Introdução
A dor tem sido classificada como o 5º sinal vital e sua avaliação é prática clínica relevante nos sistemas de saúde.1 É importante adotar uma rotina de avaliação de ocorrência e intensidade da dor, documentar a ocorrência de dor e de sua intensidade para todos os doentes, além das intervenções planejadas para o tratamento e controle da dor, bem como o período determinado para a reavaliação.2
Em 1979, a Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) conceituou a dor como ''uma experiência sensitiva e emocional desagradável associada, ou semelhante àquela associada, a uma lesão tecidual real ou potencial'', definição amplamente aceita pelos profissionais de saúde, incluindo a Organização Mundial de Saúde.3
Entretanto, só em 1996, o Presidente da Sociedade Americana de Dor, James Campbell, citou pela primeira vez a dor como quinto sinal vital, pois considerou benéfica a adequada avaliação e manuseio da dor pelos profissionais de saúde.4
A dor é uma experiência subjetiva e multidimensional relacionada a aspectos físicos e emocionais.5 No entanto, entre lactentes e crianças, que apresentam incapacidade do repertório verbal, agitação, expressão facial, frequência cardíaca e respiratória devem ser consideradas como sinal de dor.
Estudo realizado na América do Norte mostrou que o manejo da dor pediátrica pode diferir drasticamente do controle da dor em adultos e uma das diferenças mais marcantes está relacionada às habilidades cognitivas e ao estado de desenvolvimento da criança, sendo importante perceber que a avaliação adequada da dor pediátrica deve começar com a capacitação dos profissionais de saúde.6
A dor em crianças é subestimada e subtratada devido à falta de ferramentas de avaliação da dor. Para crianças com mais de seis anos de idade, a avaliação da dor é baseada em um autorrelato, já para os menores, as escalas de avaliação de dor são necessárias.7
E ainda, de acordo com a Legislação no Brasil, no que se refere à temática que envolve a dor, existe o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, que em sua resolução 41, dispõe sobre os Direitos da Criança e Adolescente Hospitalizados, afirmando, em seu Art. 7º, que o paciente tem direito a não sentir dor, quando existem meios para evitá-la.8
A dor de moderada à grave, em crianças hospitalizadas é comum, mas muitas vezes é mal avaliada e gerenciada, tornando-se uma das causas do subtratamento da dor no Brasil.9
A mensuração e manuseio da dor dependem da sensibilidade do profissional em percebê-la no sujeito com dor, e o foco deve ser minimizar o sofrimento oferecendo uma abordagem individualizada e humanizada o que terá como resultado confiança e cooperação por parte do indivíduo hospitalizado,10 em consonância com um dos 10 elementos do Processo Caritas, da Teoria do Cuidado Humano, desenvolvida por Jean Watson: utilizar a criatividade para solução de problemas, buscando a solução mediante processo de cuidados.11
Em crianças, é de extrema importância que a dor seja adequadamente identificada, avaliada, e sobretudo tratada, já que há dificuldades de identificar a intensidade e o local da dor.9 Entretanto, estas ações ainda são pouco realizadas pela equipe de enfermagem, apesar do aumento de manuscritos3, 10,11,12que abordam a temática acerca dos benefícios que a utilização de instrumentos de avaliação da dor traz para a criança. Sem a mensuração da dor não há como definir se o tratamento está sendo necessário e eficaz ou até mesmo quando finalizá-lo.13
A equipe de enfermagem deve exercer seu papel no controle da dor, de maneira sistemática, com o objetivo de entendê-la e tratá-la, uma vez que fará parte da tomada de decisões sobre medidas de alívio para com o paciente. A partir da avaliação, podem ser determinadas as intervenções, sendo classificadas como farmacológicas ou não farmacológicas.14
Considerando o panorama onde a dor infantil tem manejo inadequado, é interessante contribuir para evidenciar a necessidade de se compreender a importância do controle eficaz da dor e a influência dos métodos não-farmacológicos no alívio da mesma de forma a favorecer mudanças comportamentais a partir da prática teorizada, e subsidiando a implementação de protocolos para obtenção de conhecimento sobre as escalas de avaliação da dor infantil, tendo em vista o manejo adequado da dor pediátrica no ambiente hospitalar.15
É importante entender a perspectiva do profissional de enfermagem, seus sentimentos em prestar assistência e analisar seus conhecimentos sobre o manejo da dor infantil. Nesse contexto, o presente estudo objetivou analisar os conhecimentos da equipe de enfermagem sobre instrumentos de avaliação da dor pediátrica.
Metodologia
Trata-se de um estudo descritivo-exploratório, com abordagem qualitativa. O estudo foi realizado em hospital pediátrico, público, de médio porte, referência regional em pediatria, localizado no sudoeste do Maranhão, Brasil. A pesquisa seguiu recomendações do Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ) permitindo a melhora do rigor da pesquisa. 16
Como critérios de inclusão foram considerados enfermeiros e técnicos de enfermagem que prestavam assistência pediátrica no hospital nos setores de Urgência e Emergência, Clínica Médica e Unidade de Terapia Intensiva, de ambos os sexos, de qualquer idade, e que estivessem de plantão no momento da pesquisa. Foram excluídos aqueles que estavam ausentes no período da coleta de dados por motivo de férias ou afastamentos e licenças.
A pesquisa ocorreu no mês de novembro de 2019 a março de 2020, através da aplicação de entrevistas individuais, sendo a amostra selecionada por conveniência e o número de participantes se definiu considerando o critério de saturação dos dados,17 que se deu na 20ª entrevista, com cinco enfermeiros e 15 técnicos de enfermagem.
A coleta de dados ocorreu por meio de entrevistas semiestruturadas, gravadas em áudio, com duração média de 20 minutos, que ocorreram individualmente no próprio local de atuação dos participantes, em sala reservada após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A entrevista foi trabalhada em dois momentos; no primeiro aplicou-se um formulário quanto aos aspectos sociodemográficos e no segundo momento, optou-se por uma entrevista com o tema central que iniciou com a seguinte pergunta norteadora: ''Como é para você lidar com a dor infantil?''
Os dados foram analisados pela análise de conteúdo temático em três etapas sistemáticas, segundo proposto por Bardin: pré-análise; exploração do material; tratamento dos resultados obtidos e interpretação.18 Após leitura das entrevistas, identificou-se os temas comuns e agrupou-se em categorias para melhor compreensão do conteúdo. A interpretação se deu por meio da inferência dos dados coletados com a literatura científica.
A Teoria do Cuidado Humano de Jean Watson foi escolhida como referencial teórico metodológico para o estudo, visto que o cuidado é a essência da enfermagem e a enfermagem é uma ciência humana, considerando a individualidade de cada ser na promoção de uma assistência de qualidade, digna e personalizada, onde o indivíduo deve ser cuidado como um todo.9
A Ciência do Cuidado abraça a pessoa inteira, a unidade do espírito da mente como um em relação ao meio ambiente em todos os níveis.
A pesquisa atendeu aos critérios éticos segundo recomendações da Resolução 466/1219 e foi aprovada sob o parecer nº 3.693.098. Para garantir o anonimato dos participantes os mesmos foram identificados com as letras ''E''(enfermeiro) e ''T'' (técnico de enfermagem) e números subsequentes conforme a ordem em que a coleta de dados foi realizada.
Resultados
Sobre a caracterização dos 20 participantes, 5 (25%) eram enfermeiros e 15 (75%) técnicos de enfermagem; eram do sexo feminino 19 (95%); com idade variando entre 23 e 58 anos; e 13 (65%) se autodeclararam pardos. Sobre o estado civil, 7 (35%) pessoas informaram ser solteiros, 9 (45%) casados, 3 (15%) divorciados, e apenas uma pessoa viúva (5%). Sobre o tipo de vínculo com o estabelecimento de Saúde, 17 (85%) pessoas comunicaram serem funcionárias públicas. Em relação ao tempo de formados dos participantes, obteve-se o mínimo de 2 meses, o máximo de 25 anos, e a média de 20 anos de trabalho na enfermagem e a prática em pediatria variou de 5 meses a 20 anos.
Os resultados apontaram que a equipe de enfermagem considera de grande importância a avaliação adequada da dor infantil, entretanto desconhecem e não utilizam escalas para mensurar a dor. Utilizam tratamento medicamentoso prescrito para cada caso e ainda adotam medidas não farmacológicas como massagens e compressas, mas consideraram difícil e complicado lidar com a dor infantil.
As entrevistas originaram um corpus de análise, cujas unidades apresentaram singularidades e homogeneidades significativas, sendo agrupadas em quatro categorias temáticas: Entendimento dos profissionais sobre a importância da avaliação da dor infantil; desconhecimento dos profissionais sobre instrumentos de avaliação e a falta de aplicação do mesmo no ambiente hospitalar; estratégias utilizadas no alívio da dor; as perspectivas dos profissionais de enfermagem no enfrentamento da dor pediátrica.
Entendimento dos profissionais sobre importância da avaliação da dor infantil
Considerando a Teoria do Cuidado Humano, um dos 10 elementos do Processo Caritas é: sustentar a dignidade humana e respeitar a assistência às necessidades humanas básicas.7 Dessa forma, a avaliação da dor foi considerada por toda a equipe de enfermagem como sendo algo de grande importância, e de acordo com os relatos dos profissionais relaciona-se ao conforto e bem estar das crianças, a utilização correta da medicação e também para traçar possíveis diagnósticos, sendo esses pontos retratados nas seguintes falas:
Em primeiro lugar, para o bem estar da criança, que é o nosso foco, que eles saiam bem e o tratamento seja o menos doloroso possível (T1).
Justamente na hora de medicar, saber a necessidade da medicação, por isso é bom avaliar (T7).
É importante pra saber a intensidade do problema, acaba nos trazendo possíveis diagnósticos diferenciais com essa questão da dor (E20).
Desconhecimento dos profissionais sobre instrumentos de avaliação da dor e sua aplicação
Na análise das falas, percebeu-se que no serviço ainda não são utilizadas escalas validadas para a mensuração da dor infantil, e que os profissionais não conhecem e não utilizam nenhum instrumento para avaliação da dor. Para a avaliação da queixa álgica, de acordo com os relatos dos profissionais, são utilizados o relato das crianças e indicadores de dor como o choro, expressões faciais e corporais, sendo retratado nas seguintes falas:
Relato da criança, às vezes a criança não fala, mas quando o pai chega, elas se sentem seguros na frente da família. (E18)
Através do choro, a criança está chorosa, inquieta e aquele choro que não para, a gente observa (T15).
A equipe informou também executar sua avaliação da dor pela expressão facial e pelo choro infantil. Porém, ambos são classificados como indicadores comportamentais de dor, que de forma isolada, não incluía uma escala de avaliação, são ineficazes para mensuração da dor pediátrica. Neste seguimento, um único profissional percebeu a não aplicação de instrumentos na unidade pediátrica e declarou:
Instrumentos em si a gente não tem, a gente leva em conta as reações, expressões faciais e como reagem em momentos de estresse, que é esperneando, chorando, gritando (E17).
Observa-se que no serviço onde a pesquisa foi realizada, não se faz uso de escalas de avaliação da dor, pois nenhum profissional mencionou a aplicação de escalas dentro do ambiente hospitalar para com as crianças.
Estratégias utilizadas no alívio da dor
Considerando um dos 10 elementos do Processo Caritas,7 a enfermagem deve utilizar a criatividade para solução de problemas, buscando a solução mediante processo de cuidados, dessa forma, minimizar a dor do paciente é essencial. Durante a entrevista foi perguntado aos participantes se eles conheciam métodos não farmacológicos de alívio à dor e se o uso desses métodos era usado rotineiramente no serviço. Os relatos foram:
Os recém-nascidos, a gente faz massagem pra dor na cólica, aqui a maioria das atitudes é farmacológica (T15).
Sim calor local, a gente dá a luva pede pra amornar água na copa e fica fazendo massagem local (T12).
Compressa morna e fria de acordo com a prescrição (T5).
Aplicamos essa parte humanizada, como massagens (T9).
O tratamento da dor envolve tanto medidas farmacológicas quanto as que não envolvem tratamento medicamentoso, ditas não farmacológicas. Quando questionados sobre a rotina da equipe frente à queixa álgica, diversos participantes referiram realizar a intervenção medicamentosa em primeira instância. A maioria dos entrevistados relataram o uso de uma rotina farmacológica para o manejo da dor infantil, como se observa:
A nossa rotina é assim, eu tenho paciente com muita queixa de dor, o farmacológico vai ser o tratamento dela, aqui a gente não usa muitas outras coisas (T10).
A gente olha pra ver se tá prescrito alguma medicação pra dor, se tiver a gente administra, caso não, a gente leva no plantonista pra ele escrever alguma medicação (T20).
A maioria é com ações farmacológicas e às vezes, até mais de um (fármaco) (T15).
As Perspectivas dos profissionais de enfermagem no enfrentamento da dor pediátrica
Sobre o ponto de vista dos profissionais, quando no enfrentamento da dor pediátrica, motivados a partir dos seus sentimentos e vivências acerca do tema, surgindo no instante em que os entrevistados foram questionados sobre como lidavam com a dor das crianças, como se observa nas falas a seguir:
É muito difícil, porque ela tem todo um cuidado diferenciado por ser uma criança, ela tem medo do desconhecido, então quando ela chega aqui, ela passa por esse momento difícil. E a dor em si faz com que ela tenha ainda mais medo, e não é fácil não, é difícil lidar com isso (E18).
É meio complicado lidar com paciente nessa situação. E a criança ainda é mais sensível ainda e cada uma tem que ser trabalhada de formas diferentes e a gente tem que aprender a lidar com cada um (T2).
Ainda durante a entrevista, alguns entrevistados citaram que passaram a enxergar o paciente pediátrico como se fosse o próprio filho, evidenciando o envolvimento emocional do profissional com o paciente pediátrico, como se nota a seguir:
Ai, é muito dolorido, é um processo muito difícil por que ainda mais quando você tem filhos, você olha pra criança e já imagina o seu (E13).
Discussão
Os resultados encontrados sugerem que a equipe de enfermagem considera de grande importância o conforto e bem estar da criança hospitalizada, de forma que medidas adequadas sejam adotadas como o uso de medicamentos ou mesmo o uso de medidas não farmacológicas, visto que lidar com a dor infantil é difícil, reforçando a hipótese de que o uso de escalas para mensurar essa dor são de grande valia na busca de uma hospitalização humanizada, onde o cuidado deve ser holístico, individualizado e a pessoa vista em sua totalidade como proposto por Watson.20
De acordo com a American Academy of Pain Medicine,21algumas condições podem gerar dor e sintomas associados decorrentes de uma causa discreta, ou podem ser condições nas quais a dor constitui o problema principal. A mensuração e manuseio da dor dependem tanto da sensibilidade do profissional em percebê-la no sujeito com dor, quanto da escolha de estratégias para alívio dos sintomas e nas relações de cuidado, onde o enfermeiro participa do processo, auxiliando na escolha adequada.20 A abordagem das crianças com dores constitui grande desafio para a equipe de saúde.22
A eficácia do tratamento para dor depende da sua avaliação, portanto, sem uma avaliação de qualidade complica-se em determinar o tratamento mais adequado para a criança hospitalizada, já que a dor é subjetiva e individual.10 A prática da avaliação pode trazer ainda um maior conforto e bem-estar ao paciente.23
Para um cuidado adequado ao paciente com dor moderada ou intensa deve-se considerar para a abordagem terapêutica: administração de analgésicos em intervalos regulares, horário fixo, escolha da terapia adequada a cada paciente, informar ao paciente ou a seus cuidadores detalhes sobre o tratamento prescrito como nome do medicamento, dosagem e possíveis efeitos adversos.24
Para a Sociedade Brasileira para estudo da Dor - SBED, 2 no que se refere à medicação no manejo da dor, sua atenção se dá aos reajustes das doses, as alterações durante o tratamento e a posterior redução e suspensão da analgesia dependerá do resultado. Percebe-se a importância de diminuir os riscos, evitando prescrição inadequada de opioides e outros analgésicos, garantindo as melhores práticas da assistência hospitalar visando a humanização da assistência.
O conhecimento dos profissionais a respeito da existência e funcionalidade das escalas para avaliação da dor infantil, além de facilitar a identificação da dor, sua intensidade, ainda permite à equipe a escolha adequada da terapêutica a ser aplicada.13Entretanto, na presente pesquisa observou-se que esses instrumentos não eram conhecidos.
Avaliar a dor é uma ação complexa por seu caráter subjetivo, porém para torná-la objetiva criaram-se as escalas de dor. Elas são instrumentos utilizados e recomendados para pacientes hospitalizados no sentido de quantificar a dor, a fim de prever o tratamento adequado, inclusive com escalas específicas para crianças.25
A mensuração da dor pode ser realizada por meio de relatos verbais do paciente utilizando-se escalas para medir a intensidade ou a atenuação da dor. É de suma importância valorizar a queixa de dor do paciente com a finalidade de atenuar o sofrimento, avaliando e quantificando a dor de forma adequada, rápida e segura.10
As competências requeridas da equipe de enfermagem iniciam-se pela percepção da dor infantil e pela valorização da sua manifestação pela criança. A equipe deve observar e registrar os sinais emitidos pela criança, as alterações fisiológicas que indicam o sofrimento e fazer o reconhecimento da dor precocemente evitando o aumento de sua intensidade.25
A avaliação da dor é ampla e abrange informações com relação à data de início da dor, sua localização, intensidade, duração e periodicidade dos episódios dolorosos, além das qualidades sensoriais e afetivas do paciente, e conhecimento sobre os fatores que iniciam, aumentam ou diminuem a intensidade da dor. Com relação à mensuração, só pode ser atribuída por instrumentos que quantificam a intensidade da dor, considerando que existem peculiaridades na dor infantil de forma que os profissionais precisam compreender as variações de dor conforme intensidade, faixa etária bem como estratégias para amenizar essa dor.26
A expressão facial, choro, gemência, incapacidade de ser consolada, postura anormal, movimento do corpo e postura corporal são indicadores comportamentais de dor aguda, assim como o medo de ser movido, falta de interesse no ambiente, tranquilidade indevida, aumento da irritabilidade, mau humor, perturbações do sono, raiva, alterações no apetite, mau desempenho escolar entre outros. Para evitar os aspectos subjetivos na avaliação da dor devem-se utilizar instrumentos para essa avaliação como escalas e questionários.27
A avaliação da dor infantil faz-se por meio de escalas, abrangendo os diversos parâmetros e visando uniformizar os critérios de mensuração das variáveis.10 As escalas são instrumentos específicos de registro da dor, que avaliam tanto os parâmetros comportamentais quanto os fisiológicos, aproximando a avaliação sob a perspectiva do relato do paciente, possibilitando o reconhecimento inicial da dor e a realização de uma posterior intervenção medicamentosa ou não.13
As maiores dificuldades relatadas pelos profissionais para utilizar as escalas de avaliação da dor estão relacionadas à dificuldade de aplicação do instrumento pelos profissionais em pacientes, falta de conhecimento sobre a dor, falta de comunicação entre os profissionais de enfermagem, sobrecarga de trabalho, desvalorização da queixa do paciente, ausência de anotações de enfermagem sobre as queixas álgicas, gerenciamento de tempo para fazer uma avaliação adequada da dor do paciente, resistência dos profissionais ao uso de instrumento de avaliação da dor por acreditarem que a única medida de alívio é a farmacológica.28
Com o objetivo de reduzir os estímulos agressivos do ambiente, minimizar o estresse, prevenir alterações fisiológicas e comportamentais a prática do uso de estratégias não farmacológicas antes e após procedimentos dolorosos possuem eficácia comprovada,29 visto que segundo a Teoria do Cuidado Humano10 é preciso criar um ambiente de cura em todos os níveis (físico e não físico). Tanto as intervenções farmacológicas como as não farmacológicas devem fazer parte do cotidiano dos profissionais de saúde que prestam cuidados à criança.10
O tratamento e o controle da dor não passam apenas por recursos medicamentosos e ao conhecimento dos seus critérios de administração, mas também incluem diversas intervenções não farmacológicas e, a importância do seu recurso deve-se ao fato de muitas delas modificarem o significado da dor, quer isoladas ou em complementaridade.10 Entretanto, na presente pesquisa foram citadas apenas as massagens e aplicação de calor ou frio.
A termoterapia, na aplicação do frio, acontece a vasoconstrição, fazendo uma redução da circulação local e do líquido extracelular, reduzindo a dor e edema, bem como na aplicação do calor, se promove o relaxamento muscular e sensação de conforto, pois ocorre vasodilatação no local, promovendo a circulação, com consequente remoção de detritos celulares e toxinas. Já nas massagens ocorre a liberação de substâncias químicas, que proporcionam uma sensação de bem-estar e conforto.30 Entretanto há diversos ouros tipos de estratégias, tais como acupuntura, cromoterapia, aromaterapia, musicoterapia, arteterapia.31
O emprego de outros métodos não farmacológicos, como mudança de decúbito, massagens locais, são medidas para alívio da dor, porém não há uma padronização de condutas quanto a esses métodos pela equipe hospitalar.25 As decisões sobre o manejo da dor estão relacionadas com a avaliação que o profissional faz diante de uma situação e o papel da equipe no manejo da dor, o que inclui a avaliação da dor, o plano de intervenções farmacológicas e não farmacológicas, o registro da dor, a aplicação das estratégias a avaliação da resposta do paciente.26
Ainda se pode perceber que a maioria dos profissionais de saúde estão extremamente engajados na verificação da dor em pacientes hospitalizados, porém os métodos de alívio da dor utilizados pelos profissionais permanecem restritos ao farmacológico, o que torna fundamental expandir a visão a respeito das estratégias não farmacológicas no manejo da dor, melhorando o gerenciamento da mesma, principalmente das crianças no contexto hospitalar, visto que as estratégias não farmacológicas são de baixo custo, podem ser facilmente implementadas pela equipe de enfermagem e são de baixo ou nenhum risco de complicação.32
A intervenção não-farmacológica para alívio da dor além da sua eficácia possui vantagens por ter baixo custo de forma que é essencial compreender a importância de desenvolver habilidades para o uso dessas medidas.10Na prática profissional o uso de escalas que dimensionem a dor contribui para o manejo da dor mais fidedigno proporcionando uma assistência mais segura e eficaz ao paciente pediátrico.
Os desconfortos oriundos da hospitalização e as particularidades pediátricas são questões importantes no enfrentamento da dor. Segundo a Teoria do Cuidado Humano um ambiente de cura envolve a atenção, a redução do ruído, uma ventilação e iluminação adequadas, buscando o conforto e segurança do paciente.33
No ambiente hospitalar a criança vivencia diversos tipos de sentimentos como: a separação, a dor, o desconforto físico decorrente da intensa manipulação e doença, nervosismo, estresse, que causam sentimentos de agressão, ansiedade, inquietude, o que pode dificultar o tratamento, sendo importante para a equipe de saúde reconhecer tais sofrimentos.34
Para Watson o cuidado deve ser digno, completo, e aproximar o profissional de enfermagem do paciente, considerando os aspectos da transcendência de cada ser humano, observando a pessoa como um todo.20
No que concerne à sensação dolorosa infantil, elas podem sentir-se agredidas, em ambiente desconhecido, podendo com estes eventos ocorrer uma ruptura em suas identidades.35 Os procedimentos dolorosos geram medo, sentimentos e reações que dificultem os cuidados de enfermagem.8
Os profissionais expressam dificuldades no manejo da dor pediátrica, principalmente por motivo de falhas nos conhecimentos básicos sobre a experiência dolorosa.22 A dificuldade que a enfermagem enfrenta não se limita apenas a compreensão referente à dor, porém consiste também na busca de um cuidado integral ao paciente e na conscientização de que a avaliação e o alívio da dor fazem parte do tratamento.10
É importante também na prática dos cuidados de enfermagem saber gerenciar as emoções pessoais, visto que a aproximação afetiva com os clientes pode causar estresse acentuado e a possibilidade de relacionar a criança a quem presta cuidado com seus filhos. O profissional de enfermagem deve desenvolver e manter relações de amor, confiança e carinho.9
Para Watson o afeto e o envolvimento emocional são atributos essenciais para cuidar, entretanto, esse envolvimento não deve trazer prejuízos, sendo essencial praticar a bondade-amorosa, compaixão e equanimidade consigo e com o outro.9 Ocorrendo de forma madura, profissional e com limites é importante que o profissional de enfermagem consiga diferenciar o ser mãe e o trabalho na enfermagem, não esquecendo, entretanto, de cuidar das crianças com afeto e evitar a projeção da criança hospitalizada com sua família.27
No entanto, por mais que o profissional tente esconder suas emoções, não há como dizer que os profissionais da saúde, principalmente a equipe de enfermagem que tem um contato maior com o doente, não tenham envolvimento emocional com os pacientes. Desse modo, faz-se necessário que os profissionais invistam em relações humanizadas, enfrentando os momentos difíceis em conjunto com a família da criança, proporcionando o amenizar da dor, quando a família sente o apoio afetivo por parte dos profissionais que cuidam das suas crianças.36
Como limitação notou-se uma tímida participação dos profissionais durante a pesquisa, demonstrando a necessidade de maior sensibilização quanto a participação em pesquisas científicas. Também, vale ressaltar que a não adoção das escalas de mensuração da dor e o desconhecimento das mesmas pelos profissionais evidenciaram as dificuldades relativas à infraestrutura e à organização do serviço.
Já que os profissionais da enfermagem lidam diariamente com a dor infantil necessitam continuamente de aprimoramento técnico para empregar os instrumentos de avaliação da dor. Ressalta-se a importância de se realizar outros estudos que venham contribuir com as estratégias não medicamentosas usadas para amenizar a dor infantil.
Conclusão
Foi possível identificar que os profissionais de enfermagem não realizavam um método eficaz de avaliação da dor pediátrica, com o uso de escalas, pois desconheciam a existência dos instrumentos adequados para avaliação e mensuração da dor infantil.
Observou-se ainda que a equipe de enfermagem apresentou conhecimentos sobre alguns dos métodos não-farmacológicos para alívio da queixa álgica, porém, mencionaram um número limitado de intervenções em relação a diversidade de outras estratégias não farmacológicas, que podem ser exploradas pelos profissionais e empregadas ao público infantil. Observou-se que grande parte dos profissionais se restringiu a rotina farmacológica.
Os resultados do presente estudo trazem contribuições para a enfermagem pediátrica, onde se tornou possível conhecer os dados sociodemográficos dos participantes, bem como os sentimentos dos profissionais em relação a queixa álgica pediátrica, ainda se observou que os profissionais encontram dificuldades em lidar com a dor infantil. Portanto, faz-se de extrema relevância que os profissionais da equipe de enfermagem conheçam, apliquem e incentivem as práticas não farmacológicas no ambiente hospitalar em consonância com as estratégias farmacológicas.
DECLARAÇÃO DE CONFLITO DE INTERESSES
Os autores declaram que não há conflito de intereses