Introdução
No Brasil, a saúde é direito de todos e dever do Estado por meio de políticas públicas que visam à prevenção, recuperação e promoção à saúde. Assim, a lei orgânica da saúde que regulamentou o Sistema Único de Saúde (SUS) prevê a universalidade ao acesso a saúde como um dos princípios doutrinários do sistema. O SUS garante o acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência de forma integrada, hierarquizada e seguindo um nível crescente no atendimento das complexidades.1)-(2
A assistência no âmbito do SUS estabeleceu-se através da organização das ações e dos procedimentos em três níveis de complexidade: atenção primária, média complexidade e alta complexidade ambulatorial e hospitalar.2 Esse sistema é configurado em redes sustentadas por critérios, fluxos e mecanismos de pactuação de funcionamento, para assegurar a atenção integral aos usuários. Na compreensão de rede, deve-se reafirmar a perspectiva de seu desenho lógico, que prevê a descentralização e organização do atendimento em níveis de complexidade, viabilizando encaminhamentos mais resolutivos.2
No contexto do SUS, a área de urgência e emergência necessita de atenção especial, visto a crescente demanda por atendimentos em função do aumento do número de acidentes, da violência urbana e da insuficiente estruturação da rede, o que gera muitas vezes superlotação e sobrecarga de trabalho nesse setor.3) Essas particularidades acarretam altos índices de rotatividade de pessoal e insatisfação com o trabalho, o que pode impactar negativamente a qualidade do cuidado. (4
Diante dessa problemática, o Ministério da Saúde (MS) brasileiro, reformulou em 2011 a Política Nacional de Atenção as Urgências e lançou a Rede de Atenção as Urgências e Emergências (RUE), com objetivo de ampliar, qualificar e garantir o cuidado a pacientes em situações de urgência e emergência em todo território nacional. Esta política permite que os diferentes níveis de poder do Estado organizem o acesso nos serviços de saúde de forma mais oportuna e articulada, garantindo o acesso humanizado e integral dos pacientes. (5
O atendimento pré-hospitalar (APH) móvel integra a rede de assistência às urgências, constituindo-se como um serviço de saúde relativamente recente no Brasil que tem contribuído no atendimento às urgências. (6) Embora a demanda por atendimento nesse serviço seja crescente, os estudos acerca dessa temática, mais especificamente sobre o atendimento do paciente em situação de urgência do APH móvel ao serviço hospitalar de emergência, ainda são insipientes, visto que esses ambientes de trabalho constituem uma importante área de atuação do enfermeiro. (7
O atendimento pré-hospitalar representado pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) caracteriza-se pela realização da assistência às pessoas em situações de agravos urgentes, podendo ser vítimas de trauma ou emergências clínicas, em eventos que ocorreram fora do ambiente hospitalar, visando à garantia de um atendimento precoce e adequado para o alcance do acesso universal na assistência em saúde.2 O objetivo do APH é diminuir o tempo de atendimento das vítimas de agravos à saúde de qualquer natureza no local de ocorrência e disponibilizar o deslocamento até as unidades hospitalares para possibilitar uma maior sobrevida e resolubilidade dos casos.6
O Corpo de Bombeiros integra o serviço de atendimento a emergências mais voltado ao resgate e prestação do atendimento básico de emergência, composta apenas por socorristas. Esses profissionais compreendem uma função norteadora do serviço de emergência que é prestar atendimento a vítima em tempo hábil sem agravar ou causar danos, articulando seu atendimento com os outros profissionais de saúde para um atendimento mais seguro e qualificado. (8)
É importante pontuar que a discussão sobre a organização e integração entre os serviços de emergência é uma problemática que não se restringe somente ao Brasil. Diante da complexidade da rede de atenção à saúde, pesquisadores da Noruega destacam a importância dos enfermeiros na negociação de recursos, provisão de equipamentos e cooperação entre os profissionais para os atendimentos de emergência. (9 No Canadá, observa-se aumento nos investimentos na atenção primária para diminuição da procura por atendimento nos serviços de emergência, bem como internação hospitalar. (10 De forma semelhante, nos Estados Unidos, intervenções paramédicas na atenção primária têm contribuído para diminuição do atendimento a necessidades médicas não urgentes nos serviços de emergência via atendimento pré-hospitalar móvel. (11)
Portanto, reforça-se a importância da integração entre os serviços da rede de atenção as urgências para realização de encaminhamentos de apoio terapêutico visando à integralidade da assistência. Nesse sentido, justifica-se este estudo para ampliar a compreensão da prática do enfermeiro em emergência e avançar no entendimento sobre as peculiaridades do atendimento do paciente em situação de urgência desde o serviço pré-hospitalar móvel ao serviço hospitalar de emergência. Para tanto, delineou-se como questão de pesquisa: como se configura o atendimento a pacientes em situação de urgência desde o serviço pré-hospitalar móvel ao serviço hospitalar de emergência?
O objetivo deste estudo foi compreender o atendimento do paciente em situação de urgência desde o serviço pré-hospitalar móvel ao serviço hospitalar de emergência.
Método
Trata-se de um estudo qualitativo, que possibilita o estudo de fenômenos subjetivos em contextos naturais. Utilizou-se a Teoria Fundamentada nos Dados (TFD) como referencial metodológico, o qual busca a compreensão dos significados relacionados às relações/interações entre os sujeitos envolvidos no contexto investigado. (12)- (13
O cenário de estudo foi um serviço hospitalar de emergência do município de Florianópolis, SC, Brasil, que presta atendimentos permanentes durante os sete dias da semana. Esse serviço é referência para o munícipio citado e região metropolitana no atendimento às urgências clínicas, cirúrgicas e traumatológicas, bem como no atendimento de demandas espontâneas trazidas por equipes do atendimento pré-hospitalar móvel.
A seleção dos participantes da pesquisa foi realizada com base na amostragem teórica, que se refere à definição de novos participantes visando explorar aspectos relevantes citados pelos enfermeiros para reforçar a obtenção dos dados e a formulação teórica-conceitual até o alcance da saturação teórica.12 Para a obtenção da saturação teórica, optou-se pela composição de grupos amostrais. O primeiro grupo foi formado por oito enfermeiros do serviço de emergência hospitalar supracitado. A partir da coleta de dados com esse grupo, identificou-se a necessidade de inserir na pesquisa profissionais do atendimento pré-hospitalar para entender a articulação entre esses serviços a partir de outras perspectivas. Assim, o segundo grupo foi composto por oito bombeiros militares atuantes na ambulância Auto Socorro de Urgência (ASU). O terceiro grupo foi composto por oito enfermeiros que atuam na ambulância Unidade de Suporte Avançado (USA) do SAMU. A composição do 2º e 3º grupo amostral foi importante para a compreensão da articulação entre o atendimento pré-hospitalar e o serviço hospitalar de emergência.
Dessa forma, a amostragem teórica deste estudo foi composta por 24 participantes, quando foi obtida a saturação teórica dos dados. Adotou-se como critério de inclusão experiência mínima de três meses no setor de trabalho ou na função. Considerou-se como critério de exclusão férias e/ou licença de qualquer natureza durante o período de coleta de dados. O tempo de três meses de experiência profissional foi considerando como um período mínimo para adaptação à função exercida.
A coleta de dados foi realizada entre de abril e setembro de 2016, por meio de entrevistas individuais, semiestruturadas, gravadas em meio digital, no local de trabalho ou outro ambiente escolhido pelos participantes. As entrevistas foram realizadas pelo pesquisador principal, tiveram duração média de oito minutos e foram transcritas na íntegra. Ressalta-se que concomitantemente a coleta de dados também foi realizada a análise de dados, conforme preconiza o método.12
Para a análise de dados, adotaram-se as duas etapas do sistema de codificação da vertente construtivista da TFD: codificação inicial e focalizada. Na fase inicial, ocorreu a denominação de cada segmento de dado incidente por incidente visando à identificação de conceitos. Na fase focalizada, os códigos iniciais mais significativos e/ou frequentes foram classificados, integrados, sintetizados e organizados em subcategorias e categorias até a obtenção da categoria central ou do fenômeno.13 Ao longo do processo de coleta e análise de dados, elaboram-se memorandos e diagramas como estratégia auxiliar de teorização.
A partir do processo de análise, obteve-se um modelo teórico composto por sete subcategorias e três categorias, que sustentam o fenômeno: “Realizando o atendimento do paciente em situação de urgência do serviço pré-hospitalar móvel para o serviço hospitalar de emergência”. Realizou-se a validação do modelo teórico com dois enfermeiros da área de urgência/emergência e um pesquisador com experiência na metodologia.
Considerações éticas
Os aspectos éticos foram respeitados conforme a Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 466/12. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa de referência, sob parecer nº 1.449.449 e CAAE 50915915.2.0000.0121. As entrevistas foram consentidas após a explicação dos objetivos e método do estudo, bem como assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido em duas vias. Preservou-se a confidencialidade da identidade dos participantes utilizando-se a inicial “P” referente à participante seguido do número ordinal de cada entrevista.
Resultados
A amostra teórica do estudo foi composta de 24 participantes. O primeiro GA foi formado por sete participantes do sexo feminino e um do sexo masculino com idade entre 29 e 53 anos. O segundo grupo foi constituído por oito bombeiros militares atuantes na ambulância Auto Socorro de Urgência (ASU), sendo todos do sexo masculino e idade entre 28 e 48 anos. O terceiro GA foi composto por seis participantes do sexo feminino e dois do sexo masculino, com idade entre 24 e 43 anos.
Apresentam-se as categorias e suas respectivas subcategorias, que sustentam o fenômeno: “Realizando o atendimento do paciente em situação de urgência do pré-hospitalar móvel para o serviço hospitalar de emergência” (Tabela 1).
CATEGORIA | 76.SUBCATEGORIA |
---|---|
Atendendo os chamados por atendimento | 79.Identificando a localização da viatura mais próxima. 80. Deslocando a viatura para o local da ocorrência |
Prestando atendimento ao paciente no local de ocorrência | 83.Destacando a qualidade e agilidade do atendimento dos Bombeiros e do SAMU 84. Transportando o paciente para o atendimento hospitalar |
Realizando atendimento ao paciente no serviço hospitalar | 87.Avaliando o paciente no serviço de emergência 88. Realizando cuidados necessários para pacientes 89. Enfrentando dificuldades para o acolhimento no serviço de emergência |
A seguir, apresentam-se cada uma das categorias e suas subcategorias.
Categoria 1 - ATENDENDO OS CHAMADOS POR ATENDIMENTO
Identificando a localização da viatura mais próxima
O atendimento da chamada ocorre por meio da central de regulação, que é responsável pela verificação do local, identificação da situação do paciente e localizar a viatura mais próxima para o atendimento. Os atendimentos realizados pela central do serviço de emergência são cruciais para o desencadeamento da ocorrência. Os atendentes verificam as necessidades dos pacientes de acordo com as informações que lhe são repassadas e acionam a viatura e ambulância mais próxima do local de atendimento.
“A atendente identifica o tipo de ocorrência, identifica a viatura mais próxima e nos manda no caso de atendimento pré-hospitalar” (P4).
“Nosso acionamento ocorre por meio da nossa central de regulação, a vítima ou alguém liga no192 e solicita o atendimento, explica o que está acontecendo e a nossa central nos aciona pelo rádio ou pelo telefone” (P6).
“O atendente busca conseguir com o solicitante todas as informações necessárias [...] Quando somos acionados recebemos um resumo do caso” (P5).
Deslocando a viatura para o local da ocorrência
As ações realizadas para o atendimento à vítima são realizadas de forma sistemática, organizada e ordenada e tem como finalidade dar continuidade a um atendimento previamente iniciado. Nas bases operacionais, as equipes atuantes no serviço de atendimento pré-hospitalar móvel aguardam pelo acionamento. Quando acionadas, as equipes deslocam-se para o local ordenado pela central. Ao chegar, reportam a ocorrência para a central e iniciam a assistência ao paciente.
“A guarnição então é deslocada, vamos até o local e atendemos a ocorrência. Geralmente fizemos regulação com o SAMU e se precisar acionamos o apoio da unidade avançada” (P3). 106. “A partir do momento que você recebe o acionamento você tem o J9 que é a saída da ambulância [...]. Sempre com liberação da regulação. A regulação é soberana” (P7).
No decorrer do atendimento ao paciente, os profissionais reportam-se constantemente à central de regulação informando sobre a gravidade do quadro clínico do paciente, solicitando apoio e buscando informações sobre o hospital para qual o paciente deve ser encaminhado. Durante a ocorrência, a central de regulações tem papel fundamental na articulação entre os diferentes profissionais envolvidos no caso.
“Quando uma ambulância básica ou o corpo de Bombeiros solicita o apoio, sempre tentamos acionar a ambulância mais próxima do local solicitado. Sempre com liberação da regulação, eles são os nossos olhos” (P7).
“A central de regulação que determina algumas de nossas ações, chegamos no local e avaliamos o paciente, o médico faz ligação para a central passando o caso e informamos quais as condutas que foram tomadas [...] a central entra em contato com os hospitais solicitando leito, a gente aguarda a resposta” (P11)
“Quando estamos em uma ocorrência onde precisamos de apoio, entramos em contato com a central e a central solicita o apoio necessário” (P5).
Categoria 2 - PRESTANDO ATENDIMENTO AO PACIENTE NO LOCAL DE OCORRÊNCIA
Destacando a qualidade e agilidade do atendimento dos Bombeiros e do SAMU
Como o atendimento é realizado em um ambiente aberto e não controlado, os profissionais buscam prover um atendimento de qualidade em tempo hábil dentro das condições ambientes e estruturais disponíveis. As equipes do atendimento pré-hospitalar interagem entre si durante as ocorrências e buscam, quando necessário, auxílio um do outro para o atendimento do paciente.
“É prover um serviço de qualidade, para não agravar nenhum tipo de lesão que o paciente tenha sofrido e amenizar o sofrimento” (P14).
“[...] Você atende na rua, na casa do paciente e é sempre um mistério, pois você nunca sabe o que esperar. É um ambiente que você não tem controle. Trabalhar no pré-hospitalar eu acho que é uma coisa de agilidade e rapidez, de raciocínio rápido” (P4).
“Em alguns momentos já aconteceram do paciente precisar do SAMU, do Bombeiro e da enfermagem e todos trabalham juntos” (P1).
“Temos uma integração boa, trabalhamos em parceria, um depende do outro, ninguém fará nada sozinho” (P8).
As equipes atuantes no serviço de atendimento pré-hospitalar possuem atuações distintas na hora do atendimento ao paciente. O bombeiro é responsável principalmente pelo resgate e o SAMU é responsável por atendimentos de maior gravidade clínica.
“Às vezes nós não temos como atender o paciente sem a presença do bombeiro. Resgate veicular, se precisar desencarcerar, quem tem esse tipo de material é o bombeiro, nós não temos. Maca de ribanceira quem tem é os bombeiros, nós não temos. Resgate aquático, eles têm materiais e preparo para fazer. Nós precisamos do apoio do bombeiro porque se faz presente e é necessário” (P7).
“O bombeiro e o SAMU eles trabalham de forma diferente. Bombeiro é mais voltado à parte do resgate e SAMU é um atendimento voltado a cuidados específicos” (P21).
Transportando o paciente para o atendimento hospitalar
Os bombeiros realizam apenas o resgate e o suporte básico de vida deslocando a vítima para o atendimento hospitalar. Ao chegar ao local ordenado pela central, as equipes iniciam a assistência ao paciente em situação de agravo de saúde. Nesse processo, a boa comunicação entre os profissionais é condição importante para um atendimento de qualidade.
“Chegamos no local da ocorrência e fizemos a análise da vítima, encaminhamos ao hospital” (P22).
“Fazemos o básico até chegar ao hospital. Tentamos fazer que o atendimento seja o mais rápido possível para que a vítima chegue no hospital, ela fique ao cuidado dos médicos e enfermeiros” (B13).
“Temos uma boa comunicação na hora do atendimento e do encaminhamento dos pacientes” (P1)
“Temos uma integração boa, trabalhamos em parceria” (P8).
Categoria 3 - REALIZANDO ATENDIMENTO AO PACIENTE NO SERVIÇO HOSPITALAR
Avaliando o paciente no serviço de emergência
Ao chegar na emergência hospitalar o paciente é recepcionado pela equipe do setor que averigua com os profissionais que o trazem e com o paciente, quando possível, o histórico da ocorrência para dar início aos atendimentos cabíveis naquele momento.
“O paciente chega com o profissional de ambulância. Esses profissionais se dirigem ao enfermeiro que em seguida vai direcionar ao médico responsável” (P1).
“Primeiro vemos o histórico, o que aconteceu, o porquê que ele veio, como é que ele está os sinais vitais [...] a partir dos sinais vitais e o que eles relatam que encontraram na cena, então direcionamos o fluxo de atendimento” (P4).
Os pacientes são atendidos, acolhidos e avaliados inicialmente pelo enfermeiro que os classificam conforme a gravidade. Todos os pacientes são acolhidos mediante sistema de classificação de risco e posteriormente recebem cores caracterizando a sua gravidade.
“Fizemos o acolhimento com classificação de risco. Se o paciente é grave ele é vermelho ou laranja e é atendido na reanimação, se não, se é amarelo ou verde, ele é atendido pelo pessoal aqui de fora, de acordo com a classificação” (P4).
“Quando a gente chega já é feito uma triagem para saber qual é a gravidade e complexidade do paciente. Os enfermeiros são bem receptivos, o trabalho é muito profissional” (P13).
“O enfermeiro ele tem uma visão ampla e detalhada. A gente consegue perceber e ter um domínio melhor e dar um fluxo para o paciente” (P14).
Realizando cuidados necessários para os pacientes
Após avaliação do paciente pela equipe da emergência hospitalar, este recebe os cuidados necessários para a estabilização e melhora do seu quadro clínico.
“Encaminhamos para reanimação e monitoramos, chamamos o médico para avaliar também. Se for um paciente poli traumatizado ou que necessite, fará exames de imagem, cirurgia. Depende de cada paciente” (P8).
“O enfermeiro avalia, em seguida é direcionado ao médico responsável e realizamos as condutas necessárias, depende do caso” (P1).
A compreensão dos profissionais do atendimento pré-hospitalar em relação ao importante trabalho desenvolvido no serviço de emergência hospitalar é perceptível. Nesses profissionais, busca-se o apoio os recursos necessários para o atendimento ao paciente.
“Às vezes eu me coloco no lugar do pessoal da emergência. Está lotado não tem aonde colocar pacientes. Sei o quanto é difícil e estressante. Só que a gente precisa de recurso” (P11).
“A equipe do hospital é desfalcada. Eu entendo que é complicado para ele a sobrecarga de trabalho, sempre que pode, ajudamos” (P4).
“Poderia ser melhorado as condições de trabalho para o funcionário porque repercute no todo, se tiver profissional suficiente eles não vão ficar tão estressados. A Sobrecarga, quando se trabalha em um ambiente muito congestionado acaba prejudicando a vida da pessoa e profissional” (P8).
Devido ao intenso fluxo de atendimento, ambiente lotado e estresse, os profissionais, muitas vezes, acabam discutindo. Cabe ressaltar que ambos buscam manter sempre a compreensão do trabalho do outro profissional.
“Outra coisa muito importante que eu acho que visa à humanização do paciente por mais que seja difícil e complicado, estressante entre os dois lados é nunca entrar em conflito e atrito na frente do paciente principalmente quando o paciente está consciente ou que tenha familiar próximo” (S1).
“Essa questão da humanização, a gente tem que lembrar. Talvez sair um pouco do modo automático, do protocolo, do que é pra ser e ser seguido e lembrar que todo mundo é humano” (S3).
Enfrentando dificuldades para o acolhimento no serviço de emergência
As emergências hospitalares possuem um fluxo intenso de atendimento. A prestação e melhoria desse serviço são dificultadas pela grande demanda de atendimentos e profissionais e infraestrutura insuficientes, como evidenciado:
“É complicado, as emergências não têm uma boa estrutura” (S8).
“O acolhimento não é tão bom porque não temos recursos humanos e estrutura física adequada. A planta física do hospital, não proporciona um bom atendimento a esses pacientes que muitas vezes ficam expostos nos corredores” (E7).
“Temos uma defasagem de profissional. Atendemos com rapidez, porque tem que atender muitos. Com número de profissionais adequado, a qualidade poderia melhorar muito” (E5).
Discussão
O atendimento realizado pelo serviço móvel de atendimento pré-hospitalar é iniciado no momento da chamada por telefone por profissionais na central de regulação. Os profissionais que recebem o chamado colhem os dados que são relevantes para o sequenciamento das ações e o atendimento da ocorrência. A construção dessa dinâmica de estruturação da rede, passa pela implementação de estrutura e mecanismos reguladores dos fluxos de usuários e permite uma comunicação mais efetiva entre os usuários que solicitaram o atendimento. As centrais de regulação visam ao acolhimento do chamado de socorro, priorizam o atendido de menor tempo possível e assim permitindo o encaminhamento correto dos pacientes solicitantes de socorro para outros níveis de complexidades de atendimento. (14
Nos resultados, sobressaiu-se a articulação entre o SAMU, bombeiros e o serviço hospitalar de emergência. Os bombeiros são responsáveis pelo resgate das vítimas que acionaram o atendimento, enquanto o SAMU é responsável por atendimentos de pacientes com maior gravidade e o encaminhamento ao serviço de emergência. Estudo brasileiro sobre a qualidade do cuidado no atendimento pré-hospitalar identificou que a articulação entre os serviços é uma condição essencial para a qualidade do atendimento, proporcionando encaminhamentos mais resolutivos e cuidados mais seguros. (15 De modo semelhante, estudo norte-americano identificou que o trabalho em equipe e a boa comunicação entre os profissionais de saúde atuantes dos serviços de emergência são fundamentais para a excelência dos cuidados prestados. (16
A comunicação foi um aspecto relevante destacado entre os profissionais nos diferentes momentos do atendimento ao chamado para os diferentes profissionais envolvidos tenham entendimento dos encaminhamentos dado ao solicitante do atendimento. A comunicação é essencial desde o recebimento da chamada até o seu desdobramento no serviço hospitalar de emergência permitindo que os profissionais atuem de maneira complementar e assegurando a integralidade da assistência. Estudo aponta que as falhas de comunicação entre profissionais no atendimento móvel de urgência impactam diretamente na qualidade, na resolutividade e nos encaminhamentos dos atendimentos, podendo ser um fator determinando na qualidade da assistência. (17
Pesquisa realizada na Espanha corrobora os achados desta pesquisa destacando que a boa comunicação entre as equipes responsáveis pelo atendimento Pré Hospitalar e Setor de emergência hospitalar favorece uma assistência mais segura ao paciente. Os autores destacam a necessidade de padronização no processo de transferência do paciente entre o serviço pré-hospitalar e o setor de Emergência Hospitalar, a fim de melhorar a comunicação entre as equipes e evitar perda de dados e eventos adversos, o que consequentemente pode aumentar a segurança clínica do paciente. (18
Já no serviço hospitalar de emergência, os pacientes são acolhidos pela equipe do setor que averigua com os profissionais que o trazem, informações sobre a condição clínica e o histórico da ocorrência. Posteriormente, é realizada uma classificação de risco para que se dê início aos cuidados necessários ao paciente. Estudos evidenciam que o enfermeiro é considerado o profissional mais indicado para classificar o risco do paciente, visto sua capacidade técnica e científica. (19), (20 O acolhimento funciona com um importante mecanismo para receber pacientes externos permitindo que o enfermeiro priorize e direcione o fluxo de atendimento dos pacientes.18,20
No Brasil, a intensa procura pelos serviços hospitalares de emergência demanda desafios cada vez maiores para os profissionais e para a instituição, já que o atendimento nesses serviços necessita cada vez mais de cuidados ágeis e complexos. (21 Resultados semelhantes foram destacados em um estudo na Califórnia (Estados Unidos) que identificou aumento constante entre 2005 e 2015 de atendimento nos prontos socorros, necessitando de um olhar cuidadoso dos formuladores de política. (22
Os serviços de urgência e emergência são marcados por alta procura por atendimento, ampla rotatividade e alto índice de absenteísmos que influenciam diretamente o ambiente de trabalho. Isso reforça que os enfermeiros devem se adequar cotidianamente, a estrutura e a forma do serviço primando pela qualidade assistencial, principalmente por meio da gestão do cuidado.21, (23
Por fim, é importante considerar ainda o estresse dos trabalhadores e infraestrutura insuficientes para o trabalho. Esses aspectos influenciam diretamente na qualidade da assistência prestada e podem ainda prometer a saúde dos trabalhadores no exercício da sua função. (24 Nesse sentido, é importante que gestores de enfermagem e saúde discutam e busquem estratégias para a melhoria das condições de trabalho em emergência visando à qualidade do cuidado aos pacientes.
Conclusões
Os resultados ressaltam a importância da articulação entre os serviços que prestam atendimento aos pacientes em situações de urgência sendo eles: prontidão dos profissionais; acionamento do serviço de emergência, deslocamento para a ocorrência; atendimento ao paciente no local, transporte do paciente e acolhimento da equipe no ambiente hospitalar, dando continuidade à assistência anteriormente iniciada.
Como limitação do estudo, os resultados da pesquisa estão circunscritos a um contexto específico o qual pode comprometer a aplicabilidade a outros cenários de pesquisa. Sugere-se, então, a produção de novos estudos envolvendo os demais pontos da rede de atenção às urgências e pesquisas que busquem compreender a visão dos pacientes acerca das vivências relacionadas a articulação entre o APH e o serviço hospitalar de emergência para o desenvolvimentode e para melhorias das condições da prática profissional nos serviços de emergência visando à qualidade do cuidado aos pacientes e profissionais