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Actualidades Investigativas en Educación

On-line version ISSN 1409-4703Print version ISSN 1409-4703

Rev. Actual. Investig. Educ vol.24 n.1 San José Jan./Apr. 2024

http://dx.doi.org/10.15517/aie.v24i1.55467 

Ensayos

Da injustiça educacional às políticas afirmativas para a educação superior pública no Brasil

From educational injustice to affirmative policies for public higher education in Brazil

De la injusticia educativa a las políticas afirmativas para la educación universitaria pública en Brasil

1Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil. Professora e pesquisadora da UFRGS na Faculdade de Educação e no Núcleo de Estudos de Políticas e Gestão da Educação, no Campus Farroupilha, Porto Alegre, Brasil.

Resumo

O objetivo deste ensaio é abordar algumas causas de injustiças geradas pelo sistema educacional brasileiro que ressoam no ingresso à educação superior pública do País. Tais injustiças acarretaram a implementação de uma política afirmativa com cota socioeconômica, étnica, racial e para pessoas com deficiência (PcD), com o intuito de equalizar as oportunidades educacionais ao acesso à educação superior para as estudantes e os estudantes egressos de escolas públicas. A abordagem teórico-metodológica utiliza-se da análise crítica baseada em referenciais que discutem conceitos de justiça e injustiça social e escolar. Por esta via interessa-se em explicitar como o poder, a dominação e a desigualdade social são estabelecidos, reproduzidos e combatidos. A argumentação é desenvolvida de modo a dar ênfase à relevância social das políticas afirmativas. A desigualdade educacional na sociedade brasileira relaciona-se, explicitamente, com a injustiça socioeconômica e, de modo interseccional, com marcadores raciais; reforçando a dedução lógica de que precisaremos de políticas afirmativas para o ingresso de estudantes de escolas públicas na educação superior pública por tempo indeterminado.

Palavras-chave educação superior; injustiça educacional; política afirmativa

Resumen

El objetivo de este ensayo fue abordar algunas de las causas de injusticias en el sistema educativo brasileño, las cuales repercuten en el ingreso a la educación superior pública en el país. Tales injusticias llevaron a la implementación de una política afirmativa con cuotas socioeconómicas, étnicas, raciales y para las personas con discapacidad (PcD) con el objetivo de garantizar oportunidades educativas de acceso a la educación universitaria para las estudiantes y los estudiantes egresas y egresos de las escuelas públicas. El abordaje teórico-metodológico utiliza el análisis crítico basado en referentes que discuten conceptos de justicia e injusticia sociales y escolares. De esta manera, interesa aclarar cómo el poder, la dominación y la desigualdad social se establecen, reproducen y son rechazados. La investigación se desarrolla para enfatizar la relevancia social de las políticas afirmativas. En la sociedad brasileña, la desigualdad educativa se relaciona, explícitamente, con la injusticia socioeconómica y, de manera interseccional, con marcadores raciales. Esto refuerza la deducción lógica de que necesitaremos políticas afirmativas para promover el ingreso del estudiantado de las escuelas públicas a la educación superior pública por tiempo indefinido.

Palabras clave educación universitaria; injusticia educativa; política afirmativa

Abstract

The aim of this essay is to address some causes of injustices generated by the brazilian educational system that resonate with entry into public higher education in the country. Such injustices led to the implementation of an affirmative policy with socioeconomic, ethnic, racial quotas and for people with disabilities (PcD), with the aim of equalizing educational opportunities for access to higher education for students graduating from public schools. The theoretical-methodological approach uses critical analysis based on references that discuss concepts of social and school justice and Injustice. In this way, he is interested in explaining how power, domination and social inequality are established, reproduced, and fought. The argument is developed to emphasize the social relevance of affirmative policies. The educational inequality in brazilian society is explicitly related to socioeconomic injustice and, in an intersectional way, with racial markers; reinforcing the by logical deduction that we will need affirmative policies for the access of students from public schools into public higher education for an indefinite period.

Keywords higher education; educational injustice; affirmative policy

1. Introdução

No início do século XXI, avolumam-se, no Brasil, fortes discussões sobre as desigualdades educacionais e sua relação com o ingresso na educação superior. Pesquisas acadêmicas demonstravam, com frequência, que havia um déficit educacional na sociedade brasileira no que tange ao cumprimento do direito à educação escolarizada referente ao acesso com permanência e qualidade para todas as pessoas no sistema educacional, a começar pela educação básica (Akkari, 2001; Barbosa, 2009). Os estudos demonstravam algumas discrepâncias: que o percentual de estudantes oriundos de escolas públicas que ingressavam em universidades públicas era demasiadamente baixo em relação ao percentual de estudantes que frequentavam a educação básica em escolas privadas. Essa evidência se tornava mais explicita quando se situava as estudantes e os estudantes de escolas públicas a partir de marcadores sociais como classe socioeconômica, raça e etnia (Feres Junior e Daflon, 2014; Sampaio, 2011).

Estes dados, com base no Censo Educacional de 2008, apontavam que a maior parte das matrículas da educação básica (85%) realizadas na primeira década dos anos 2000 se dava na escola pública (Sampaio, 2011); enquanto na educação superior pública essa razão se invertia, com acesso majoritário por estudantes egressas e egressos de escolas privadas, que cobriam apenas 15% da demanda nacional por educação básica. Na contrapartida, indicavam que o setor público era minoritário nas matrículas da educação superior (23%) frente ao setor privado que cobria 77% das matrículas nacionais (Batista, 2015; Sampaio, 2011; Neves et al., 2007).

Essas discrepâncias geram questionamentos sociais e acadêmicos sobre o perfil de pessoas ingressantes na educação superior pública; tendo em vista que, historicamente, as universidades públicas brasileiras são referência de qualidade educacional por manterem o tripé: ensino, pesquisa e extensão(2). A resposta a esta pergunta veio logo: estudantes de classe média e da elite brasileira dotados do capital cultural legitimado aliado ao capital econômico (Batista, 2015, 2018; Neves et al., 2007).

Assim, a injustiça educacional mostra a sua face frente ao direito à educação para todas as pessoas, reconhecido na Constituição Federal de 1988 (CF) e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 (LDB), e que indicam como princípios a igualdade de condições de acesso e permanência na escola e a garantia de padrão de qualidade. Além disso, a CF demarca princípios de equidade social no artigo 3º e Incisos: I – construir uma sociedade justa livre e solidária; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (Brasil, 1988, 1996).

Com efeito, as Instituições de Educação Superior Públicas em face do panorama dos estudos acadêmicos e do direito à educação reconhecido na norma legal, que juntam-se às pressões de movimentos sociais (estudantis, indígenas, negro) e movimentos internacionais antirracistas - como a conferência de Durban na África do Sul, em 2001, estruturada pela Organização das Nações Unidas (ONU) com o objetivo de discutir problemas gerados pelo racismo nas sociedades contemporâneas -, se veem obrigadas a implantar políticas afirmativas para o ingresso em universidades públicas tendo como foco equalizar as oportunidades educacionais para estudantes egressos de escolas públicas.

Inicialmente a política afirmativa começou a ser implementada por universidades públicas estaduais garantidas por legislação local(3). Posteriormente, a partir de 2002, as universidades federais seguem os mesmo caminho por meio de decisões dos Conselhos Universitários, assegurados pela autonomia universitária, atendendo as demandas da sociedade local. No ano de 2012 é promulgada, no âmbito federal, a Lei de Cotas nº 12.771, a qual prevê que 50% das vagas de graduação em Instituições de Educação Superior (IES)(4) federais deveriam ser reservadas para estudantes egressas e egressos de escolas públicas, estabelecendo cotas socioeconômica, racial e étnica. Em 2016, por meio da Lei 13.409, que altera a Lei anterior, ainda considerando os mesmos 50% de reserva de vagas para as escolas públicas, mais uma cota passa a ser considerada, para pessoas com deficiência (PcD).

Em vista da problematização exposta, o principal objetivo do estudo é o de identificar o que dizem os dados dos Censos Educacionais e dos Indicadores Sociais sobre a desigualdade educacional após duas décadas de existência da política afirmativa para o ingresso na educação superior pública.

A organização textual do ensaio é composta por esta introdução, seguida por uma seção que remete ao desenvolvimento do tema com a proposição central do ensaio, a discussão sobre justiça e injustiça escolar e social. Nessa seção argumento sobre a possibilidade de um projeto de escola justa para as sociedades contemporâneas do sul global pós-colonial, em especial a sociedade brasileira. Na mesma seção apresenta-se a interpretação dos dados empíricos de modo a ressaltar a pertinência social de implementação de políticas afirmativas para a educação superior pública no Brasil. A seção de considerações finais traz a síntese da interpretação dos dados com uma reflexão apoiada na dedução lógica sobre a conceituação de justiça social que norteou o estudo.

2. Desenvolvimento do tema

2.1. Proposição

A proposição central do ensaio é a de retomar informações com dados atualizados de Indicadores Sociais e Censos Educacionais, que contrastem educação básica e superior tendo como centralidade a origem escolar (ensino público e ensino privado) das estudantes e dos estudantes frente a marcadores sociais como raça e renda(5). Transversalmente, abordar dados sobre a gestão escolar democrática da educação básica, os quais são apresentados como um indicadores de “qualidade da educação” pelo IBGE; eles podem ser entendidos como uma dimensão importante para a efetividade de uma justiça organizacional que possa vir a garantir maior equidade social, cultural e política na escola pública. Com essa proposição, pretendo responder à pergunta: o que dizem os dados sobre desigualdade educacional após duas décadas de política afirmativa para o ingresso na educação superior pública?

Já a ênfase argumentativa do estudo centra-se em salientar a relevância social da implementação de políticas afirmativas para a educação superior pública, tendo em vista equalizar as oportunidades educacionais para estudantes egressas e egressos de escolas públicas, especialmente, de baixa renda, negras e negros, indígenas e PcD.

A referência empírica da proposição do ensaio — os dados e fatos concretos que traduzem uma certa realidade social e educacional — concentra-se em relatórios técnicos elaborados: pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), focando em cruzamentos de dados da educação básica e da educação superior publicados em 2019, bem como por relatórios gerados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) – Censos da Educação Superior publicados em 2019 e 2021(6), dentre outros. Para dialogar com os dados faço uso, ainda, de estudos de pesquisadoras e pesquisadores que acumulam conhecimento na temática.

De modo a explicitar minha argumentação para a análise e interpretação, sirvo-me dos pressupostos epistemológicos da teoria crítica, que busca destacar os potenciais emancipatórios inscritos na realidade das sociedades contemporâneas e, simultaneamente, identificar os obstáculos ao desenvolvimento desses potenciais. De modo geral, as referências utilizadas, especialmente, Nancy Fraser, Anibal Quijano, Catherine Walsh, por um caminho ou outro, fornecem um arrazoado teórico-conceitual para que possamos entender que as políticas com foco na redução das desigualdades sociais e educacionais delineiam-se pela dimensão política da sociedade. Uma dimensão engendrada por correlações de forças e suas repercussões nas decisões emanadas do Estado, a fim de estabelecer os limites dos benefícios e perdas à cidadania nacional, prescrevendo e produzindo ações públicas que garantam um certo padrão de justiça social e educacional com a intenção de garantir a hegemonia de uma determinada visão de mundo. Destarte, procuro entender como o poder, a dominação e a desigualdade social e educacional são estabelecidos, reproduzidos e combatidos nas sociedades contemporâneas.

2. 2. Argumentos para a discussão

2.2.1. Abordagens sobre injustiça escolar frente à igualdade de oportunidades

A abordagem do tema e de argumentações sobre injustiça escolar, na perspectiva das relações sociais, articula-se com noções e representações sociais de sociedade justa, ou injusta, no que tange ao acesso por todas as pessoas, grupos e/ou classes sociais aos bens produzidos historicamente pela humanidade no jogo de forças, dos conflitos e tensões sociais. Logo, é relativamente consensual que a questão da justiça, entendida sobretudo como uma “distribuição justa de bens sociais”, é essencial a qualquer sociedade para que esta sobreviva como uma comunidade adulta e democrática. Ademais, a dimensão normativa da justiça social não é opcional para os Estados nacionais: garantir um padrão mínimo de justiça é inerente aos Estados-Nação da modernidade contratual, uma vez que eles necessitam de um mecanismo de estabilidade a fim de que o grupo dirigente no poder consiga dirigir. “Aliás, o Estado só é capaz de governar pelo estabelecimento de limites no âmbito de benefícios e perdas, e são tais limites que estabelecem um padrão de justiça”. (Estêvão, 2001, p. 12).

No que tange à escolarização, desde a emergência de um sistema de ensino na Europa ocidental vinculado aos Estados nacionais, que se apresentou como justo e democrático, razão pela qual deveria ser de massas e universalista, mantém-se uma constância em abordagens sobre a injustiça escolar (ainda que com perspectivas diferenciadas) produzida e reproduzida pela escola republicana. Tais perspectivas, com frequência, remetem à relação entre a origem social e cultural das estudantes e dos estudantes e as oportunidades de uma carreira escolar bem-sucedida.

O pesquisador Pierre Bourdieu(7), que se enuncia nessa discussão desde o norte global e tendo como base empírica o sistema de ensino francês, considera que a organização da sociedade moderna, republicana e democrática, da mesma forma que a sociedade tradicional (Weber, 1982), na qual a elite no poder obtinha a sua legitimidade herdada pelos títulos de nobreza, exigiu que o capital herdado se legitimasse através de credenciais acadêmicas, supostamente disponíveis por uma meritocracia individual e neutra capaz de assegurar a igualdade de oportunidades a todas as cidadãs e os cidadãos dos Estados nacionais. Contudo, a educação e os títulos acadêmicos (capital educacional) mais valorizados não se abririam democraticamente para toda a sociedade; assim como o foi para a nobreza, estariam reservados para aqueles dotados de capital cultural (legitimado) articulado com o capital social (redes de contatos) e o capital econômico (recursos econômicos). Na posse deles, garantir-se-ia o capital simbólico (legitimidade na ordem das representações sociais).

Essa tendência do sistema de ensino posta por Bourdieu é analisada por Silva (1995), quanto ao capital cultural institucionalizado(8), em diálogo com as argumentações de Collins (1989), segundo o qual a tendência de se exigir diplomação na sociedade moderna não garante a democratização ou a meritocracia, pois ela decorre de conflitos entre grupos de status, em que uns procuram manter sua situação privilegiada e outros desejam acesso às mesmas oportunidades (Collins, 1989 apud Silva, 1995). Essa perspectiva corrobora a noção cunhada por Bourdieu e Passeron (2014), a qual afirma que o capital cultural institucionalizado tende a legitimar nas escolas o capital herdado (incorporado via grupo familiar), em sociedades que adotam, formalmente, processos democráticos.

Com efeito, manifestam-se na escola os gostos, as preferências, as maneiras características de classe que vão auxiliar o constante reenquadramento dos indivíduos nas suas classes de origem; é a partir desse processo de classificação e reclassificação por meio do habitus(9) que a escola passa a ter um papel atuante para a reprodução dos privilégios de classe, porque exerce essa função de forma velada, com a aparência de neutralidade. Com isso, a escola republicana faz com que condicionamentos sociais pareçam ser decorrentes do mérito individual. Trata as hierarquias sociais como se fossem hierarquias de dons, mérito ou habilidade; legitimando a cultura dominante (burguesa) e reproduzindo as desigualdades da ordem social capitalista (Bourdieu e Passeron, 1992). Logo, cumpre observar que, na concepção de Pierre Bourdieu (e Passeron), o sistema de ensino moderno traz na sua origem a desigualdade de acesso, mas também de permanência, à educação escolarizada; portanto, para ele, a injustiça escolar é estrutural e institucionalizada.

No caso do sociólogo francês François Dubet (2004, 2014), ao abordar a questão da democratização da escolarização na sociedade moderna ocidental, ele nota que a materialidade histórica da escola republicana, democrática e de massas, criou sentimentos de injustiças, quase sempre contraditórios. Nesse caso, o autor observa, mais claramente, esse sentimento de injustiça dos sujeitos-atores e de decepção paradoxal frente a uma escola que desde sua criação prometeu a democratização da escolarização do ponto de vista de igualdade de acesso aos estudos. O autor argumenta sobre o processo de escolarização que passaria da igualdade de acesso para a igualdade de oportunidades. Conforme indica, a proposta da escola republicana retirou sua grandeza da igualdade de acesso para todas as pessoas ao ensino elementar, interessada em instituir a República, isto é, difundir uma cultura nacional, instaurar o reinado da razão, das luzes e do progresso, formar cidadãs(os) para a sociedade moderna ocidental.

Contudo, a escola republicana fomentou o elitismo escolar, pois não tinha por objetivo central desenvolver a mobilidade social — criou-se a escola para o povo e a escola para a elite —, dando a aparência de ser justa num contexto clivado por fortes desigualdades sociais na França do final do século XIX. Foi com a massificação escolar iniciada na França nos anos 1950, fortemente acelerada nos anos 1970 e 1980, que se modificou o modelo de justiça escolar, passando da igualdade de acesso para a igualdade de oportunidades. Admitia-se que a escola deveria, progressivamente, apagar a influência das desigualdades sociais de nascimento sobre a carreira escolar das estudantes e dos estudantes, a fim de estabelecer o reinado do mérito próprio dos indivíduos (Dubet, 2004, 2014).

Assim, o modelo de justiça escolar fundamentado na igualdade meritocrática de oportunidades se impõe, universalmente, como sendo o único capaz de combinar a igualdade fundamental dos indivíduos com as hierarquias da divisão social do trabalho no mundo capitalista. Na verdade, esse modelo vem a conferir legitimidade moral às desigualdades que dele resultam, já que ao entender que a competição escolar é justa cada indivíduo pode ater-se apenas a si mesmo. Ademais, se pensarmos que a igualdade de oportunidades visa a realizar-se apenas em sociedades já igualitárias, concluiremos que precisamos primeiro construir tal sociedade, pois esta, por enquanto, inexiste. Logo, a justiça escolar com base na igualdade meritocrática de oportunidades produz uma justificativa para o sucesso escolar das elites, enquanto aqueles que não alcançam tal sucesso só podem atribuir a culpa pelo fracasso a si mesmos (Dubet, 2004, 2014).

Dessa forma, a escola republicana não consegue apagar o peso do nascimento sobre as performances das estudantes e dos estudantes. Para Dubet (2004, 2014), quando adotamos o ideal de competição justa e formalmente neutra, as alunas e os alunos que são vencidas/vencidos não são mais vistas/vistos como vítimas de uma injustiça social, e sim como responsáveis pelo seu fracasso, uma vez que a escola lhes teria dado, a priori, todas as chances para ter sucesso. Outrossim, a escola atrai estas e estes estudantes para uma competição da qual foram, a priori, excluídas/excluídos; elas e eles acreditam na vitória e na igualdade de oportunidades e descobrem suas fraquezas, sem o consolo de poder atribuir o fato às desigualdades sociais, das quais, supostamente, não são mais diretamente vítimas.

Contudo, um efeito positivo do modelo de igualdade de oportunidades pode ser ressaltado; pois, considerada a organização injusta da escola republicana frente ao embate entre os princípios de igualdade, mérito e autonomia, a sua efetividade é tão exigente e tão difícil de ocorrer que impactou no crescimento de uma visão crítica das desigualdades escolares; com efeito na propagação das lutas por iguais condições de acesso e permanência no sistema educacional, das quais resultaram as políticas afirmativas, no caso brasileiro.

Como se pode perceber, os dois sociólogos franceses enunciam suas críticas a partir do berço da escola republicana (críticas eurocentradas) e mesmo com abordagens diferenciadas, ambos remetem as possibilidades de sucesso no processo de escolarização à origem social das estudantes e dos estudantes (cultura e classe social). Na materialidade histórica da escolarização ocidental reforçam a gênese da escola para as elites e da escola para os pobres, com repercussão direta sobre a produção de injustiça escolar. Logo, se o modelo de igualdade de oportunidades de base meritocrático, cunhado no contexto europeu, não é suficiente para garantir justiça escolar para todos os demandantes por direito à educação escolarizada em todos os níveis, é preciso buscar novos projetos de escola justa; que respondam às diferentes realidades das sociedades contemporâneas, com princípios emancipatórios.

2.2.2 Um projeto de escola justa: para além da igualdade de oportunidades

A argumentação de Fraser (2001, 2006, 2008) colabora para aprofundar o conceito de justiça social e escolar, abordando o que considera como sendo as três dimensões geradoras de injustiça social no mundo globalizado: socioeconômica, cultural e política. Afirma que um primeiro passo para responder à questão da produção e reprodução de desigualdades sociais seria admitirmos que as sociedades capitalistas possuem uma estrutura de classe que institucionaliza alguns mecanismos econômicos, os quais negam sistematicamente a pessoas e grupos sociais específicos os meios e as oportunidades que necessitam para participar na vida social em pé de igualdade com os demais. De outra parte, devemos reconhecer que a sociedade capitalista reproduz uma hierarquia de status que institucionaliza padrões de valor cultural, os quais por sua vez negam a algumas pessoas e/ou grupos sociais (inferiorização e exclusão de pessoas negras, indígenas, transgêneros, imigrantes, mulheres, PcD, do acesso a bens culturais e sociais) o reconhecimento que necessitam para participar plenamente da interação social

O pressuposto é de que as injustiças de redistribuição socioeconômica e de reconhecimento cultural se correlacionam: a primeira, consiste na exploração do trabalho, na marginalização e na privação de bens materiais de ordem econômica; enquanto, a segunda, alicerça-se na dominação do outro, na invisibilização e no desrespeito cultural e da diversidade entre seres humanos. Assim, a desvantagem socioeconômica e o desrespeito cultural se entrelaçam e apoiam o agravamento dos quadros de injustiças provocados pela desigualdade social. Logo, ao compreendermos que as diferentes injustiças e desigualdades estão enraizadas no modelo societal capitalista, é possível pensar que essas desvantagens são intersecções, mediadas por relações de poder e dominação, que se imbricam produzindo e reproduzindo injustiça social.

Com essa percepção de (in)justiça social se criam as condições para formular projetos de uma escola justa para as sociedades contemporâneas. Todavia, as dimensões de justiça como redistribuição e reconhecimento precisam ser associadas à dimensão de justiça como representação política. Nessa terceira dimensão é que as correlações de forças se explicitam, mais claramente, em torno da luta por direitos sociais e humanos em termos de redistribuição socioeconômica e reconhecimento cultural na construção de políticas públicas sociais. São instâncias deliberativas do Estado (lócus de institucionalização formal da justiça ou injustiça social), nas quais as pessoas e/ou grupos sociais demandantes por justiça social precisam estar diretamente representadas (Fraser, 2001, 2006, 2008).

Contudo, é preciso esclarecer que Fraser (2006, 2008) coloca um imperativo moral para a justiça social nas três dimensões citadas — a participação paritária. Entende que a única forma de sobrepor a discursividade da ideologia dominante na esfera pública institucionalizada se dá por meio do desmascaramento e supressão das desigualdades sociais fora dela; caso contrário, os argumentos dos sujeitos-atores seguem os jogos de poder hierarquizantes das sociedades capitalistas; prevalecendo, no debate, o discurso e as práticas daqueles que ocupam posição privilegiada no campo de disputa pela produção da norma institucional (Bourdieu, 2011), que possui efeito direto sobre os direitos sociais e humanos. Logo, a participação paritária é um imperativo que vai além da representação política nas instituições de Estado, permeando todas as esferas de interação social para que possa constituir-se em realidade efetiva nos processos deliberativos formais e/ou informais que subjazem a formação pública da vontade. A tabela 1 aponta, sinteticamente, a perspectiva de Nancy Fraser que pode ser aplicada a um projeto de escola justa que abranja a educação escolarizada em todos os níveis.

Tabela 1  Dimensões de justiça social nas sociedades contemporâneas  

Dimensão da Redistribuição Dimensão do Reconhecimento Dimensão da Representação Política
Requer a reestruturação político-econômica de algum tipo. Envolve redistribuição de renda, reorganização da divisão social do trabalho, destinação de investimentos à tomada de decisão democrática e/ou à transformação de outras estruturas econômicas básicas. Requer mudanças culturais e/ou simbólicas. Envolve a reavaliação positiva de identidades desrespeitadas e das representações culturais de grupos marginalizados. Também envolve reconhecimento e valorização positiva da diversidade cultural. Requer arranjos sociais que permitam a interação político-participativa horizontal, satisfazendo, pelo menos, duas condições: objetiva, na distribuição dos recursos materiais, assegurando a independência e voz aos participantes; e subjetiva, na valoração cultural, expressando igual respeito a todas(os) participantes e assegurando igual oportunidade para romper com as injustiças sociais redistributivas e de reconhecimento.

Fonte: Elaboração própria com base em Fraser (2001, 2006, 2008).

Esse referencial é relevante para a construção de um projeto de escola justa de cunho emancipatório, porque abarca todas as dimensões da exclusão de pessoas e classes/ grupos sociais ante a justa redistribuição dos bens coletivos (econômicos, culturais e políticos), considerando as desigualdades estruturais.

No Brasil, ante a especificidade da reprodução das injustiças educacionais, ingressar na escola pública e gratuita significa enfrentar desigualdades regionais, raciais, sociais, étnicas e de gênero materializadas na organização e gestão escolar, na avaliação da aprendizagem, no currículo e nas políticas escolares e governamentais em geral (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2019; Barbosa, 2009). A escola privada, porém, apresenta características bastante homogêneas, isto é, ela é frequentada pelas filhas e filhos da classe média e das elites brancas que trazem da herança familiar o capital cultural legitimado pela escola republicana, aliados ao capital econômico e social (Torres e Piratini, 2014).

Igualmente, para estudantes oriundos de escolas públicas (especialmente de baixa renda, negras e negros e indígenas), ingressar nas universidades públicas brasileiras, de perfil elitizado e patriarcal, uma vez que estas na sua origem foram organizadas para receber a descendência da classe média e da elite egressa da escola de educação básica privada - predominantemente branca e de formação para o domínio masculino em algumas profissões -, significa enfrentar um espaço institucionalizado ainda hostil à diversidade socioeconômica, étnica, racial e de gênero (Chaui, 2003; Chizzotti, 2001). Também, se revela incipiente a adequação da universidade pública para receber estudantes cotistas, em grande maioria, trabalhadoras e trabalhadores; pois ainda mantém uma organização burocrática, curricular, de gestão acadêmica e de ensino e aprendizagem conveniente para estudantes de classe média e alta, que não trabalham e podem cursar disciplinas em qualquer turno; condição que segue garantindo maiores oportunidades de acesso, permanência e sucesso na conclusão do curso de graduação às estudantes e aos estudantes egressos de escolas privadas(10) (Abreu e Ximenes, 2020; Fiúza et al., 2016; Chaui, 2003).

Resta ainda salientar que para garantir equidade a todos os níveis de escolarização, em especial para a América Latina, é necessário reconhecer que a escola pública reproduz injustiça escolar, em larga medida, porque traz a marca da escola única, republicana, de massas e universalista, que não reconhece a diferença e uniformiza identidades. Isso, tendo em vista a garantir a dominação das formas de ser, pensar e viver idêntica as das sociedades capitalistas europeias, investidas, por elas mesmas, como o berço da civilização humana.

Entendo que um projeto de escola justa que possa garantir os requisitos das três dimensões de justiça social propostas por Fraser (2001, 2006, 2008), exige a de(s)colonização da escola republicana de base europeia e norte-americana, bem como reconhecer que não existe uma identidade humana universal. Walsh (2009), ao abordar a colonialidade no campo educacional, indica a interculturalidade como um fator para o reconhecimento do outro, o não europeu. Todavia, argumenta sobre a distinção entre uma interculturalidade que é funcional ao sistema capitalista, e outra, concebida como um projeto político de descolonização, transformação e criação do novo. Para a autora, a educação intercultural somente tem significação, impacto e valor quando assumida de maneira crítica; como ação pedagógica-política que procura intervir na refundação da sociedade, de modo a transformar as estruturas sociais que racializam, inferiorizam e desumanizam pessoas, grupos e classes sociais.

Nesse sentido, se destaca que de(s)colonização nos tempos atuais não significa um projeto de libertação das colônias com vistas a formar Estados nacionais independentes, mas sim um processo de de(s)colonização epistêmica e desierarquização dos conhecimentos. Significa, entre outras coisas, aprender a desaprender a universalidade do conhecimento científico europeu, da cultura europeia, do desenvolvimento linear e unidirecional da humanidade. Uma pedagogia de(s)colonizada ensina o papel epistêmico dos conhecimentos subalternizados e ancestrais, subjugados juntamente com a população constituída pelos povos originários das américas de diversas etnias, por pessoas negras, comunidades quilombolas, mulheres, pessoas com diferentes orientações sexuais, ou seja, por identidades que não fazem parte da política imperial de identidades (Quijano, 2014; Walsh, 2015).

Todavia, com a manutenção da colonialidade do poder(11), o projeto político (neo)liberal tem se mantido hegemônico frente à propagação da ideia de que não existe outra forma de organização social melhor que a capitalista. Para este projeto, o sistema educacional segue sendo estratégico como um mecanismo para a manutenção de sua hegemonia(12), uma vez que atua: sobre a formação para o trabalho voltado à reprodução do mercado capitalista, para a competição, para o consumo; na formação de uma identidade universalista (cidadania nacional) significada pelos países europeus e Estados Unidos da América; e na produção do conhecimento científico emerso do movimento racionalista-iluminista europeu, sob o mito da modernidade e do berço da civilidade humana, indicando qual e o que é conhecimento emancipatório, baseado na ideia de progresso humano linear. Dessa forma, a colonialidade do poder dos países dominantes do norte global(13) sobre os países do sul global mantém-se intacta, sendo a escola republicana um espaço estratégico para a manutenção desse status quo.

De modo a modificar esse quadro de dominação europeia e norte americana do sistema educacional ocidental é preciso uma intervenção de(s)colonial de âmbito pedagógico-político que abranja aspectos relacionados à formação escolar: para o mundo do trabalho e não para o mercado capitalista, para a cooperação e não para a competição; para a cidadania crítica e não para a cidadania competitiva adaptada funcionalmente ao modelo societal vigente de base colonial-capitalista; e para o conhecimento cientifico epistemologicamente desierarquizado e descentrado dos países dominantes do norte global. Para tal construção, a perspectiva de Walsh (2015) é potente, pois propõe que nos sistemas de ensino as pedagogias de(s)coloniais se constituam em um processo contínuo; uma vez que os países, as pessoas e grupos sociais subalternizados devem permanecer em constante luta para implantá-las como práticas escolares, nunca abandonando a insurgência e a resistência no âmbito cultural, econômico, epistêmico, intelectual, político e social. Contudo, este é um processo ainda incipiente, no caso brasileiro, pois a escola pública ainda traz fortes marcas do colonialismo, as quais ressoam na produção de injustiça educacional até atualidade, conforme veremos no que segue.

2.3 Injustiça educacional e a relevância de políticas afirmativas para a educação superior pública no Brasil

O Brasil instituiu, em 1824, um sistema educacional conformado ao padrão dos nascentes Estados-Nação ocidentais, a partir da instauração da primeira Constituição (Imperial) promulgada sob o regime de trabalho de escravização da mão de obra humana. É, porém, na Constituição Federal Republicana de 1891 que se erige o postulado contratualista liberal de “sociedade de iguais” tendo o sistema de ensino importante papel para constituir tal (con)formação social (Cury et al., 2001). Contudo, os legisladores, homens de origem europeia (Portugal) e brancos ignoram neste texto constitucional a materialidade da desigualdade social, que já se asseverava no contexto da população negra recém liberta da escravização, das(os) caboclas(os) pobres e dos povos originários (chamados de “índios”) sobreviventes dos massacres provocados pelos colonizadores. Tais sujeitos foram excluídos dos direitos previstos na Constituição - que sequer (re)escreve o princípio da gratuidade do ensino primário, previsto na outorgada Constituição Imperial de 1824 -, inerentes à contratualidade moderna dos Estados-Nação de base republicana-liberal democrática (Cury, 2001).

As outras constituições brasileiras (05), promulgadas no século XX, seguem uma trajetória de disputas pelo direito à educação para todas as pessoas, independente da origem social, raça, gênero e etnia. Na atualidade, o Brasil, após a Constituição de 1988, reconhece o direito à educação básica entendida pelos níveis de educação infantil, ensino fundamental e ensino médio, sendo a responsabilidade pela oferta obrigatória e gratuita dos entes federados: os municípios (educação infantil e ensino fundamental), os estados (ensino fundamental e ensino médio), a União, que suplementa os municípios e estados que não conseguem garantir o gasto mínimo por aluno-ano da educação básica(14).

Esse quadro normativo institucional, no entanto, não tem tido eficácia no que tange à implementação de políticas educacionais para a efetividade de uma escola pública menos desigual e justa para todas as pessoas. Já em relação ao acesso à educação superior, ainda que a União, historicamente, tenha assumido o financiamento desse nível de ensino para as IES federais, não há menção no âmbito normativo de que o Estado deva se responsabilizar pela sua oferta gratuita para todas as estudantes e para todos os estudantes, sequer para aquelas e aqueles dentro do fluxo escolar, isto é, para a faixa etária de 18-24 anos. Nessa etapa da educação escolarizada, após muitas reformas, seguimos ainda com as determinações da primeira Constituição republicana (1891): que o ensino superior pode ser ofertado pelo setor privado e/ou confessional e pelo setor público. Nessa oferta, tem prevalecido o setor privado e confessional, pois, na atualidade, o Brasil possui 8,5 milhões de estudantes matriculados em instituições de ensino superior e apenas 24,2% delas e deles em IES públicas (federais, estaduais, municipais), o que assegura ao setor privado mais de 75% de cobertura de matrículas nesse nível de ensino. (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anisio Teixeira, 2021).

Logo, ainda que os discursos políticos ressaltem a importância da educação escolarizada (em todos os seus níveis) nos seus projetos de governo para a sociedade brasileira, pode-se perceber a baixa efetividade social, em termos de implementação de políticas públicas educacionais que impactem no sucesso escolar das estudantes e dos estudantes, independente de origem socioeconômica, étnica e racial. Tal ineficácia da ação pública pode ser percebida a partir de indicadores sociais produzidos por instituições de pesquisa nacional, que insistentemente demonstram a materialidade da desigualdade educacional por meio da associação entre indicadores sociais.

O relatório de Indicadores Sociais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 2019(15), dentre outros, estabelece a relação entre indicadores da educação básica e superior. Em 2019 acrescentou dados com indicadores de gestão escolar. Afirma que o sistema educacional brasileiro gera chances desiguais de acesso, trajetória e aprendizado aos estudantes, principalmente em função de sua origem socioeconômica, raça ou cor e gênero, mas também devido às diferentes condições de organização e funcionamento das escolas e pelo modo de gestão escolar. Aponta a importância do cumprimento do princípio constitucional de gestão democrática do ensino público, de modo que o direito à educação básica garanta sucesso no aprendizado das estudantes e dos estudantes em uma escola pública com condições de funcionamento adequadas, gerida de forma democrática e participativa, com docentes e demais trabalhadoras e trabalhadores da educação valorizadas/valorizados.

Salienta-se que a gestão democrática da escola pública foi concebida em um contexto de redemocratização das instituições públicas brasileiras que rompia com mais de 20 anos de ditadura civil-militar. Ela se constituiu a partir de um núcleo de significados que englobava as lutas sociais da década de 1980, reivindicando a justiça democrática por meio da participação paritária da sociedade civil organizada na gestão das políticas públicas. Com esse sentido a democracia participativa como prática de organização e gestão da escola pública é, por sua natureza, uma política escolar de resistência ao modelo autocrático, hierárquico e eurocentrado da escola republicana, cuja noção de justiça escolar se funda na igualdade de oportunidades com base na meritocracia individual.

O relatório demonstra, portanto, que os municípios ainda estão longe de atingir os objetivos da gestão democrática do ensino público, um princípio constitucional com mais de 30 anos. Os indicadores da Tabela 2 atestam essa inferência.

Tabela 2  Indicadores de gestão democrática da educação pública - 2019  

Carreira do Magistério Existência de Conselho Municipal de Educação Forma de Escolha da Direção Escolar
*Há discrepâncias de rendimentos das(os) professoras(es) no plano global e local. Global: professoras(es) brasileiras(os) têm os menores salários em relação aos países da OCDE. Local: 25,8% dos municípios brasileiros não definem o piso salarial das(os) professoras(es) em Lei municipal; nos municípios há baixa proporção de profissionais de apoio escolar com Plano de Carreira. O indicador existência de Conselho Municipal de Educação (CME), apesar de concretizado em grande parte dos municípios brasileiros (92,8% em 2018), não funciona regularmente como órgão deliberativo e fiscalizador da garantia do direito à educação nos municípios, apontando para uma atuação de cunho cartorial. O indicador forma de escolha da direção escolar aponta que 69,5% (3.869) dos municípios brasileiros, em 2018, recorreram apenas à indicação política para a ocupação desse cargo na escola pública, reforçando o clientelismo político. Contudo, onde o CME exercia suas funções deliberativas e fiscalizadoras, o percentual de indicação política para o cargo diretivo escolar foi acentuadamente menor.

Fonte: Elaboração própria com base em Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2019).

Fonte: Elaboração própria com base em Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2019).

A desigualdade educacional reproduzida pela escola pública brasileira relaciona-se, dentre outros, com o modo de organizar e gerir os sistemas de ensino e a unidade escolar. Nesse sentido, os dados da tabela 2 demonstram: a desvalorização da carreira do magistério, o funcionamento insuficiente dos conselhos de educação, a predominância de indicação política para a direção escolar. Em termos de gestão democrática da educação como princípio estruturante de um projeto de escola justa, tais dados atestam a distância do sistema educacional brasileiro de estabelecer tal projeto; nos marcos da justiça social das três dimensões propostas por Nancy Fraser, de paridade na distribuição socioeconômica, de paridade de status social (cultural e identitário), de paridade na representação política (Cf. Tabela 1).

Já os resultados dos dados educacionais dos níveis de educação básica e superior foram agrupados pelo IBGE em categorias e confrontados com a renda per capita das estudantes e dos estudantes e origem escolar (pública, privada); demonstrando que as desigualdades socioeconômicas possuem relação direta com o acesso e possibilidades de permanência tanto à/na educação básica quanto à/na educação superior.

A Tabela 3 informa o percentual de estudantes nas redes pública e privada e suas discrepâncias em relação ao acesso a cada rede, conforme o rendimento domiciliar per capita das(os) estudantes.

Tabela 3 Distribuição percentual de estudantes das redes pública e privada, por nível de ensino, segundo os quintos da população em ordem crescente de rendimento domiciliar per capita, Brasil – 2018(16). 

Quintos da população em ordem crescente de rendimento domiciliar per capita Distribuição percentual de estudantes da rede pública e privada no ensino básico e superior em ordem crescente de rendimento domiciliar per capita(%)
Educação Infantil Ensino Fundamental Ensino Médio Ensino Superior
Rede Pública Rede Privada Rede Pública Rede Privada Rede Pública Rede Privada Rede Pública Rede Privada
Até 20% 36,4 8,5 40,7 7,2 30,0 5,3 9,7 5,5
Mais de 20% - 40% 27,7 14,7 28,3 13,7 28,7 9,8 16,1 10,8
Mais de 40% - 60% 19,1 15,7 17,1 16,4 21,0 14,3 19,0 18,6
Mais de 60% - 80% 12,4 22,6 10,4 22,6 14,6 23,9 24,7 29,0
Mais de 80% 4,4 38,5 3,5 40,0 5,6 46,7 30,5 36,1

Fonte:Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2019).

Os dados da Tabela 3 deixam claro que as desigualdades socioeconômicas são um dos fatores preponderantes para a reprodução das desigualdades educacionais no Brasil. Em 2018, o percentual de estudantes (6-24 anos) a frequentar instituições públicas era de: educação infantil (74,3%), ensino fundamental (82,3%), médio (87,0%) e superior (25,8%). Há forte desigualdade no perfil de estudantes das diferentes redes de ensino na educação básica e superior. Na educação básica, a rede pública é composta majoritariamente por estudantes dos dois quintos da população com os menores rendimentos, enquanto na rede privada esse padrão se inverte. Pode-se observar que apenas 5,6% dos estudantes da rede pública de ensino médio pertenciam aos 20% da população com maiores rendimentos, enquanto 46,7% dos estudantes da rede privada faziam parte desse quinto da população. Isto é, a educação básica pública segue abrigando estudantes com menor poder socioeconômico.

A educação superior, demonstra a Tabela 3, independentemente da rede de ensino, possui um perfil discente mais privilegiado, prevalecendo o quinto da população com maiores rendimentos (30,5% na rede pública; 36,1% na rede privada). Isto demonstra que, quem acessa o ensino superior, público ou privado, são as estudantes e os estudantes com as melhores condições socioeconômicas, e, em contrapartida, discentes que frequentam a educação básica pública são aquelas e aqueles que pertencem aos quintos da população de menor rendimento; restando-lhes dar continuidade nos estudos em IES públicas e concorrendo com estudantes dos quintos da população de maior renda e com maiores oportunidades de acesso ao capital cultural legitimado, base das seleções e classificações nas universidades. Conforme se nota, a rede pública apresenta uma proporção dessas e desses estudantes 56,7% maior que a mesma proporção para a rede privada de ensino superior (respectivamente 9,7% e 5,5%); asseverando que para estudantes de escola pública que incorporam a intersecção entre baixa renda e cor preta ou parda, uma das poucas oportunidades de acessar o ensino superior é por meio de IES públicas e gratuitas, o que reforça o importante papel de equidade das políticas afirmativas.

Ademais, nesse mesmo relatório de Indicadores Sociais de 2019 do IBGE, há a indicação de que o atraso dos estudantes em relação à etapa frequentada é maior no grupo etário de 15 a 17 anos (23,1%), impactando no abandono escolar do grupo etário de 18 a 24 anos. Nesse último grupo etário, 67,2% é constituído por não estudantes, sendo percentualmente maior o número de jovens que se autodeclaram pessoas pretas e pardas.

Assim, os dados indicam que o atraso escolar é um dos fatores que influenciam no abandono escolar. Em relação à renda, em 2018, o atraso escolar de jovens de 15 a 17 anos era 4 vezes maior entre os pertencentes aos 20% da população com menores rendimentos (33,6%) em comparação com aqueles que faziam parte dos 20% com maiores rendimentos (8,6%). Além disso, muitos jovens do grupo etário de 15 a 17 anos, pertencentes aos quintos da população com menores rendimentos, abandonam a escola sem concluir a educação básica obrigatória. O abandono na educação básica dessa faixa etária incide mais fortemente nos jovens homens, pretos ou pardos, residentes em área rural nas regiões Norte e Nordeste. Em 2018, 737 mil jovens (76%) na faixa-etária de 15 a 17 anos não frequentavam a escola e não haviam concluído a educação básica, sendo que a maior parte desse grupo abandonou a escola sem completar o ensino fundamental (64,7%). A consequência desse quadro, com maior abandono escolar do grupo etário de 18-24 anos, evidencia que a maior desigualdade por classes de rendimento incide no percentual de ingresso ao ensino superior. Enquanto 63,2% dos jovens desse grupo de idade, pertencentes ao quinto da população com os maiores rendimentos, frequentavam o ensino superior em 2018, somente 7,4% dos jovens no quinto da população com os menores rendimentos estavam nessa situação. Já as jovens pretas ou pardas e os jovens pretos ou pardos têm a metade do percentual calculado para pessoas brancas em relação à frequência ao ensino superior (18,3% e 36,1% respectivamente). (Instituto Brasileiro de Geografia e estatística, 2019).

Cabe esclarecer, sobre a incidência da implementação das políticas afirmativas nos últimos 20 anos em relação a maior proporção do acesso de estudantes de baixa renda, pretas e pardas e pretos e pardos oriundas/oriundos de escolas públicas às IES públicas. A partir de 2001 houve a implementação de políticas afirmativas no âmbito do preceito constitucional da autonomia universitária, por meio de seus Conselhos, que atendia as demandas por direito à educação superior das comunidades locais; algumas com cotas raciais desvinculadas da origem escolar e outras com cotas sociais para escolas públicas. Em 2012, a Lei Federal nº 12.711 (Lei de Cota)(17), intensifica o processo ao estabelecer o percentual de 50% de reserva de vagas na graduação para estudantes egressos de escolas públicas com recortes socioeconômico, étnico e racial para todas as IES federais. A Lei de Cotas, ainda que fosse para as IES federais (atualmente são 69 universidades e mais os Institutos Federais, que também oferecem ensino superior), acaba por influenciar universidades públicas estaduais e municipais, chegando, após a implementação da Lei de Cotas, há 97 universidades públicas (de um total de 107) com algum tipo de reserva de vagas sendo que, destas, 86 (89%) possuem política afirmativa para egressos de escolas públicas com cotas raciais, étnicas e PcD, impactando no maior acesso desse perfil estudantil no ensino superior público. (Feres Junior et al., 2018; Batista et al., 2018; Ristof, 2014).

Nesta perspectiva, reforça-se a relevância social de políticas de equidade para o ingresso em universidades públicas, frente ao diagnóstico de que, no Brasil, desde a primeira Constituição republicana (1891) a oferta da educação superior pode se dar tanto pelo setor público quanto pelo setor privado e/ou confessional. Nos atuais tempos, de políticas de capitalismo neoliberal incentivando a privatização de serviços públicos, há o incentivo para a aceleração da privatização do ensino superior. Isso pode ser constatado em dados do Censo da Educação Superior publicados no relatório de 2019. No ano de 2017, o Brasil possuía 2448 instituições de ensino superior, 296 (12,1%) públicas e 2.152 (87,9%) privadas(18). Nesse mesmo ano foram ofertadas 10.779,086 vagas para o ensino superior: 823,843 públicas (7,6%) e 9.955,243 (92,4%) privadas. Aqui se percebe o raio de atuação das IES privadas quanto à oferta de vagas para o ensino superior e a ínfima oferta do setor público para este nível de ensino. (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2019).

Esses dados são reforçados pelo Censo da Educação Superior no relatório de 2021, o qual identifica que a oferta no ensino superior se dá preponderantemente na rede privada e que a desigualdade de acesso ainda é um fator dominante: em 2020, dos 23,8% de estudantes da faixa etária de 18 a 24 que frequentavam a educação superior, 50,2% pertenciam à parcela mais rica da sociedade brasileira, representando 37 pontos percentuais acima do índice para os mais pobres, que era de 13,2%. (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2021).

Daí resulta que estudantes com maior poder econômico frequentam tanto IES pública quanto IES privada. Já estudantes de baixa renda buscam vagas em IES públicas, que percentualmente oferecem o menor número de vagas. Isso demonstra que, mesmo que exista política afirmativa, ainda persiste a injustiça educacional no acesso ao ensino superior por estudantes de baixa renda e/ou pertencentes a grupos étnico e raciais.

Resta ainda salientar que a oferta de vagas noturnas para a graduação é percentualmente (69,2%) maior nas IES privadas (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2019). Isso agrava a situação de estudantes de escolas públicas de baixa renda e/ou de grupos étnico e raciais, uma vez que para estudar numa IES pública, com grade curricular maiormente diurna, é necessária dedicação exclusiva, condição que somente estudantes de renda mais alta podem sustentar, pois ainda é precária a política de assistência estudantil para a permanência de estudantes cotistas (Macedo e Soares, 2020; Batista e Santos, 2018). Já para estudar em IES privadas (aquelas classificadas como universidades e de melhor qualidade) é necessário um investimento financeiro relativamente alto, e, uma vez que as estudantes e os estudantes de baixa renda também são aquelas e aqueles que detêm o menor nível de escolarização (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2019), são os mais penalizados com trabalhos precários e de baixa remuneração, impossibilitando incluir em seu orçamento investimentos em educação. Nesse caso, a injustiça educacional mais uma vez é reforçada.

Quanto à perspectiva de expansão da vaga pública para o ensino superior, no Plano Nacional de Educação para o decênio de 2014-2024, a Meta 12, que aborda a educação superior e sua expansão com qualidade em nível de graduação, possui objetivos a serem atingidos, um deles é garantir que ao menos 40% das novas matrículas ocorram no segmento público. O 3º Ciclo de Monitoramento das Metas do PNE apresenta alguns resultados referentes aos objetivos da Meta 12. Em relação à participação do setor público na expansão das matrículas, verificou-se que o crescimento total das matrículas nos cursos de graduação foi de 1,41 milhão entre 2012 e 2018, contudo, o crescimento do segmento público foi de apenas 180,1 mil matrículas, representando 12,7% do crescimento total, muito distante da meta de 40% para 2024. (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2020). Segundo Alves e Noleto (2022), o PNE é um importante mecanismo para forjar o acesso à educação superior, especialmente a pública. Contudo, a democratização do acesso só se concretizará em políticas públicas quando as metas previstas no PNE se efetivarem em ações com os devidos recursos públicos para o seu financiamento.

3. Considerações finais

O ensaio abordou algumas das causas de injustiças educacionais geradas pelo sistema educacional brasileiro. Parte de diálogo com dados do IBGE e dos Censos educacionais, dentre outros, que repercutem no ingresso à educação superior pública, acarretando a necessidade de implementação de políticas afirmativas a fim de equalizar as oportunidades educacionais para estudantes egressos de escolas públicas. Contudo, ainda que esta abordagem tenha centrado seu foco na elucidação empírica de desigualdades provocadas pelo sistema educacional brasileiro, argumenta-se sobre a possibilidade de construção de um projeto de escola justa; que abarque dimensões de justiça social mais amplas do que a igualdade de oportunidades de base meritocrática, fundamento da escola republicana de origem europeia.

Os dados deste ensaio demonstram a efetividade das desigualdades educacionais, que persistem no Brasil. Tais dados têm justificado a necessidade de políticas afirmativas em vista de garantir maior equidade educacional. A seguir sintetizo os achados à pergunta: o que dizem os dados sobre desigualdade educacional após duas décadas de política afirmativa para o ingresso na educação superior pública?

A começar pela categoria gestão escolar, abordada a partir do princípio constitucional de gestão democrática do ensino público pelos indicadores sociais do IBGE, verifica-se que a desigualdade educacional relaciona-se, sobretudo, com o modo de organizar e gerir a escola pública: com docentes cuja remuneração não condiz com a importância social, cultural e política da profissão; com conselhos de educação que atuam de forma cartorial, fortalecendo gestões dos sistemas e das escolas, autocráticas-centralizadas e não democráticas-participativas, como exige a gestão escolar democrática baseada em uma justiça social que impacte na formação escolar para a paridade socioeconômica, de status social e de participação política; com o persistente clientelismo político como forma preferencial para a escolha da direção escolar nos municípios brasileiros, tornando a escola, que é um bem público, em uma moeda de troca político-partidária.

Já os dados que procuraram estabelecer relação entre educação básica e educação superior, foram agrupados pelo IBGE em categorias e cruzados com a renda per capita das estudantes e dos estudantes e a origem escolar (pública ou privada). Os resultados apontaram que: a) o atraso escolar na educação básica é um dos fatores que repercute no abandono escolar, sendo aquelas estudantes e aqueles estudantes de renda per capita mais baixa que apresentam maior índice de abandono; b) o abandono escolar na faixa etária de 15-17 anos é maior e impacta no menor acesso à educação superior, incidindo sobre jovens pertencentes aos quintos da população de menor renda per capita e são, majoritariamente, homens, pretos e pardos da região norte e nordeste; c) dos 63,2% de estudantes na faixa-etária de 18-24 anos que frequentam o ensino superior em 2018, apenas 18,3% eram pessoas pretas e pardas; d) na educação básica, a rede pública é composta, predominantemente, por estudantes dos dois quintos da população com os menores rendimentos, enquanto na rede privada esse padrão se inverte; e) a educação superior pública recebe estudantes de renda baixa e alta, contudo, oferta o menor número de vagas (7,6%) em relação setor privado (92,4%); f) as estudantes e os estudantes de menor renda per capita frequentam, preferencialmente, as IES públicas, concorrendo por parcas vagas com estudantes de alta renda e maiores condições de acesso ao capital cultural legitimado pelo sistema educacional; g) o acesso maior de estudantes de escolas públicas, especialmente pessoas pretas, pardas e indígenas, às IES públicas foi impactado pela implementação de políticas afirmativas, com a reserva de 50% de vagas para a graduação em IES pública; h) as IES privadas, de cunho mercantil, com oferta de cursos de graduação em EAD, predominam na expansão da educação superior no primeiro quartil do século XXI, podendo cooptar estudantes trabalhadoras e trabalhadores pertencentes aos quintos de renda mais baixos da população brasileira egressas e egressos de escolas públicas.

Dos achados se pode inferir sobre os fortes indícios de alguns elementos a reforçar a desigualdade estrutural na sociedade brasileira, como a desigualdade socioeconômica, o racismo institucional e a elitização da educação escolarizada nos níveis mais altos. Tais indícios vão desde a dificuldade de permanência de estudantes de baixa renda na educação básica (com oferta pública) até o acesso à educação superior (majoritariamente com oferta privada). Tais elementos resultam numa visível injustiça educacional, que reverbera fortemente em determinados grupos sociais com histórico de exclusão do acesso aos bens materiais, culturais (simbólicos) e políticos, a exemplo dos sujeitos que possuem o direito à política afirmativa para acesso e permanência à (na)educação superior pública.

Por fim, retomando as categorias tridimensionais de justiça social propostas por Nancy Fraser, redistribuição socioeconômica, reconhecimento cultural e representação política (Tabela 1), observa-se, a partir dos dados apresentados, que a injustiça socioeconômica é a mais explícita e impactante no processo de escolarização das estudantes e dos estudantes na sociedade brasileira, estando interseccionalmente relacionada ao marcador social raça. Para resolver as injustiças educacionais que repercutem nas oportunidades de sucesso de estudantes de baixa renda, seria necessária uma reestruturação político-econômica, que resultasse na destinação de investimentos à tomada de decisão democrático-participativa, transformando estruturas econômicas básicas a tal ponto que tivessem efeito na reorganização da divisão social do trabalho e na distribuição de renda. Em relação à dimensão do reconhecimento cultural, esta remete às injustiças cometidas especialmente contra a população negra e os povos originários das diversas etnias que acumulam igualmente as injustiças socioeconômicas ao pertencer, maiormente, aos grupos de baixa renda. Para sanar tais injustiças, faz-se necessário mudanças de ordem cultural e simbólica que envolvam a reavaliação positiva de identidades desrespeitadas e das representações culturais de grupos inferiorizados, cuja materialização pode ser propagada por meio de um projeto de escola justa de(s)colonizado que impacte no status social desses grupos. Por último, a dimensão da representação política em instâncias de tomada de decisões, onde a injustiça educacional ocorre pela ausência de estudantes pertencentes aos grupos sociais excluídos, em grande parte, devido ao abandono escolar (dificuldade de permanência), em espaços de tomada de decisões do sistema educacional, que lhes permitiria o exercício crítico da representação política, a exemplo da participação em conselhos de educação. Para equacionar esse problema, as estudantes e os estudantes que são discriminadas e discriminados necessitam: objetivamente, exercitar a interação político-participativa mediante independência e voz para decidir sobre a justa redistribuição dos recursos materiais-econômicos; e, em âmbito subjetivo/simbólico, valorar-se culturalmente frente ao igual respeito que deve ser dispensado a todas as pessoas, assegurando-lhes idênticas oportunidades para decidir sobre como dar cabo às injustiças de ordem redistributiva e de reconhecimento.

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(2)Ainda que se possa criticar os critérios de seleção das instituições de ensino e do que seja “qualidade do ensino” das universidades em avaliações internacionais, não se pode negar que os seus resultados influenciam na disputa por vagas nas universidades mais bem ranqueadas. No Brasil as universidades públicas, com esse sentido, são sempre as melhores; conforme o ranking da Times Higher Education de 2023, das 62 universidades brasileiras destacadas como “melhores” do mundo, 51 delas são universidades públicas e apenas 11 são privadas. https://www.timeshighereducation.com/world-university-rankings/2023/world-ranking

(3)Em dezembro de 2000 a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e a Universidade do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, instituíram reserva de 50% das vagas para estudantes de escolas públicas e, em 2001, passaram a reservar mais 40% das vagas para pessoas pretas e pardas, chegando à reserva de 90% das vagas – para estudantes de escolas públicas e pessoas pretas e pardas sem comprovação de origem escolar. Devido ao embate social gerado, hoje essas universidades reservam 20% das vagas para estudantes de escolas públicas, 20% para estudantes negras e negros independente da origem escolar e 5% para pessoas com deficiência, indígenas e outros. (Feres Júnior et al., 2018). Nas universidades estaduais não há o pré-requisito de a estudante e o estudante ser egresso de escola pública para todas as cotas; já para as universidades federais (cf. Lei de Cotas) o primeiro requisito para ser cotista é ser estudante de escola pública.

(4)No caso dos Institutos Federais (IF), a reserva de vagas para egressos de escolas públicas é também para o último nível da educação básica: o ensino médio integrado ao ensino técnico e ensino técnico pós-médio.

(5)Os marcadores sociais propostos foram indicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Não abordo os marcadores sociais étnicos (indígenas) e pessoas com deficiência (PcD), pois, nos dados examinado, esses não estavam incluídos.

(6)A coleta de informações do IBGE é realizada com base em amostra estatística. Já os dados dos Censos educacionais são coletados diretamente a partir de informações prestadas pelas Instituições de Educação Superior e pelas Escolas de Educação Básica, com base no universo.

(7)Pierre Bourdieu (em algumas parcerias com Jean Claude Passeron) dedicou-se à análise do sistema de ensino francês, evidenciando a distância entre a educação escolar praticada e o modelo preconizado pelas políticas educacionais. Seus estudos desencadeiam uma crítica radical sobre os princípios da escola republicana.

(8)Três aspectos do conceito de capital cultural são destacados por Bourdieu: o aspecto “incorporado”, que significa capacidades culturais específicas de classe transmitidas intergeracionalmente através da socialização primária, familiar. O aspecto “objetivado”, configurado pela posse de bens materiais que representam a cultura dominante.

(9)Disposições internalizadas formadas pelas tendências e inclinações dos indivíduos que resultam dos condicionamentos sociais, isto é, são sistemas de disposições duráveis e transmissíveis, estruturas estruturadas predispostas a funcionar como estruturas estruturantes. As disposições internalizadas atuam como princípios geradores e organizadores de práticas e representações, originando o habitus de classe. (Nogueira e Catani, 1998).

(10)Ainda assim, após a Lei de Cotas de 2012, é possível perceber o aumento do ingresso de estudantes de escolas públicas nas IES públicas, chegando, em 2018, há 45% das matrículas. (Associação Nacional dos Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior, 2019).

(11)La colonialidad es uno de los elementos constitutivos y específicos del patrón mundial de poder capitalista. Se funda en la imposición de una clasificación racial y étnica de la población del mundo como piedra angular de dicho patrón de poder, y opera en cada uno de los planos, ámbitos y dimensiones, materiales y subjetivas, de la existencia cotidiana y a escala social. Se origina y mundializa a partir de América. Con América (Latina) el capitalismo se hace mundial, eurocentrado y la colonialidad y la modernidad se instalan, hasta hoy, como los ejes constitutivos de este específico patrón de poder (Quijano, 2014).

(12)Bernard Charlot (2021), ao discutir a ambiguidade do nascimento do conceito de “qualidade da educação” faz menção ao seu uso ideológico como forma de dominação a partir da imposição de conteúdos e práticas de escolarização mundial, especialmente do ocidente, por países colonizadores. O autor faz menção às avaliações internacionais da educação realizada pelo PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) criada pela OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico) para avaliar o sistema educacional dos países membros (como o Brasil), tendo em vista desenvolver a ciência e a tecnologia para otimizar a produção capitalista e aumentar o lucro; para tal propõe avaliar ciências e matemática, os outros conhecimentos não interessam, pois não produzem acúmulo de capital econômico.

(13)Movimento multifacetado que enfatiza a necessidade de uma comunidade internacional pós-colonial que avance nos objetivos da justiça social, igualdade, liberdade e mutualidade; propondo um novo ethos de poder e subjetividade humana através da política externa, solidariedade internacional, responsabilidade local, consigo mesmo e com os outros, em uma ordem global livre dos legados institucionais, econômicos, políticos e culturais do colonialismo imperial europeu e norte americano. (Ballestrin, 2020).

(14)A CF assegura a garantia de padrões mínimos de qualidade definidos pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996 – “(...) como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem”. Essas disposições garantem a atuação da União de forma redistributiva (redistribuição de recursos entre os entes federados) e supletiva (complementação de recursos pela União após a redistribuição) para garantia dos padrões mínimos de qualidade do ensino. (Brasil, 1988, 1996).

(15)A análise da estrutura social brasileira é realizada pelo IBGE (Indicadores Sociais), com base nas atividades econômicas e na inserção dos trabalhadores no mercado de trabalho, tendo como eixo a reprodução das desigualdades sociais em dimensões específicas, como nível de renda, escolaridade e faixa etária.

(16)Nota do IBGE: Esta tabela refere-se à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (2018); os rendimentos deflacionados para reais médios do próprio ano; não são apresentados resultados para amarelos, indígenas e pessoas sem declaração de raça ou cor.

(17)Esta Lei é alterada pela Lei 13.409, que passa a considerar também as cotas para pessoas com deficiência (PcD).

(18)As IES brasileiras são categorizadas como: Universidades; Centros Universitários; Faculdades; Institutos Federais (IF) e Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFET). Somente as categorias Universidade, Institutos e Centros Federais mantêm o tripé: ensino, pesquisa e extensão, sendo consideradas de melhor qualidade (pelas avaliações institucionais) em termos de status, titulação e formação. No setor privado predominam as faculdades, supostamente de menor qualidade – invertendo a lógica da educação básica, na qual o ensino privado oferece maiores oportunidades de mobilidade social via sistema escolarizado, uma vez que prepara as(os) estudantes para dominar o capital cultural legitimado (burguês), que ainda é reproduzido pelas universidades públicas.

(19)O Censo da Educação Superior de 2019, aponta que apenas 30% dos cursos de graduação nas IES federais são noturnos, restando 70% de cursos para o diurno; nas IES privadas esse percentual se inverte, para 69% de cursos de graduação noturnos e 29% diurnos.

Recebido: 16 de Junho de 2023; Aceito: 27 de Novembro de 2023

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