesquisa.
Fonte: os autores.
A falta de conhecimento sobre as características da ginástica e de suas distintas modalidades (48 citações) e a falta de conhecimento corporal e motor (15 citações) foram as consequências para a vida dos estudantes com maior número de citações. Constatou-se neste estudo, assim como no de Barbosa-Rinaldi e Machado de Souza (2003), que a ginástica não está sendo aplicada como deveria e que a maioria dos alunos nunca teve a modalidade dentro das aulas de EF. É importante frisar que a ginástica é preconizada como um conteúdo a ser tratado na EF escolar pelos documentos normativos da educação básica brasileira (Base Nacional Comum Curricular) (Brasil, 2018) e paranaense (Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Estado do Paraná para a Educação Física) (Secretaria de Estado da Educação do Paraná, 2008). Por outro lado, o pouco conhecimento ofertado estimulou uma minoria dos estudantes (aqueles que tiveram o conteúdo nas aulas) a buscar mais sobre o assunto (07 citações) (Tabela 1). Embora essa atitude de autonomia seja desejada no ensino da EF, pode-se verificar que foi uma minoria do total dos participantes da pesquisa. A EF escolar deve, por meio do conhecimento corporal popular, incitar um conhecimento organizado, crítico e autônomo sobre a cultura humana do movimento (Daolio, 1996). Mas, esse conhecimento autônomo deve ser ofertado para todos os alunos por meio de uma estratégia metodológica planejada.
No caso específico da ginástica, sua prática na escola deveria abrir novas possibilidades de experiências corporais, para enriquecer a cultura corporal das crianças e permitir a significação própria dos alunos (Soares et al., 2009). Mas, não a partir da escassez, senão pela oferta de uma amplitude de experiências.
Entre as consequências da falta ou presença da vivência da ginástica de competição na EF escolar para a formação profissional em EF, os estudantes destacam o prejuízo em relação à experiência para a prática nas aulas da graduação (11 citações). No estudo de Ramirez Costa et al. (2016), de quatorze professores de EF entrevistados, onze afirmaram não trabalhar a ginástica em suas aulas, reafirmando o fato do conteúdo não ser trabalhado como deveria. Pois, de acordo com os documentos normativos da educação básica brasileira e paranaense, as ginásticas competitivas devem ser tratadas no âmbito escolar, perpassando suas características, elementos fundantes, histórico, entre outros (Brasil, 2018; Secretaria de Estado da Educação do Paraná, 2008). Também, descreve-se que os cursos de graduação não preparam os futuros profissionais de forma adequada, o que se alia à falta de experiência existente, causada pela ausência da modalidade nas escolas.
A presença da ginástica competitiva nas escolas é importante para que os estudantes tenham um acervo de movimentos que os prepare para a graduação em EF e para a futura prática profissional (Machado de Souza, 1997). Além disso, as experiências vividas dentro da escola são incorporadas e levadas com os acadêmicos, interferindo na escolha e na atuação profissional destes (Barbosa-Rinaldi & Machado de Souza, 2003).
Os alunos também retrataram como consequências da falta ou presença da vivência da ginástica de competição na EF escolar para a formação profissional em EF, o despertar de novas atitudes como futuro professor na área, para não cometer a omissão da abordagem do conteúdo (04 citações). Ou seja, aprenderam o que não fazer no futuro como professores de EF. Essa atitude é de uma minoria, pois demanda certa maturidade pessoal por parte dos estudantes que saíram da educação básica. No geral, o futuro profissional não tem o conteúdo durante a vida escolar, muitas vezes teve a ginástica abordada de maneira falha durante a graduação, e não se sente seguro para aplicar a modalidade em suas aulas. Assim, o professor de EF acaba privando seus alunos do universo da ginástica (Barbosa-Rinaldi & Machado de Souza, 2003).
Um grupo de estudantes não acredita que a falta deste conteúdo na Educação Básica lhes influencie de alguma maneira. Neste caso, pode-se entender que o desconhecimento das modalidades gera uma divergência a respeito do que a literatura aborda sobre a importância da ginástica no desenvolvimento dos indivíduos. Pois, entre os benefícios da aprendizagem da ginástica, competitiva ou não, são citados o desenvolvimento das ações motoras; o trabalho de aspectos afetivos e cognitivos e; a prevenção de doenças causadas pelo sedentarismo (Andrade et al., 2016; Ramirez Costa et al., 2016).
Por outro lado, na análise sobre as possíveis contribuições do desenvolvimento do conteúdo ginástica de competição nas aulas de EF escolar, percebidas pelos estudantes, evidenciaram-se duas temáticas: a) Possíveis contribuições para a aprendizagem e desenvolvimento dos indivíduos e; b) Possíveis contribuições para a docência em EF (Tabela 2).
Indicadores Temáticos das | Nº de citações* |
---|---|
Possíveis contribuições para a aprendizagem e desenvolvimento dos indivíduos | - |
Contribui para o conhecimento de saberes sobre a cultura corporal do movimento (para além dos esportes tradicionalmente abordados na EF escolar) | 68 |
Contribui para o desenvolvimento de capacidades físicas, corporeidade, habilidades e capacidades que outros esportes não desenvolvem. | 25 |
Contribui para o desenvolvimento/aprendizagem cognitivo, social e afetivo das pessoas. | 21 |
Contribui para aprender a enfrentar situações de disputa/competição. | 05 |
Possíveis contribuições para a docência em EF | - |
Contribui para que o docente de EF saiba detectar quem pode ter condições e vontade de virar atleta da modalidade (e possam buscar fora da escola esta oportunidade). | 18 |
Contribui para que o docente através da EF escolar estimule a prática de atividade física para a vida/lazer (oferecer oportunidade para quem não tem os meios de conhecer fora da escola) | 16 |
Aprimora/Amplia o leque de conhecimento de base dos estudantes que desejam seguir sua formação profissional na área da EF. | 06 |
Contribui para que os futuros professores de EF saibam aplicar novas metodologias nas aulas e incluam os alunos que não participam das aulas a partir da oferta de outros conteúdos. | 05 |
Não oferece contribuições | |
Não contribui porque na educação física escolar a competição não é o objetivo. | 03 |
Não contribui porque há falta de equipamentos para a prática nas escolas. | 02 |
Não contribui porque não é interessante para os alunos. | 02 |
* Os indicadores temáticos podem ter sido citados mais de uma vez, ou nenhuma vez por cada participante. Por isso, neste caso, há mais citações que número de indivíduos participantes da pesquisa.
Fonte: os autores.
Os estudantes definem que a ginástica de competição no período escolar é importante para o desenvolvimento dos indivíduos porque contribui para obter conhecimento sobre a cultura corporal do movimento, para além dos esportes tradicionais (68 citações). Ainda, manifestam sua contribuição para o desenvolvimento de habilidades corporais de maneira diferente a outras práticas corporais (25 citações). Nesse sentido, o conteúdo ginástica é muito rico, e proporciona aos alunos oportunidades e estímulos motores, criativos, sociais, de cooperação e ritmicidade de maneira tão singular e diferenciada, que sua importância é legitimada. É um meio para que o aluno conheça as possibilidades do seu corpo, desenvolva aspectos cognitivos, sociais e físicos (Andrade et al., 2016).
Outro indicador descrito pelos estudantes foi que a ginástica de competição contribui para o desenvolvimento cognitivo, social e afetivo (21 citações). A ginástica engloba objetivos como trabalhar processo cognitivos, habilidades sociais, afectividade e capacidades motoras dos alunos, abrindo oportunidades para vivências que fora das aulas de EF para muitos seria impossível. Mas, a ginástica vai além disso, contribui para a formação humana, proporcionando aos alunos a cooperação, a confiança, a autonomia e o prazer de praticar atividade física/esportes (Barbosa-Rinaldi & Cesário, 2010; Merida et al. 2008; Melo Oliveira & de Oliveira Porpino, 2010). Houve estudantes que falaram da contribuição deste conteúdo para preparar-se para situações competitivas (05 citações). Contudo, deve-se enfatizar que a ginástica de competição nas escolas não deve ater-se somente à técnica ou uma busca por rendimento. Nesse sentido, Cavalcanti (2007), ao referir-se à ginástica rítmica, afirma que apesar da modalidade ser vista às vezes como apenas de alto rendimento, seu conteúdo é muito amplo, abrangendo a dança, o circo, a própria ginástica e o esporte, o que é enriquecedor para o aluno.
Não se trata de negar o esporte escolar, senão de inseri-lo num contexto que atenda a formação humana, pois as contribuições que o esporte escolar pode trazer ao aluno são diversas, como a criticidade e a autonomia (Melo Oliveira & de Oliveira Porpino, 2010). As modalidades competitivas “devem ser conteúdos da educação física escolar, porém não devem ter um fim em si mesmas” (Barbosa-Rinaldi & Machado de Souza, 2003, p. 166). Nesse sentido, Andrade et al. (2016) descrevem que a ginástica artística (uma modalidade de ginástica competitiva) deve ser vista dentro do currículo da EF escolar como uma atividade física de base, um elemento formativo, que faz parte da cultura corporal e não como um esporte de alto rendimento.
Entre as “Possíveis contribuições para a docência em EF”, 18 estudantes responderam que o trabalho do conteúdo ginástica de competição nas aulas de EF possibilita ao docente encontrar novos interessados em dar continuidade à modalidade, ou seja, novos atletas. Ressalta-se que a formação de atletas e o treinamento de alto rendimento não deveria ser o objetivo da ginástica escolar. Entretanto, este conteúdo precisa ser tematizado nas escolas, pois é neste contexto que são disponibilizadas as oportunidades para os alunos conhecerem e vivenciar novas experiências, e caso seja sua vontade, ir para uma especialização (Barbosa-Rinaldi & Machado de Souza, 2003).
Também, observou-se a possível contribuição para que o docente através da EF escolar estimule a prática de atividade física para a vida e lazer (16 citações), pois, para muitos estudantes, o único contato com o esporte é durante as aulas de EF escolar. Entende-se como relevante o trabalho das modalidades de ginástica competitiva, para a busca da saúde e qualidade de vida, para oportunizar o prazer de praticar algo, de se sentir aceito e capaz, tendo experiências novas, que contribuam para a formação motora, cognitiva, afetiva e social dos estudantes (Andrade et al. 2016; Barbosa-Rinaldi & Cesário, 2010; Ramirez Costa et al. 2016; Merida, et al. 2008; Melo Oliveira & de Oliveira Porpino, 2010).
Houve estudantes que entenderam a importância da ginástica de competição no período escolar para ampliar o leque de aprendizagem de futuros profissionais na área da EF (06 citações). Isto é relevante na medida em que é necessário romper com o ciclo da ausência do conteúdo nas escolas. Ao ser trabalhada adequadamente na vida escolar, a ginástica integrará a formação educacional da criança, e caso esta venha a optar pela graduação em EF, facilita e enriquece a fase acadêmica, proporcionando maiores possibilidades de uma prática profissional futura de qualidade (Barbosa-Rinaldi & Machado de Souza, 2003; Schiavon & Nista-Piccolo, 2007).
Também evidenciou-se a ideia de que o conteúdo ginástica de competição colabora para a inclusão de alunos que não participam das aulas e para a aplicação de novas metodologias (05 citações). De fato, nas Diretrizes Curriculares Estaduais para a EF no Paraná defende-se que o trabalho com essas modalidades deve proporcionar a participação de todos, respeitando suas limitações e individualidades (Secretaria de Estado da Educação do Paraná, 2008).
Outrossim, alguns estudantes não perceberam que existem contribuições do ensino do conteúdo ginástica de competição na EF, alegando que na EF escolar a competição não é objetivo (03 citações), que a falta de equipamentos para a prática nas escolas a torna não importante (02 citações) e que os estudantes nas escolas não a acham um conteúdo interessante (02 citações).
A falta de materiais e espaço para a prática da ginástica nas escolas é uma realidade em todo o país. Num estudo realizado com quatorze professores de escolas municipais de Belém - Pará, constatou-se que a falta de materiais e espaço nas escolas muitas vezes comprometem a segurança dos alunos. Esse é um dos motivos pelos quais a ginástica acaba sendo deixada de lado. Neste mesmo estudo, observou-se que as maiores dificuldades enfrentadas para trabalhar o conteúdo gímnico, principalmente com adolescentes, foram a falta de respeito e interesse dos alunos, aliada ao sedentarismo (Ramirez Costa et al., 2016).
No entanto, Betti (1999) afirma que aliado às condições precárias para o trabalho de atividades físicas nas escolas, também há professores que não demonstram interesse em conhecer mais sobre as modalidades de ginástica. Ainda alegam não estarem habilitados para ensinar esses esportes, devido a certa carência na sua formação acadêmica.
Considerações finais
As evidências declaram a falta de oportunidade que tiveram os estudantes pesquisados de vivenciar e refletir sobre a ginástica em geral e as modalidades competitivas em particular. Assim, percebe-se certa omissão na oferta da EF escolar na hora de levar adiante o seu objetivo de ensinar e procurar que o estudante construa seu conhecimento sobre a cultura corporal de movimento.
Percebe-se que as informações e influências advindas dos meios de comunicação, em especial a televisão, que é a mais comum entre os brasileiros, se integram aos saberes do aluno. Portanto, a mídia tem um papel importante na formação de significados sobre o esporte em jovens e crianças. Isso não seria diferente com a ginástica de competição, na qual muito do conhecimento da maioria dos estudantes sobre as modalidades advém desse meio de comunicação, e não se amplia com a EF escolar.
As modalidades de ginástica de competição que os estudantes vivenciaram na EF escolar foram em muitos casos nenhuma e a minoria que teve o conteúdo vivenciou as modalidades mais presentes nas mídias: ginástica artística e rítmica. A ginástica aeróbica, por estar ligada ao contato com as academias. Desta forma, na EF escolar o aluno não transcende o conhecimento de seu dia a dia e, nos poucos casos que há o conteúdo, somente se amplia (e não muito) aquilo que já conhece.
As abordagens metodológicas vivenciadas por aqueles que tiveram o conteúdo na EF escolar foram diversificadas e atenderam certo equilíbrio entre ter a experiência do conteúdo e buscar o saber em torno dele. No entanto, este estudo não permitiu por meio do questionário aprofundar sobre o nível de discussão, de reflexão sobre a prática e de problematização que era desenvolvido nas aulas. Desta forma, esse dado sobre a preocupação conceitual, procedimental e atitudinal deve-se tomar com cautela.
Quanto à abordagem do conteúdo e suas contribuições para a vida dos estudantes, um grande número de participantes percebe o prejuízo para seu conhecimento de forma geral e para sua capacidade motora especificamente. Ainda, alguns estudantes conseguem perceber que isto não os ajuda no desenvolvimento do curso de graduação e, principalmente, com suas possibilidades de aprendizagem na disciplina de ginástica.
Por fim, sugere-se atender a esta realidade nos cursos de formação inicial. É necessário que os currículos da disciplina ginástica criem estratégias de ensino e aprendizagem que promovam a construção do conhecimento gímnico com propriedade e seguridade, atendendo a falta de experiência e o (des)conhecimento dos estudantes. Esses conhecimentos e essas experiências poderiam abrir maiores possibilidades de os futuros professores começarem a mudar a realidade na sua futura prática profissional.