Introdução
A tuberculose (TB) é uma doença infectocontagiosa, causada pelo Mycobacterium tuberculosis (MTB), sendo considerada um problema de saúde pública pela sua elevada incidência, prevalência e por acometer com maior frequência as populações que vivem em condições socioeconômicas precárias, principalmente nos países em desenvolvimento.1
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a TB é a principal causa de morte por um único agente infeccioso em todo o mundo.1 Estima-se que em 2018, 10 milhões de novos casos ocorreram em todo o mundo e que 1,5 milhão morreu em virtude da doença.1 No mesmo período, no Brasil, as taxas de incidência e mortalidade de tuberculose foram de 45 casos/ 100.000hab. e 2,3 óbitos/100.000hab., respectivamente.1
No Maranhão, dentre os 217 municípios, oito são considerados prioritários para o controle da TB por apresentarem população acima de 100.000hab. e carga bacilar elevada.2 Conforme dados do Ministério da Saúde, no Estado, foram notificados em 2019 um total de 2.153 casos novos de TB e 156 óbitos, em 2018, o que representa um coeficiente de mortalidade de 2,2 óbitos por 100.000hab.2
O óbito por TB é um evento que se encontra na lista de causas de mortes evitáveis, uma vez que se instituídas ações adequadas de promoção, proteção e recuperação da saúde dos indivíduos e famílias pelos sistemas locais de saúde, esse evento não ocorreria, ou seja, os óbitos por TB são injustificáveis, uma vez que o diagnóstico é relativamente simples e o tratamento gratuito, disponibilizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), é 99,9% eficaz.3
Assim como ocorre em outras endemias, o comportamento da TB é fortemente influenciado pelo meio, sendo possível evidenciar que a associação entre TB e precárias condições socioeconômicas data dos primórdios da epidemiologia dessa doença, reiterando, portanto, a necessidade de estudá-la e sobre ela intervir, levando-se em consideração sua distribuição espacial.3,4,5,6Ademais, estudos de mortalidade são de grande importância por acompanhar e revelar a magnitude dos danos de determinada doença ou agravo.3
A TB, como problema de saúde pública, requer um esforço coletivo para mudar os seus padrões endêmicos, não estando restritas às ações de controle da doença, mas, sobretudo à mudança nos indicadores socioeconômicos e das condições de saúde da população.6
Apesar disso, a discussão de padrões espaciais da TB e sua relação com indicadores socioeconômicos no Maranhão ainda é incipiente. Assim, buscou-se por meio da aplicação de métodos espaciais, analisar a distribuição espacial dos óbitos por TB no Estado do Maranhão no período de 2010 a 2015, correlacionando com indicadores socioeconômicos.
Metodologia
Trata-se de um estudo ecológico tendo como unidade de análise os municípios maranhenses. O Maranhão localiza-se no extremo oeste da Região Nordeste do Brasil, sua área é de 329.65,496 km² e população estimada de 7.153.262 habitantes, em 2021.7 Possui atualmente um total de 217 municípios.8 Todos os municípios maranhenses têm Índice de Desenvolvimento Humano Municipal classificado de médio a baixo, apresentando assim péssimos indicadores socioeconômicos.8
A população em estudo foi constituída de todos os óbitos por TB no Maranhão notificados no Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) no período de primeiro de janeiro de 2010 a 31 de dezembro de 2015. Considerou-se caso de óbito por TB quando o indivíduo morreu em consequência da doença ou em decorrência dos efeitos adversos das drogas utilizadas nos esquemas terapêuticos. Foram excluídos os óbitos que não continham a informação ''município de residência''(pois inviabilizaria a análise espacial).
Para as informações relativas aos óbitos por TB foram utilizados dados do SIM. Para obtenção das informações socioeconômicas e demográficas sobre a população e domicílios foi utilizada a base de dados do Censo Demográfico de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).8
Os indicadores socioeconômicos e demográficos utilizados foram: o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) e o índice de Gini obtidos do Censo de 2010 no portal do IBGE. Utilizou-se a classificação do IDHM do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD): muito baixo (até 0,499), baixo (0,500 até 0,599), médio (0,600 até 0,699), alto (0,700 até 0,799) ou muito alto (maior ou igual a 0,800), além da renda média per capita, expectativa de vida e taxa de analfabetismo.8
O cálculo da taxa de mortalidade por tuberculose foi feito a partir da razão entre o número de óbitos por tuberculose e o tamanho da população de cada município no período de 2010 a 2015, multiplicado por 100.000 habitantes.9 A população por município foi obtida do Censo de 2010 no site do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.8
Para a análise espacial dos dados, aplicou-se o Índice de Moran Global e Local. O índice de Moran global foi utilizado para verificar a autocorrelação espacial da área estudada com o indicador de mortalidade estudado.10 O índice de Moran local foi utilizado para verificar o padrão da distribuição espacial, a presença de cluster e a intensidade dos aglomerados com relação aos casos de óbitos por tuberculose nos municípios, de acordo com suas proporções.10 Utilizou-se ainda o correlograma e espalhamento do índice de Moran, cujos gráficos expressam os valores obtidos pelo índice de Moran, com a formação dos seguintes quadrantes espaciais: Q1 e Q2, que indicam associação espacial positiva, e; Q3 e Q4 pontos negativos de associação espacial, caracterizando observações discrepantes.10
Realizou-se estudo de detecção de cluster (do inglês conglomerado) espacial via método Scan Espacial.11 Esse método, realiza uma varredura espacial sobre o mapa testando todos os grupos possíveis de municípios (conjunto de áreas) no que diz respeito a significância estatística do risco relativo observado (representa o quanto uma área é mais ou menos susceptível a ter a presença do evento em relação às demais áreas de toda a extensão territorial estudada).11 O conjunto de áreas com risco significativo é chamada de vulnerável porque o risco de morte por TB é verdadeiramente maior em relação às outras áreas restantes do mapa.12 O método Scan identifica o aglomerado espacial que mais provavelmente viole a hipótese nula de não aglomeração e identifica os clusters primário e secundários. É considerado cluster primário aquele com a máxima verossimilhança, sendo este o cluster que tem a menor probabilidade de ter aleatoriamente. Os aglomerados secundários são ordenados de acordo com seus testes estatísticos de razão de verossimilhança.11
Foram gerados os mapas temáticos utilizando-se o pacote spdep do programa estatístico R. As malhas digitais cartográficas dos municípios foram adquiridas no IBGE.
Para avaliar associação espacial de óbitos por TB com os indicadores socioeconômicos, foram ajustados diferentes modelos espaciais condicionais autorregressivos (CAR), tendo como variável dependente o número de óbitos por tuberculose no período em estudo. Verificou-se ainda excesso de zeros na variável dependente, com a finalidade de avaliar a suposição de distribuição de Poisson para a variável dependente. O modelo espacial condicional autorregressivo (Conditional Auto Regressive - CAR) capta a dependência espacial da variável dependente e as variáveis independentes, sendo expresso por: Y = Xβ + ε com ε = λW ε + ξ, sendo ε a componente do erro com efeitos espaciais, λ o coeficiente autorregressivo, W a matriz de vizinhança espacial, Y a variável dependente, X as variáveis independentes e ξ a componente do erro com variância constante e não correlacionada.13
As variáveis independentes incluídas no modelo CAR referem-se aos indicadores socioeconômicos municipais, a saber: índice de Gini, renda média per capita, índice de desenvolvimento humano municipal, expectativa de vida em anos e taxa de analfabetismo.
Considerando ainda que o fenômeno de sobredispersão ocorre frequentemente com dados de conta-gem, vários modelos espaciais na classe dos inflacionados de zeros foram ajustados: Modelo CAR Poisson (pois.CAR), Modelo CAR Poisson Inflacionado de Zeros (zip.CAR), Modelo CAR Poisson Generalizado (pg.CAR), Modelo CAR Poisson Generalizado Inflacionado de Zeros (zipg.CAR).14 Esses modelos foram comparados de acordo com a estatística DIC (Critério de Informação do Desvio) que mede o desvio do modelo estimado, sendo que quanto menor, mais ajustado está o modelo em relação aos dados. Para comparar estes modelos utilizou-se o pacote do R spatialcounts.14
Os softwares utilizados foram Excel 2013 para a organização e tabulação dos dados, o programa R e SaTSan para a análise estatística e elaboração dos mapas e gráficos.
Em virtude da utilização de dados secundários de domínio público, não se fez necessária a apreciação deste estudo por comitês de ética em pesquisa, conforme o artigo 1º, em seu parágrafo único, da Resolução nº 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde do Brasil.
Resultados
Foram observados 949 óbitos por tuberculose no Maranhão (Brasil) de 2010 a 2015 para uma população em risco de aproximadamente 6.574.789 habitantes no período, resultando em uma taxa anual de 2,88 óbitos por TB para cada 100.000hab. Convém ressaltar, que mais de 50% dos municípios apresentaram taxa de mortalidade acima de 5,6/100.000hab.
Analisando as taxas de mortalidade por TB no Maranhão (Figura 1), observamos muitas taxas zero, em virtude de vários municípios não registrarem óbitos por TB no período.
Por outro lado, 25% dos municípios apresentaram este indicador acima de 11,9 para cada 100.000hab. Os municípios com taxas de mortalidade mais elevadas foram: Brejo de Areia (53,8 óbitos/100.000hab.), Junco do Maranhão (49,8 óbitos/100.000hab.), Governador Nunes Freire (39,4 óbitos/100.000hab.) e São Luís (36,7 óbitos/100.000hab.) (Figura 2).
A partir do mapa de risco relativo (Figura 2) observou-se que 19% dos municípios apresentaram risco de ocorrer óbito por TB acima do esperado. O risco extremo (ou maior risco) foi observado no município de Brejo de Areia (3,73) para uma população em risco de aproximadamente 5 mil hab. Em São Luís, o risco foi 2,54 vezes maior do que o esperado.
Quanto às áreas de maior vulnerabilidade espacial para a ocorrência de óbitos por TB, o município de São Luís apresentou vulnerabilidade primária, Imperatriz identificado como área de vulnerabilidade secundária e Grajaú (em azul) foi detectado como área de vulnerabilidade terciária (Figura 2).
A análise espacial revelou um índice de Moran global de 0,10 (p=0,0045), indicando dependência espacial significativa entre as taxas de óbito por tuberculose no Estado do Maranhão (Brasil), ou seja, as taxas de mortalidade por TB nos municípios não são dependentes das taxas apresentadas em municípios vizinhos.
A Figura 3 apresenta o correlograma e o diagrama de espalhamento do índice de Moran e evidenciam o comportamento espacial das taxas de óbitos. Observa-se que maior parte das taxas estão localizadas nos quadrantes Q1 e Q3, que apresentam dependência espacial positiva. As taxas localizadas nos quadrantes Q2 e Q4 podem ser vistos como regiões que não seguem o mesmo processo de dependência espacial das demais taxas.
Na figura 4, o mapa de probabilidades de óbitos por tuberculose para o modelo pois.CAR ajustado revela que aproximadamente 12% dos municípios possuem mais que 75% de chance (probabilidade maior que 0,75) de ocorrer um óbito por Tuberculose. O mapa indica ainda que o norte e a parte central do Estado são as regiões que concentram as maiores probabilidades de óbito por TB.
Na figura 4, o mapa de probabilidades de óbitos por tuberculose para o modelo pois.CAR ajustado revela que aproximadamente 12% dos municípios possuem mais que 75% de chance (probabilidade maior que 0,75) de ocorrer um óbito por Tuberculose. O mapa indica ainda que o norte e a parte central do Estado são as regiões que concentram as maiores probabilidades de óbito por TB.
A análise comparativa das medidas de ajuste dos modelos utilizados demonstrou que o modelo CAR Poisson apresentou menor valor do DIC, ou seja, a distribuição de Poisson ajustou-se melhor aos dados. Os resultados do referido
modelo evidenciaram que o IDHM esteve negativamente associado com a taxa de óbitos por TB (coeficiente=-148,38; p= 0,0381), enquanto renda média per capita apresentou associação positiva (coeficiente= 0,31; p < 0,001) (Tabela 1).
Discussão
Propôs-se com o estudo analisar a distribuição espacial dos óbitos por tuberculose no Estado do Maranhão (Brasil) no período de 2010 a 2015 e sua associação com indicadores socioeconômicos. Verificamos que a taxa anual de óbitos por TB no Maranhão manteve-se dentro do intervalo de variação (2,8 a 2,2 óbitos/100mil hab.) das taxas nacionais observadas para os anos de 2004 a 2015, respectivamente, segundo estudo nacional que avaliou a situação epidemiológica e operacional da TB no Brasil.15 A despeito da tendência decrescente observada no país, a mesma condição não foi observada em muitos municípios do Maranhão que apresentaram valores flutuantes e até mesmo mais elevados, se comparados os seis anos deste estudo com os dados nacionais.
Modelo | DIC | ||
pois.CAR | 834,20 | ||
zip.CAR | 931,24 | ||
pg.CAR | 1033,23 | ||
zipg.CAR | 1027,65 | ||
Variável | Coeficiente | Erro padrão | Valor p |
IDHM | -148,38 | 71,57 | 0,0381* |
Gini | 55,03 | 32,22 | 0,0876 |
Renda média per capita | 0,31 | 0,04 | < 0,001* |
Expectativa de vida | -0,04 | 1,09 | 0,9734 |
Taxa analfabetismo | 0,09 | 0,40 | 0,8178 |
Fonte: elaboração própria, com base nos dados do SIM.
Considera-se o óbito por TB um evento evitável, ou seja, a sua ocorrência reflete as fragilidades na assistência ao paciente pelo serviço de saúde, e representa uma ocasião concreta para identificação de determinantes e condicionantes no processo de adoecimento, não somente para o indivíduo, mas para a coletividade.3A TB tem sido a doença infecciosa que mais causou mortes no mundo, exceto durante o período de pandemia da Covid-19.16
No contexto maranhense, o município de Brejo de Areia, classificado pelo IBGE como de pequeno porte (população de até 5 mil hab.),7 chama atenção por sua elevada taxa de mortalidade. O referido município possui IDHM baixo (0,519), 17 tal condição está relacionada às condições de vida das populações, pois, além do diagnóstico precoce, do tratamento adequado e da vigilância epidemiológica, o enfrentamento das iniquidades e a adequação dos programas de controle às realidades locais são fatores relevantes para a eliminação da doença, consequentemente, evitando o desfecho óbito.3,6,18
Em particular, o município de Junco do Maranhão apresentou elevado risco de óbito, uma vez que eram esperados 0,67 casos no período e foram observados três casos. Os dados sociais e econômicos desse município são semelhantes aos de Brejo de Areia, além de ambos fazerem parte da mesma mesorregião, o Oeste maranhense, área em que os municípios apresentam IDHM baixo.17 No entanto, vale ressaltar que em municípios de pequeno porte a ocorrência de um óbito altera significativamente a taxa de mortalidade.
Ainda na mesorregião oeste maranhense, está localizado o município de Governador Nunes Freire, também classificado com IDHM baixo (0,569),17 e com dados socioeconômicos semelhantes aos dois municípios anteriormente citados. É importante destacar, no centro leste do mapa, a formação de um agrupamento de municípios com taxas de mortalidade por TB oscilando de 10 a 20 mortes por 100.000 hab.
Cerca de 19% dos municípios apresentaram risco de morte por TB acima do esperado. O risco extremo (ou maior risco) foi observado no município de Brejo de Areia (3,73) para uma população em risco de aproximadamente 5 mil hab., ou seja, o município possui três vezes mais óbitos observados do que o esperado.
O risco mensurado na capital São Luís foi de 2,54, ou seja, observou-se um excesso de mortes por TB. No entanto, a população em risco em São Luís é maior que um milhão de hab. Este fato, demostra que um risco relativo menor em uma população maior, pode ser mais significativo que um risco maior em uma população muito pequena.
O município de São Luís apresentou vulnerabilidade primária ou mais grave. Eram esperados para este município 146 casos, porém, foram observados 372. O município de Imperatriz foi identificado como área de vulnerabilidade secundária com um risco de óbito 1,94 maior que todo o restante do Estado e uma população em risco de quase 250 mil hab. Esses dois municípios são áreas metropolitanas, onde a TB encontra condições favoráveis à sua dispersão em virtude dos aglomerados populacionais aliados à urbanização acelerada que favorecem altas taxas de desemprego, diminuição do nível salarial, e pobreza, além de precárias condições de habitação e nutrição.19
Esses resultados corroboram ainda com uma investigação nacional realizada por Harling e Castro20 sobre a distribuição espacial da TB e sua relação com fatores socioeconômicos, os mesmos identificaram taxas de notificação de TB com altos índices agrupados em torno de cidades especialmente na costa leste e no litoral, onde se concentram as maiores aglomerações urbanas e grandes populações em situação de vulnerabilidade.
Observou-se que o munícipio de Grajaú foi classificado como área de vulnerabilidade terciária, com um risco de óbito 2,03 maior para uma população em risco de aproximadamente 62 mil hab., sendo classificado com IDHM médio (0,609).17O quarto município com alta vulnerabilidade de óbito por TB foi Caxias, que apresentou um risco de 1,56 para uma população de 155 mil hab., com IDHM médio (0,624), pertencente à mesorregião leste maranhense.17
Encontrou-se ainda um agrupamento formado pelos municípios de São Mateus do Maranhão, Alto Alegre do Maranhão, Coroatá, Peritoró, São Luís Gonzaga do Maranhão, Bacabal e Pirapemas, como região de vulnerabilidade, com um risco de óbito 1,34 em uma população de quase 285 mil hab. A maioria destes municípios possuindo IDHM baixo e pertencente à mesorregião leste maranhense. Apenas dois municípios deste aglomerado possuíam IDHM médio (Bacabal e São Mateus do Maranhão), ambos da mesorregião centro maranhense.17
Verificou-se dependência espacial das taxas de óbito por TB no Estado, atestado pelo Índice de Moran. Esse achado corrobora a não aleatoriedade na ocorrência de óbitos por TB, mostrando que há uma forte relação entre a distribuição dos óbitos e o local onde ele ocorre, sendo mais incisiva em grupos com maior desvantagem social, como evidenciado por outros autores.3,6,18,19,20
Com base nos resultados do modelo CAR foi possível detectar dependência espacial significativa negativa entre números de óbitos por tuberculose e IDHM, apontando que quanto menor IDHM do município, maior número de óbitos, corroborando com estudo que encontrou associação entre morbidade por TB e o IDH de 2005 a 2011 em 165 países.21 Em outro estudo, verificou-se que quanto maior o índice de desenvlvimento humano, menor na taxa de incidência da doença, consequentemente, também menor a mortalidade.22 A relação inversa encontrada em nosso estudo constata a realidade da maioria dos municípios maranhenses que são classificados como IDHM baixo, refletindo condições de baixa escolaridade, renda per capita baixa, dificuldade no acesso à informação e aos serviços de saúde.8
Outro indicador relacionado com o número de óbitos por TB no Maranhão foi a renda média per capita, porém com relação positiva, evidenciando quanto maior a renda média per capita do município, maior a quantidade de óbitos. Este resultado vai de encontro ao observado em estudos nacionais e internacionais que verificaram a associação entre a incidência e mortalidade por tuberculose com fatores sociais e econômicos.18,19,20,21,22,23,24Por meio desses estudos pôde-se constatar a estreita relação existente entre renda baixa e maior vulnerabilidade à morbimortalidade por TB, uma vez que a pobreza de um país se associa com as condições ideais para a manutenção e aumento de doenças infectocontagiosas como é o caso da TB. 18,19,20,21,22,23,24 No entanto, frisa-se a desigual distribuição de renda existente no Maranhão (Brasil), e que a ocorrência do óbito onde há maior renda, certamente relaciona-se à concentração de renda, deixando importante quantitativo da população à mercê de condições precárias no estado.
No mapa de probabilidades de óbitos por tuberculose para o modelo CAR de Poisson ajustado, observa-se que aproximadamente 12% dos municípios possuem mais que 75% de chance (probabilidade maior que 0,75) de ocorrer uma morte por tuberculose. O mapa também mostra que o norte e a parte central do Estado são as regiões que concentram as maiores probabilidades de morte por TB, áreas que concentram as maiores populações do Estado e com indicadores socioeconômicos baixos. Áreas com maior iniquidade social tendem também a experimentar serviços de saúde pouco resolutivos e com limitações em termos de oferta e de elenco de serviços.19,20,21,22,25
Dessa maneira, temos que a acentuada desigualdade social no Brasil, em particular, no estado do Maranhão, observada no acesso aos recursos de saúde, educação, distribuição de renda, saneamento básico e em outros constituintes do padrão de vida da população, favorecem divergências relacionadas ao risco de adoecer e, consequentemente, de evoluir ao óbito nos diversos estratos sociais.19,20,21,24,25,27,28
Constatamos que elaboração de mapas temáticos é considerada instrumento relevante para a avaliação do desfecho óbito por TB no Maranhão (Brasil), pois possibilita a visualização espacial do evento, identificação de áreas de risco, sendo fonte segura para a proposição de políticas púbicas, medidas de vigilância em saúde e controle da doença.
As áreas identificadas nesse estudo carecem de atenção especial por meio de políticas de saúde, sejam curativas ou preventivas. Como a TB tem forte ligação com fatores sociais e econômicos, deve-se priorizar a diminuição das desigualdades sociais, e consequentemente, a melhoria dos indicadores sociais no estado.18,24,27,28
A utilização de sistemas de informação em saúde como fonte de dados é uma das fragilidades deste estudo, sobretudo em virtude da subnotificação no país - o que repercute negativamente em todo o processo de assistência à saúde no Brasil.26 Destacam-se como fragilidade as lacunas no preenchimento dos registros, que são informações importantes à gestão e ao planejamento em saúde. Nesse sentido, aperfeiçoar e melhorar a qualidade dos registros garante maior confiabilidade para posteriores análises epidemiológica. Outras dificuldades presentes foram à falta e as inconsistências das informações, o que gerou um expressivo número de variáveis sem dados.
Apesar das limitações, os resultados do presente estudo possibilitaram a identificação de áreas de vulnerabilidade para a ocorrência de óbito por TB no estado do Maranhão (Brasil), o que pode contribuir no planejamento das ações em saúde e na definição de um plano estadual de gestão mais próximo da realidade epidemiológica e social do Estado. Ademais, fornece valiosa informação para os serviços e profissionais que responsáveis pela assistência direta aos pacientes com TB, uma vez que identifica as localidades no estado que carecem de ações de cunho preventivo e diagnóstico, que se aplicadas podem impactar sobremaneira na ocorrência de óbitos.
Conclusão
Observou-se uma forte dependência espacial do desfecho, ou seja, a taxa de mortalidade por TB de determinada área, é afetada pelas taxas das áreas vizinhas. Foi possível ainda identificar as áreas com maior vulnerabilidade para a ocorrência do óbito, além de estabelecer dependência espacial entre os óbitos por tuberculose e os indicadores socioeconômicos IDHM e renda per capita média. Houve forte dependência espacial na ocorrência dos óbitos por TB, bem como altos índices agrupados em torno de cidades, especialmente na costa leste e no litoral, onde se concentram as maiores aglomerações urbanas e grandes populações em situação de vulnerabilidade. Faz-se necessária a adoção de estratégias especiais de acompanhamento dessa clientela, buscando reduzir essa taxa de mortalidade.
DECLARAÇÃO DE CONFLITO DE INTERESSE
Os autores declaram não haver conflitos de interesse para esse estudo.