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Enfermería Actual de Costa Rica

versión On-line ISSN 1409-4568versión impresa ISSN 1409-4568

Enfermería Actual de Costa Rica  no.38 San José ene./jun. 2020

http://dx.doi.org/10.15517/revenf.v0i38.37750 

Artículos de Revisión

Expansão das práticas integrativas e complementares no brasil e o processo de implantação no sistema único de saúde

Expansión de las prácticas integrativas y complementarias en Brasil y el proceso de implantación en el Sistema Único de Salud

Expansion of integrative and complementary practices in brazil and the process of implementation in the single health system

Ivana Santos Ferraz1  

Layres Canuta Cardoso Climaco2 

Juliane dos Santos Almeida3 

Stela Almeida Aragão4  

Luana Araújo dos Reis5  

Ismar Eduardo Martins Filho6 

1Enfermeira . Especialista em Gestão em Saúde e discente do Programa de Pós-graduação em Enfermagem e Saúde, nível Mestrado, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Correio eletrônico: ivanaferraz25@gmail.com

2Enfermeira. Especialista em Enfermagem Obstétrica e discente do Programa de Pós-graduação em Enfermagem e Saúde, nível Mestrado, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Correio eletrônico: laycanuta@gmail.com

3 Programa de Pós-graduação em Enfermagem e Saúde, nível Mestrado, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Correio eletrônico: almeida-ju@hotmail.com

4 Enfermeira. Discente do Programa de Pós-graduação em Enfermagem e Saúde, nível Mestrado, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Correio eletrônico: aragaostela@gmail.com

5 Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora da Faculdade Independente do Nordeste (FAINOR). Correio eletrônico: luareis1@hotmail.com

6 Cirurgião Dentista. Doutor em Odontologia Legal. Professor Adjunto do Departamento de Saúde II e do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem e Saúde da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Correio eletrônico: iemfilho@uesb.edu.br

Resumo

Este estudo teve como objetivo apresentar uma reflexão acerca da expansão da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde nos últimos 13 anos, no Brasil, tendo como pano de fundo analisar, no âmbito da pesquisa científica, a implantação das Práticas Integrativas e Complementares nos serviços de saúde e a implicação dos próprios autores nessa experiência. Trata-se de uma revisão integrativa, com análise da produção acadêmica nos últimos 13 anos (2006 a 2019), com busca na base de dados da Biblioteca Virtual em Saúde. Foram selecionados sete trabalhos que compuseram o corpo deste estudo. Diante das reflexões apresentadas neste estudo, é possível observar, ao longo dos últimos 13 anos, a presença da expansão das Práticas Integrativas e Complementares, sobretudo nas regiões Nordeste e Sudeste, sendo inegável o impacto positivo dessas práticas no Brasil. Contudo, a inserção das Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde configura uma ação de ampliação de acesso e qualificação dos serviços na perspectiva da integralidade da atenção à saúde da população. Diante do exposto, reafirma-se a necessidade de se empreenderem novos estudos acadêmicos, no que se refere aos movimentos de implantação da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde no Brasil, com vistas a análises direcionadas à redução significante de recursos financeiros principalmente pelo período político e econômico que o Brasil enfrenta atualmente.

Palavras chave: Sistemas Públicos de Saude; Sistema Único de Saúde; Terapias Complementares

Abstract

The present study aimed to present a reflection on the expansion of the National Policy of Integrative and Complementary Practices in the Unified Health System in the last 13 years in Brazil. health services and the implication of the authors themselves in this experience. This is an integrative review with analysis of academic production in the last 13 years (2006 to 2019) searching the database of the Virtual Health Library. We selected 7 papers that comprised the body of this study. Given the reflections presented in this study, it is possible to observe, over the last 13 years, the presence of the expansion of the Integrative and Complementary Practices, especially in the Northeast and Southeast, being undeniable the positive impact of these practices in Brazil.

However, the inclusion of Integrative and Complementary Practices in the Unified Health System constitutes an action to expand access and qualification of services, from the perspective of comprehensive health care for the population. Given the above, it is reaffirmed the need to undertake new academic studies regarding the implementation of the National Policy of Integrative and Complementary Practices in Health in Brazil, with a view to analyzes directed to significant reduction of financial resources, especially by political and economic period that Brazil faces today.

Keywords: Complementary Therapies; Health Unic System; Public Health System.

Resumen

El presente estudio tuvo como objetivo presentar una reflexión sobre la expansión de la Política Nacional de Prácticas Integrativas y Complementarias en el Sistema Único de Salud en los últimos 13 años en Brasil, con el trasfondo de analizar en el ámbito de la investigación científica la implementación de Prácticas Integrativas y Complementarias en servicios de salud y la implicación de los propios autores en esta experiencia. Esta es una revisión integradora con análisis de la producción académica en los últimos 13 años (2006 a 2019) buscando en la base de datos de la Biblioteca Virtual en Salud. Seleccionamos 7 documentos, que componen el cuerpo de este estudio. Dadas las reflexiones presentadas, es posible observar, en los últimos 13 años, la presencia de la expansión de las Prácticas Integrativas y Complementarias, especialmente en el Nordeste y Sudeste, siendo innegable el impacto positivo de estas prácticas en Brasil. Sin embargo, la inclusión de Prácticas Integrativas y Complementarias en el Sistema Único de Salud constituye una acción para ampliar el acceso y la calificación de los servicios, desde la perspectiva de la atención integral de salud para la población. Dado lo anterior, se reafirma la necesidad de emprender nuevos estudios académicos sobre la implementación de la Política Nacional de Prácticas Integrales y Complementarias en Salud en Brasil, con miras a análisis dirigidos a una reducción significativa de los recursos financieros, especialmente por período político y económico que enfrenta Brasil hoy.

Palabras clave: Sistemas-públicos-de-salud; Sistema-único-de-salud; Terapias-complementarias

Introdução

Diante das transformações do mundo contemporâneo, o campo das Práticas Integrativas e Complementares (PIC) é ainda recente e inexplorado, se comparado a outras áreas da saúde. Porém, já é possível verificar sua eficácia e efetividade quanto à promoção da saúde dos usuários e praticantes, à participação do usuário e ao empoderamento individual e comunitário1.

Nesse sentido, o crescimento da população, o aumento da expectativa de vida, a multiplicação de técnicas e novas especialidades médicas que proliferam de modo alucinante são, ao mesmo tempo, a riqueza e o drama maior do setor saúde, especialmente por afetarem as relações comunicativas, a ação coordenada dos novos conhecimentos e a integração do conjunto imenso de informações que se produz1.

O autor, ao enfatizar a importância da subjetividade nas práticas e nos cuidados médicos, afirma ser a pluralidade disciplinar o caminho para uma visão mais ampla e global do ser humano. E é nesse panorama que o repertorio das PIC, com seu vasto arsenal de recursos, pode contribuir para a melhoria da saúde pública, pois descende de uma tradição milenar de uso continuado e praticamente inalterado dos mesmos recursos tecnológicos pautados por natureza interdisciplinar2.

Ao partir desse pressuposto, o uso das PIC no Sistema Único de Saúde (SUS) merece reflexão, especialmente quando se investiga o sentido de sua adoção na política nacional de um país como o Brasil, uma sociedade complexa que tem incorporado recursos tecnológicos cada vez mais sofisticados e dispendiosos1.

No Brasil, o SUS reconhece e incorpora o uso de novas abordagens de cuidado por meio da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), instituída pela Portaria nº971, de 03 de maio de 20063. A PNPIC completa, em 2019, treze anos de publicação e é uma política intersetorial que atua na Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) em consonância com outras políticas, tais como a Política Nacional de Humanização (PNH) e a Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS), que visam a reorganizar os níveis de atenção e a auxiliar na implementação de novas técnicas de cuidado no âmbito do SUS.

Desse modo, como fruto de um processo revolucionário de mudanças e inclusão social vivenciado nos últimos anos nos mais variados segmentos da sociedade, com a expectativa de promover novos caminhos na saúde e na produção crítica de profissionais e pesquisadores, abarcando a totalidade da sociedade, bem como pelas vivencias dos autores, este estudo nasce da experiência de um Núcleo de Ensino e Pesquisa em Práticas Integrativas e Complementares (NEPPICS) de uma Instituição de Ensino Superior (IES) no Estado da Bahia, que vem somando algumas experiências exitosas na área de pós-graduação no contexto brasileiro nos últimos anos.

O NEPPICS é formado por docentes, discentes e profissionais da saúde, totalizando 12 participantes. Esse núcleo foi criado em março de 2016, sob a liderança de um docente do Departamento de Saúde II da Universida de Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), tendo como colaboradores do grupo mestrandos do Programa de Pós- Graduação em Enfermagem e Saúde (PPGES), graduandos de Odontologia e profissionais de Enfermagem e Psicologia.

Neste contexto, este artigo tem por objetivo apresentar uma reflexão acerca da expansão da PNPIC no SUS nos últimos 13 anos, no Brasil, tendo como pano de fundo analisar, no âmbito da pesquisa científica, a implantação das PIC nos serviços de saúde e a implicação dos próprios autores nessa experiência.

Materiais e métodos

Diante da necessidade de discussão do tema, aliada à urgência de mais estudos e de experiências que reflitam a expansão das PIC no Brasil e o processo de implantação no SUS, adotou-se como recurso metodológico a revisão integrativa por compreender que esta metodologia de trabalho acadêmico possibilita, além de agregar a produção acadêmica, a expressão dos autores. Segundo autores,4 a revisão integrativa da literatura teórica e empírica insere um vasto leque de propósitos: definição de conceitos; revisão de teorias e evidências e análise de problemas metodológicos de um tópico particular.

A revisão integrativa pode ser definida como uma pesquisa na qual o revisor está principalmente interessado em inferir generalizações acerca de questões substantivas de um conjunto de estudos que as tematizam. Neste sentido, a revisão integrativa deve explorar os estudos com eventualidades concorrentes, sugerir novas questões teóricas e identificar a necessidade de novas investigações5.

A questão que ensejou este estudo nasceu de discussões, vivências e da implicação dos autores com a temática no NEPPICS, bem como das reflexões no âmbito da disciplina de Políticas, Planejamento e Gestão em Saúde do Programa de Pós-graduação em Enfermagem e Saúde (PPGES) da mesma instituição.

Os dados aqui apresentados foram separados em dois grupos. O primeiro traz uma análise da produção acadêmica nos últimos 13 anos (2006 a 2019) e o outro, uma linha do tempo detalhada sobre a expansão das PIC no SUS. A busca dos dados foi realizada no período de março a abril de 2019, na base de dados Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), utilizando as palavras-chave: Práticas Integrativas e Complementares e Terapias Complementares.

Como critérios de inclusão, foram adotados artigos completos, na língua portuguesa, que foram publicados entre 2006 a 2019, referentes às PIC. Foram excluídos os artigos em duplicidade e aqueles que não abordavam os processos relacionados à implantação das PIC nos serviços de saúde. Assim, no primeiro momento da busca, foram encontrados 128 artigos e, após a primeira avaliação, levando em conta o título e o resumo em relação ao tema, restaram 50 artigos. Em um segundo processo de filtragem, mediante a leitura dos resumos, restaram 15 artigos, dos quais, após leitura minuciosa de cada texto, foram selecionados sete trabalhos que compuseram o corpo deste estudo.

Resultados

Para melhor compreensão dos dados encontrados, os artigos referentes à temática estão apresentados na figura 1.

Fonte: dados coletados pelos autores

Figura 1 -Caracterização dos artigos por autor, ano, objetivo, método e a região da coleta. Jequié/BA, 2019.  

A figura 2 apresenta a exposição da linha do tempo detalhada sobre a expansão das PIC no SUS, no período de 1985 a 2018.

Figura 2 -Linha do tempo detalhada sobre a expansão das PIC no SUS. Jequié/BA, 2019. 

Fonte: Portaria n° 971, de 3 de março de 20063; Portaria n 1600, de 17 de julho de 2006; PNPIC (2015)13; Portaria n° 849, de 27 de março de 201714; Portaria n° 702, de 21 de março de 201815. Dados coletados pelos autores.

Percebe-se, ainda, a existência de uma linha tênue entre a aplicabilidade das PIC e o incentivo governamental para a sua ampliação e divulgação, visto que, para a maioria dos usuários e profissionais de saúde, ainda são um tabu estas práticas, além de evidenciar desconhecimento, até mesmo dos profissionais e estudantes da área de saúde, sobre a importância das PIC. Contudo, algumas dessas práticas são muito utilizadas pela população, porém, são reconhecidas com denominações diferentes, pautadas em saberes familiares ou de ordem empírica.

Diante das reflexões apresentadas neste estudo, é possível observar, ao longo dos últimos 13 anos, a presença da expansão das PIC, sobretudo nas regiões Nordeste e Sudeste, sendo inegável o impacto positivo das PIC no Brasil. Apesar dos investimentos na região Nordeste, dada a sua carência no acesso a serviços básicos, uma iniciativa dessa natureza traz um elenco de possibilidades para a comunidade local.

Discussão

Apesar de recente, a instituição da política nos serviços de saúde é fruto da persistência histórica de diversos atores que, desde a década de 1980, envidam esforços para a sua inserção no Sistema Único de Saúde (SUS)6.

Após diversas discussões e debates, a PNPIC foi instituída em 2006.

No Brasil, alguns municípios e Estados regulamentaram a política de PIC, destacando-se a Política Municipal de PIC do município de Vitoria/ES, que foi construída a partir do envolvimento de atores sociais e institucionais11, e a política municipal de PIC de Recife, que foi desenvolvida a partir de instâncias superiores e líderes da gestão6.

Ainda há registros de políticas regulamentadas de PIC em São Paulo e Brasília10. Em Itajaí (SC), a prática do doin, associada ao uso da homeopatia, foi introduzida na Estratégia Saúde da Família (ESF), em 2006; Fortaleza (CE) desenvolve o Projeto Quatro Varas com base na Terapia Comunitária e nas técnicas de massagens; em Belo Horizonte (MG), desenvolve-se o Programa de Homeopatia, Acupuntura e Medicina Antroposófica, atendendo em 21 Unidades de Saúde16.

Em Camaçari (BA), identifica-se, dentre as práticas corporais terapêuticas da Medicina Tradicional Chinesa (MTC), o Lian Gong, utilizado para o tratamento e prevenção de quadros álgicos e patologias crônicas, baseado em técnicas milenares da massagem Tui-na e treinamentos terapêuticos. No âmbito do SUS, foi iniciada sua prática desde 2010, em Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) II, expandindo para associações de moradores. O município teve aprovação da 7ª Proposta pela Plenária da 6ª Conferência Municipal de Saúde, em julho de 2015, reforçando o compromisso com a implantação e ampliação das PIC, em especial, o Lian Gong e TCI17.

De acordo com esse cenário e as proposições políticas de ampliação do conhecimento sobre as PIC, o municipio de Palmeiras (BA), em 2017, estabeleceu a Política Municipal de PIC (PMPIC), visando a dar subsídios para a realização e incorporação de atividades que já aconteciam nos programas do SUS na comunidade alternativa do Vale do Capão, principalmente na USF de Caeté-Açu, enfatizando abordagens exitosas como: Neo-Hipocratismo (Naturologia); Ioga; Fitoterapia; Quiropraxia; Acupuntura; Medicina Antroposófica; Massoterapia em diferentes aplicabilidades e técnicas; inclusão de saberes tradicionais, como os conhecimentos empíricos de rezadeiras e raizeiros14.

Esse avanço pode ser entendido como expressão de um movimento que se identifica com novos modos de aprender e praticar a saúde, já que essas práticas se caracterizam pela interdisciplinaridade e por linguagens singulares, próprias, que, em geral, se contrapõem à visão altamente tecnológica de saúde que impera na sociedade de mercado, dominada por convênios de saúde cujo objetivo precípuo é gerar lucro e fragmentar o tratamento do paciente em especialidades que não dão conta da totalidade do ser humano em busca de remédio para seus males1.

A PNPIC surgiu da necessidade de se definirem abordagens para essas práticas em todo o território nacional, visto que, anteriormente, as experiências estavam ocorrendo de forma desigual e desorganizada. Sua implementação justifica-se por fatores de natureza política, técnica, econômica, social e cultural.

As PIC, no Brasil, passaram a ser objeto de interesse governamental de tal modo que, recentemente, o Ministério da Saúde (MS) implantou regulamentações de estímulo à difusão da medicina complementar nos serviços do SUS. Ao partir da perspectiva de que as políticas de saúde se materializam na ponta do sistema por meio de ações dos diversos atores sociais, merece atenção o surgimento de novas práticas de saúde distintas da racionalidade médica ocidental8.

No entanto, consideram-se como empecilhos prováveis para a implantação e implementação das PIC no SUS o desdobramento do desmonte do Estado iniciado em 2016 e a nova conformação política que o país vivencia desde 2017, com a Proposta de Emenda Constitucional - PEC 95, que congela os investimentos públicos em 20 anos, sendo percebidos os seus impactos com cortes substanciais dos financiamentos à Saúde, que podem assim prejudicar os avanços das PIC no sistema público de saúde.

Por outro lado, nas últimas décadas, houve uma crescente revalorização das PIC com o aumento da demanda, legitimação social e regulamentação institucional delas, inclusive, em países de alta renda18, em que o uso da biomedicina está bem estabelecido e disseminado.

Tal relação foi comprovada por meio do aumento crescente no volume de pesquisas científicas sobre várias PIC e sua institucionalização nos serviços de saúde18. Parte do uso dessas terapias ocorre de forma autônoma, antes, depois ou em paralelo ao cuidado biomédico, em contexto de pluralismo de cuidados à saúde. Esse avanço científico e institucional foi induzido pela crescente popularidade dessas práticas pelas populações devido ao fácil acesso e eficácia relativa em locais de baixa renda, insatisfações com a biomedicina, movimentos culturais fomentadores da revalorização das PIC, estímulo à participação no cuidado, melhor experiência e relacionamento terapeuta-usuário1.

Embora haja um crescimento de pesquisas sobre as PIC no Brasil, observa-se, ainda, a necessidade de expansão de novas pesquisas. Isso pode ser evidenciado analisando três aspectos: fomento à pesquisa, grupos/linhas de pesquisas e publicações. No que se refere ao fomento, Sant’ana19 analisou, entre os anos de 2002 e 2014, 173 editais, sendo 172 oriundos do Sistema Pesquisa Saúde. Destes, 110 eram editais do tipo Programa Pesquisa para o SUS (PPSUS) (estaduais) e 62 editais do tipo Fomento (nacionais), encontrando que, apesar de as PIC não terem uma subagenda de pesquisa, foram contempladas em 19 editais, perfazendo 1% de todo o investimento no período, principalmente em editais do campo biomédico. O Nordeste teve o maior volume de investimentos nesse tema, recebendo R$ 1.584.274,84 para a execução de 32 projetos.

Sobretudo, as PIC concentram em si o importante e estratégico desafio de romper com o monopólio tecnológico da farmacoterapia no cuidado terapêutico, excessivamente medicalizador e iatrogênico. Nesse sentido, elas podem ser consideradas uma rica fonte de recursos interpretativos e terapêuticos capaz de diversificar as abordagens de muitos problemas trazidos pelos usuários aos profissionais20.

Portanto, as PIC permitem um olhar diferenciado sobre o indivíduo e o processo saúde-doença não somente como uma prática de cuidado, mas como uma estratégia que promove mudanças no modelo assistencial hegemônico em saúde, excludente no que concerne a produzir e legitimar saberes e práticas alternativas, ao centralizar a saúde em detrimento da doença, com enfoque no cuidado/autocuidado, autonomia e promoção da saúde das pessoas e coletividades; desapropriação do processo normativo imposto pelo modelo biomédico e de medicalização pelas indústrias farmacêuticas, trazendo uma visão holística dos indivíduos em sua integralidade12.

Deve-se ressaltar que essa inovação tecnológica está situada em diversos Estados e municípios brasileiros, pois eles vêm incorporando essas modalidades de atenção e renovação do cuidado na saúde. Entretanto, essas práticas podem ser consideradas como estratégias de revitalização do sistema de saúde e de mudanças no padrão biologizante e medicalizante do cuidado e da Promoção da Saúde9.

Contudo, a inserção das PIC no SUS configura uma ação de ampliação de acesso e qualificação dos serviços na perspectiva da integralidade da atenção à saúde da população. Para a sua consolidação, como mais uma estratégia terapêutica e promotora de saúde no SUS, devem ser consideradas as diversas influências que interferem no decorrer deste processo: gestores; políticas institucionais; sujeitos envolvidos (e suas competências); cultura local e organizacional.

Assim, as ações a serem implantadas devem ser realizadas por meio de um processo guiado e discutido democraticamente, que promova o aperfeiçoamento e a adequação das PIC. A coparticipação no estabelecimento de ações em PIC é, de fato, tão importante quanto os resultados obtidos, pois permite a reflexão das mudanças na percepção de todos os envolvidos nesse processo7.

Conclusão

O estudo apresenta um número limitado de implantações da PIC em outras regiões. Isso pode estar relacionado às dificuldades para o seu fortalecimento institucional e, assim, compromete a sua continuidade ao ampliar a distância entre formulação e implementação e dificulta o alcance dos resultados esperados. Desse modo, cabe salientar a importância da criação de grupos e núcleos de estudo como o NEPPICS, pois fomentam o debate ao ampliar o conhecimento das práticas para a comunidade acadêmica e científica, trazendo à luz aspectos relacionados às PIC que são pouco debatidos e que se fazem necessários para a construção de profissionais de saúde que conheçam a efetividade destas como complemento aos métodos ortodoxos da medicina tradicional, bem como a responsabilidade e adequação do seu uso e recomendações dentro da realidade que estarão inseridos como profissionais.

Ao longo deste estudo, embora se tenha verificado a existência, no contexto brasileiro, de artigos e marcos legais que tratam da PNPIC, não se logrou encontrar na produção nacional experiências que analisassem a implantação dessas práticas. Diante do exposto, reafirma-se a necessidade de se empreenderem novos estudos acadêmicos no que se refere aos movimentos de implantação da PNPIC no Brasil, com vistas a análises direcionadas a redução significante de recursos financeiros, principalmente pelo período político e econômico que o Brasil enfrenta atualmente.

Declaração de Direito Autoral

Os autores desta revista terão direito de copiar seus documentos sem restrição, assim como também manterão os direitos de publicação em seus artigos.

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1Institución: Universidad Estatal del Sudoeste de Bahia - UESB

2Instituição: Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB

3Instituição: Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB

Recibido: 23 de Junio de 2019; Aprobado: 14 de Octubre de 2019

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