Introdução
A síndrome respiratória aguda grave 2 (SARS-CoV-2), acarretada pelo novo coronavírus, que originou-se em Wuhan1, China, no fim de 2019, e nomeada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como COVID-19, é causadora da atual pandemia2 e teve seu primeiro caso confirmado no Brasil no dia 26 de fevereiro de 2020. Em 07 de maio de 2020, esta síndrome acometia cerca de 135.106 pessoas no Brasil, com o total de 9.146 óbitos, evoluindo rapidamente para 271.628 casos e 17.971 óbitos no dia 19 do mesmo mês3, remetendo a repensar o contexto cotidiano brasileiro, sobretudo, nos aspectos emocionais e fisiológicos. A pandemia da COVID-19 vem trazendo inúmeros desafios para a contenção da proliferação do vírus e redução do número de casos4.
Uma das condutas efetivas para reduzir o ritmo de propagação do vírus na comunidade é o distanciamento social, higienização das mãos e superfícies e uso de máscaras5. O isolamento já realizado em diversos países ao redor do mundo, tem se mostrado como uma medida eficaz para redução do quantitativo de casos1,2,4. O distanciamento social, que tem como objetivo reduzir as interações entre as pessoas de uma comunidade para diminuir a velocidade de transmissão do vírus3, ainda que feito de forma temporária, pode contribuir para o desenvolvimento de condições que interferem diretamente nas emoções de cada indivíduo como o surgimento de incertezas, medo e ansiedade.
Nesta linha de raciocínio, entende-se que o cuidado da saúde física e mental seja um fator preponderante neste momento de pandemia e confinamento. Sendo assim, torna-se imperativo a discussão sobre os impactos emocionais e fisiológicos do isolamento durante a pandemia de COVID-19 durante o período de distanciamento social, para beneficiar no delineamento de estratégias que possam contribuir para a prevenção de riscos e agravos à saúde da população.
Algumas consequências do distanciamento social são depressão, ansiedade, desinteresse, perda de apetite, desregulações no sono, retardo ou agitação, incapacidade de concentrar-se ou até mesmo tentativas de suicídio6. Em casos de depressão e ansiedade, estes sintomas podem ser intensificados, manifestando-se em indivíduos relativamente saudáveis, e algumas das alterações são: desinteresse para estudar, falta ou inexistência da realização de atividades físicas, problemas quanto à alimentação, entre outros.
Diante do panorama de pandemia da COVID-19 e consequente distanciamento social, emerge a necessidade da compreensão dos possíveis riscos e agravos à saúde da população. Portanto, este estudo teve como objetivo avaliar os impactos emocionais e fisiológicos do distanciamento social durante a pandemia da COVID-19.
Materiais e método
Tratou-se de uma pesquisa de levantamento de natureza aplicada, descritiva com delineamento transversal e abordagem quantitativa. Os sujeitos da pesquisa foram 238 indivíduos, de ambos os sexos, de diferentes faixas etárias, que estavam submetidos ao distanciamento social, durante a pandemia da COVID-19, recomendado pela OMS e autoridades de saúde locais3 e que aceitaram participar da pesquisa e quanto a menores de idade tiveram o assentimento do responsável legal. Os critérios de inclusão foram: estar cumprindo isolamento social e possuir equipamento eletrônico digital com acesso à internet que possibilitaria à resposta ao questionário enviado. Os critérios de exclusão foram: não residir no Brasil e respostas duplicadas a partir do email do participante. A amostra foi não probabilística utilizando.
A técnica utilizada é conhecida como bola de neve (snowball). Trata-se de processo de permanente coleta de informações, que procura tirar proveito das redes sociais dos entrevistados identificados para fornecer ao pesquisador um conjunto cada vez maior de contatos potenciais, podendo ser finalizado a partir do critério de ponto de saturação7. A suspensão da inclusão de novos participantes, neste estudo, aconteceu quando os pesquisadores ficaram 48 horas sem receber novos questionários, mesmo encaminhando nas plataformas, ou quando recebiam e tratava-se de indivíduos que já haviam preenchido o formulário.
Desta forma, os participantes iniciais para esta amostra foram membros da comunidade de um Centro Federal de Educação Tecnológica, localizado na região Metropolitana do Rio de Janeiro, Brasil, configurando, uma amostra por conveniência.
Para a coleta de dados foi utilizado o questionário virtual elaborado através de um serviço gratuito para criação formulários online Google®. O link para acesso ao questionário foi divulgado através de um aplicativo multiplataforma de mensagens instantâneas e de uma mídia e rede social virtual. A geração de dados ocorreu nos meses de março e abril de 2020.
O instrumento era composto por 17 perguntas fechadas e 3 abertas. As perguntas iniciais versavam sobre variáveis sociodemográficas como idade, gênero, estado civil, grau de formação e situação escolar (se estuda no momento ou não) e quantidade de indivíduos que residiam com o participante. O questionário foi submetido à um grupo composto por 10 de pesquisadores que avaliaram e validaram o questionário, após esta etapa o questionário foi preenchido por 5 indivíduos que compuseram o teste-piloto e não foram incluídos na amostra. Os participantes foram questionados quanto aos fatores emocionais, sendo estabelecidas questões com escala tipo Likert com os escores variando de: 1- Concordo plenamente; 2 - Concordo parcialmente; 3 - Neutro; 4 - Discordo parcialmente; 5 - Discordo totalmente.
Por se tratar de uma pesquisa virtual, foi criada uma seção inicial de preenchimento obrigatório com orientações, o arquivo do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) e de assentimento para download e campo para manifestação do seu aceite ou não em participar. Havendo ou não concordância em participar da pesquisa, uma mensagem de agradecimento era feita ao participante.
Os dados gerados foram contabilizados para análise quantitativa, realizados com o auxílio do software EPI INFO, apresentados em gráficos e/ou tabelas e discutidos sobre a luz dos principais referenciais pertinentes ao assunto.
Este estudo foi executado em paralelo com as atividades do Projeto de Iniciação Científica(Estudos de prevenção de riscos e agravos saúde) e de Extensão (Prevenção de riscos e agravos à saúde da população: contribuições para a prática assistencial no nível Técnico em Enfermagem) do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca - (CEFET/RJ) Unidade Descentralizada do município de Nova Iguaçu, estado do Rio de Janeiro, Brasil, que contou com a participação de alunos do ensino médio profissionalizante de enfermagem e do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos (PPDSP) e vinculado ao Grupo de pesquisas (Estudos de prevenção de riscos e agravos à saúde) encontrando-se registrado no Diretório dos Grupos de Pesquisa do Brasil (DGP) - CNPq/Lattes.
Considerações éticas
A pesquisa central foi autorizada pelo Comitê de Ética em Pesquisa CAAE: 53984716.0.0000.5254 Parecer: 1.615.195 e respeitou os princípios da autonomia, não-maleficência, beneficência, justiça e equidade, conforme prevê a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde do Brasil, que dispõe sobre pesquisa envolvendo seres humanos8.
Resultados
Entre os participantes do estudo, a faixa etária variou de 14 a 42 anos, com predominância na faixa etária de 15 a 20 anos com 164 (69%), o sexo feminino representou maior quantitativo entre os participantes com 156 (65,5%), em relação à escolaridade predominaram indivíduos com ensino médio incompleto foi 77 (32,4%) e estado civil solteiros foram 217 (91,2%) conforme os dados apresentados na Tabela 1.
Caracterização dos participantes | n / (%) |
---|---|
Idade dos participantes: | |
Menos de 15 anos | 6 / 2,5 |
Entre 15 e 17 anos | 82 / 34,5 |
Entre 18 e 20 anos | 82 / 34,5 |
Entre 21 e 25 anos | 37 / 15,5 |
Acima de 25 anos | 31 / 13 |
Total | 238 / 100 |
Gênero | |
Masculino | 80 / 33,7 |
Feminino | 156 / 65,5 |
Prefiro não responder | 2 / 0,8 |
Grau de escolaridade | |
Ensino fundamental incompleto | 7 / 2,9 |
Ensino fundamental completo | 8 / 3,4 |
Ensino médio incompleto | 77 / 32,4 |
Ensino médio completo | 56 / 23,5 |
Ensino superior incompleto | 65 / 27,3 |
Ensino superior completo | 25 / 10,5 |
Estado civil: | |
Solteiro(a) | 217 / 91,2 |
Casado(a) | 14 / 5,9 |
Divorciado(a) | 2 / 0,8 |
Viúvo(a) | 2 / 0,8 |
Separado(a) | 3 /1,3 |
Fonte: Dados da pesquisa, 2020.
Durante o período de distanciamento social proposto pela OMS, uma das recomendações das autoridades de saúde era para se evitar aglomerações. Neste sentido, os participantes foram questionados quanto ao número de moradores na mesma residência, entendendo que o distanciamento, pode diminuir a propagação do vírus. Foi evidenciado que 20% (n= 48) participantes residiam com 05 ou mais pessoas, o que pode contribuir para um maior contato entre os indivíduos da mesma família. A predominância foi de pessoas que habitavam residências com 04 pessoas (34% - n= 81) participantes. Foi demonstrado que 79% (n= 188) participantes estavam conseguindo manter o distanciamento social e entre aqueles que não estavam conseguindo manter o distanciamento 38% (n= 19) estavam saindo de casa por motivos não essenciais conforme descrito na Tabela 2.
Pessoas que moram na residência (incluir a si mesmo) | n / % |
---|---|
01 pessoa | 5 / 2,1 |
02 pessoas | 34 / 14,3 |
03 pessoas | 70 / 30,4 |
04 pessoas | 81 / 34 |
05 pessoas | 31 / 13 |
06 pessoas | 11 / 4,6 |
07 pessoas | 02 / 0,8 |
08 pessoas | 01 / 0,4 |
09 pessoas | 03 /1,2 |
Você está conseguindo manter distanciamento social? Se não, justifique. | |
Sim | 188 / 79 |
Não | 50 / 21 |
Se não, por quê? | |
Apenas indo ao médico: | 1 / 2 |
Sair para compras e necessidades | 12 / 24 |
Indo ao trabalho | 18 / 36 |
Outros (motivos não essenciais) | 19 / 38 |
Fonte: Dados da pesquisa, 2020.
Uma questão destacada entre os participantes foi com relação ao uso da internet antes e durante a recomendação do distanciamento social. Foi relatado um aumento do tempo de uso da internet por dia, estatisticamente significativo, em todas as faixas etárias e em ambos os sexos. Foi observado que este aumento do tempo de uso de internet esteve relacionado ao estudo regular ou complementar, informações sobre a pandemia no Brasil e no mundo, bem como as medidas de prevenção e tratamento e atividades de lazer, recreação e socialização, o que foi apresentado na Tabela 3.
Tempo | Antes | Durante | p valor |
Até 4 horas por dia | 61 (25,6%) | 13 (5,5%) | 0,007 |
De 4 a 6 horas por dia | 76 (31,9%) | 25 (10,5%) | |
De 6 a 8 horas por dia | 56 (23,5%) | 36 (15,1%) | |
De 8 a 10 horas por dia | 21 (8,8%) | 62 (26,1%) | |
Acima de 10 horas por dia | 23 (9,7%) | 102 (42,9%) | |
Não utiliza internet: | 1 (0,4%) |
Fonte: Dados da pesquisa, 2020.
No que tange as emoções, o questionamento inicial foi se o participante sentiu-se desconfortável e/ou desanimado e, 73,1% (n= 174) concordaram com a afirmação. Entre aqueles que concordaram totalmente com a informação, 68,6% (n= 68) eram do sexo feminino e 31,4% (n= 31) masculino. Entre os participantes que afirmaram concordar parcialmente com a informação, 66,7% (n= 50) eram respostas femininas e 33,4% (n= 25) eram respostas masculinas. Na faixa etária entre 15 e 17 anos, 50% (n= 41) concordaram totalmente com a afirmação, 28,04% (n= 23) concordaram parcialmente. Entre 18 a 20 anos, 41,5% (n= 34) afirmaram concordar totalmente e 32,9% (n= 27) concordaram parcialmente (Tabela 4).
Ainda na análise das emoções 66,5% (n= 157) dos participantes concordaram que se sentiram frequentemente ansiosos e agitados por estarem em distanciamento social. Dos 94 participantes que disseram concordar totalmente com a afirmação 78,8% (n= 74) eram do sexo feminino e 21,2% (n= 20) do sexo masculino e dos 63 participantes que concordaram parcialmente com a afirmação 66,7% (n= 42) eram respostas femininas e 21(33,3%) masculinas. Entre os que estavam na faixa etária de 15 a 17 anos, 36,6% (n= 30) concordaram totalmente e 28,04% (n= 23) concordaram parcialmente e dos 18 a 20 anos, 47,6% (n= 39) concordaram totalmente com a afirmação e 19,5% (n= 16) concordaram parcialmente (Tabela 4).
Quando questionados se sentiram-se estressados e/ou irritados 66,8% (n= 159) concordaram com a afirmação. Dentre os que concordaram totalmente 75 (74,3%) eram respostas femininas e 26 (25,7%) masculinas, 36 (35,6%) destes na faixa etária de 15 a 17 anos e 34 (33,6%) dos 18 aos 20 anos. Os participantes que disseram concordar parcialmente com a afirmação, 69% (n= 40) eram respostas femininas e 18 (31%) masculinas (Tabela 4).
No questionamento de sentiu-se triste e/ou indisposto 67,7% (n= 161) dos participantes concordaram que se sentiram frequentemente tristes e indispostos por estarem em distanciamento social. Dentre os 92 participantes que disseram concordar totalmente com a afirmação, 71 (77,2%) eram do sexo feminino e 21 (22,8%) masculino, e daqueles 69 participantes que disseram concordar parcialmente com a afirmação, 48 (69,6%) eram do sexo feminino e 21(30,4%) masculinos (Tabela 4).
Fatores emocionais | 1 | 2 | 3 | 4 | 5 |
---|---|---|---|---|---|
Sinto-me frequentemente desanimado e/ou desconfortável devido ao distanciamento | 99 41,6% | 75 31,5% | 35 14,7% | 23 9,7% | 6 2,5% |
Sinto-me frequentemente agitado e/ou ansioso por estar em distanciamento | 94 39,5% | 63 26,5% | 35 14,7% | 26 10,9% | 20 8,4% |
Sinto-me frequentemente estressado e/ou irritado por estar em distanciamento | 101 42,4% | 58 24,4% | 26 10,9% | 23 9,7% | 30 12,6% |
Sinto-me triste e/ou indisposto frequentemente por estar em distanciamento | 92 38,7% | 69 29% | 37 15,5% | 19 8% | 21 8,8% |
Fonte: Dados da pesquisa, 2020.
Escore varia de 1 a 5, quanto mais alto o escore, maior a concordância. 1- Concordo plenamente; 2 - Concordo parcialmente; 3 - Neutro; 4 - Discordo parcialmente; 5 - Discordo totalmente.
A Tabela 5 apresenta as variáveis ligadas aos fatores emocionais. Na análise univariada ficou evidenciada consistência nos dados da amostra através do t-test (Tabela 5).
Fatores emocionais | 95% CI | p valor |
Sinto-me frequentemente desanimado e/ou desconfortável devido ao isolamento social | -0.03 - 95.23 | 0,003 |
Sinto-me frequentemente agitado e/ou ansioso por estar em isolamento | 9.44 - 85.75 | 0,001 |
Sinto-me frequentemente estressado e/ou irritado por estar em isolamento | 6.69 - 88.50 | 0,002 |
Sinto-me triste e/ou indisposto frequentemente por estar em isolamento | 8.00 - 87.19 | 0,001 |
Fonte: Dados da pesquisa, 2020. CI = Intervalo de confiança; p valor - t-test
Analisando o contexto cotidiano e os impactos fisiológicos nos participantes foi evidenciado que em relação ao sono 47,5% (n= 113) não estavam tendo uma rotina adequada de sono, dormindo menos ou mais que o recomendado, ou ainda, não dormindo durante a noite. A alimentação também foi um fator impactante e deve ser observada durante o distanciamento social, visto que 55% (n= 131) dos participantes relataram não estar alimentando-se de forma satisfatória, ou seja, estavam sofrendo de falta de apetite ou alimentando-se excessivamente. Destaca-se ainda, que 79,8% (n= 190) dos participantes não estavam efetuando atividades físicas regularmente, destes 54,6% (n= 130) não estavam efetuando nenhuma atividade.
n | (%) | ||
---|---|---|---|
Sono | Menos de 6 horas | 42 | 17,6 |
6 a 8 horas | 125 | 52,5 | |
Mais de 12 horas | 27 | 11,4 | |
Não consigo dormir a noite | 44 | 18,5 | |
238 | 100 | ||
Alimentação | Alimentando de forma satisfatória | 107 | 45 |
Alimentando de forma insatisfatória | 33 | 13,8 | |
Alimentando excessivamente | 82 | 34,5 | |
Não está tendo apetite | 16 | 6,7 | |
238 | 100 | ||
Prática de atividade física | Sim | 48 | 20,2 |
Não | 130 | 54,6 | |
Às vezes (menos de 30 min/semana) | 60 | 25,2 | |
238 | 100 |
Fonte: Dados da pesquisa, 2020.
Discussão
O distanciamento social é visto como uma das estratégias para o enfrentamento da pandemia COVID-19, contudo, este contém, de maneira intrínseca, um confinamento que pode ser responsável por desenvolver fatores que, direta ou indiretamente, podem acarretar consequências psicológicas danosas ao indivíduo durante e após todos os períodos. Entende-se que o distanciamento social, é um meio fundamental de prevenção para redução da contaminação do coronavírus (COVID-19), mitigando um possível colapso do sistema de saúde9,10, considerando que mais de um terço da população mundial está em distanciamento social11.
Todavia, o que instigou desenvolver essa discussão, foi a associação do contato com outras pessoas durante o distanciamento social, sobretudo, pessoas do mesmo domicílio, no entendimento de que um número maior de pessoas na mesma residência, pode se configurar como um fator de convívio social, entretanto, com um maior risco para a contaminação. Todavia, estudos descrevem que a quantidade de pessoas por domicílio, é uma variável muito importante em tempos de distanciamento social, considerando ainda a qualidade das habitações, no entendimento de que o Brasil é um país muito diverso com condições de habitabilidade bastante desiguais, logo, o conforto e a estrutura que esse espaço tem pode fazer muita diferença nas condições desse isolamento12.
Neste estudo o questionamento sobre a manutenção do distanciamento social esteve relacionada ao motivo de não mantê-lo, demonstrando que, parcela significativa dos que não mantinham o distanciamento, o fizeram por motivos não essenciais, o que poderia contribuir para o contato com o vírus. Entretanto, estudo acerca do distanciamento social demonstraram que a grande adesão ao distanciamento por parte dos inquiridos pode ter alguma relação com o medo de se infectar, e sofrer prejuízos para saúde e financeiros, ainda maiores12.
No decorrer do período de distanciamento social, a preocupação quanto à duração do mesmo, medos relacionados à infecção, frustração ou tédio por conta da diminuição do contato social, falta de suprimentos e de informação quanto ao andamento da pandemia, além de futuros problemas financeiros são fatores de estresse que têm grande influência no humor dos indivíduos. Esses fatores, isolados ou conjuntamente, podem ser geradores de estresse entre os indivíduos. Como consequência desse processo de distanciamento social, o estresse tende a aumentar na população, pois apesar de um tempo relativamente curto já ser capaz de causar impactos à saúde mental, evidências mostram que os impactos psicológicos negativos são maiores se as autoridades determinarem um período previsto mais curto de distanciamento e depois aumentarem esse período12.
Vale ressaltar que a utilização de internet aumentou drasticamente após a instauração do distanciamento social, tendo em vista que, segundo o levantamento deste estudo, o percentual de indivíduos que utilizaram internet por períodos entre 8 a 10 horas por dia e superior a 10 horas por dia aumentou de 8,8% para 26,1% e, 9,7% para 42,9%, deste modo, tendo uma porcentagem de aumento de 195% e 342% respectivamente. As opções que apresentaram diminuição no uso de internet tiveram seu percentual diminuído, como a opção até 4 horas por dia que teve seu porcentual reduzido de 25,6% para 5,5%. Tal aumento do tempo de uso de internet tem forte associação com o distanciamento social, sobretudo pela afirmativa de que a internet permite a rapidez para estabelecer contatos sociais e as ferramentas disponibilizadas favorecem a possibilidade de romper barreiras como o distanciamento geográfico e agilizar o excesso de compromissos13.
As estratégias mais utilizadas para manter o contato social no distanciamento segundo o levantamento foram telefone celular, computador e redes sociais. Ademais, relacionado aos meios utilizados para informarem-se a respeito da COVID-19, houve predominância para internet e televisão. Estudos demonstraram que a informação é fundamental para a população, pois a divulgação, desde maneiras de manter a higiene até a necessidade do distanciamento, ajuda na prevenção, o que reduz a vulnerabilidade11. Foi ratificada a afirmativa feita por jovens de que a internet ocupa muito seu tempo13.
Uma das influências do estresse na vida das pessoas referiu-se às alterações no sono12. Uma diminuição no quantitativo das horas de sono, de maneira a fugir do estimado e recomendado (8 horas), de forma contínua pode ocasionar danos psicológicos. Em meio à pandemia, os níveis gerais de estresse e ansiedade aumentaram e consequentemente o sono dos indivíduos foi prejudicado.
O estresse é ratificado pelos dados obtidos no levantamento consoantes com outra pesquisa na qual 73% dos participantes concordaram que se sentiam estressados12, valor próximo do obtido nesta pesquisa 66,8%, ou seja, um percentual significativo dos participantes. Este mesmo estudo apontou o estresse como uma das principais consequências do distanciamento social12.
Pesquisa realizada com metodologia semelhante apontou resultados similares quanto às alterações na rotina do sono dos indivíduos, onde 56% dos participantes daquela pesquisa não estavam tendo uma rotina de sono satisfatória12, enquanto neste estudo foram relatadas alterações na rotina de sono em 47,5% (n= 113) dos participantes. Ainda naquela pesquisa foi constatado que 26% dos entrevistados estavam dormindo mais que o habitual e 31% estavam dormindo menos horas que o habitual, o que se aproxima bastante dos resultados obtidos nesta pesquisa, o que mostrou que os participantes estavam dormindo mais do que o habitual 11,4 % (n= 27) e 36,1% (n= 86) estavam dormindo menos do que o habitual.
Diversas circunstâncias estressogênicas podem agir direta ou indiretamente na saúde física e mental. Sabe-se que o distanciamento social é uma característica evidenciada em pessoas acometidas pela depressão14. Paralelamente a esse estudo, emergiu uma questão, evidenciada em diversos países que estão vivenciando o distanciamento social, que é a violência doméstica. Embora não seja o foco deste estudo, esse questionamento pode contribuir para investigações futuras, visto que, poderiam estar presentes entre os participantes como visto na China, onde os registros policiais de violência doméstica triplicaram durante a pandemia, na Itália, na França e na Espanha onde também foi observado aumento na ocorrência de casos após a implementação da quarentena domiciliar obrigatória15.
Outro aspecto de destaque na atual conjuntura cotidiana e de saúde, é a depressão, vista como uma preocupação pelas autoridades de saúde pública, principalmente, pelos efeitos deletérios que podem ser acrescentados à saúde e à qualidade de vida14. A alteração do sono pode ter sido desencadeada pelo estresse que predispõe e contribui para o seu desenvolvimento.
A privação do sono e suas alterações, quando persistentes, ocasionam danos no Sistema Nervoso e podem gerar fadiga, diminuição do nível de alerta e da velocidade do pensamento, irritabilidade, dificuldades nos relacionamentos familiares, restrição da participação em atividades sociais, dificuldade de percepção, concentração e memória, sonolência durante o trabalho cefaléias matinais, transtornos comportamentais e psiquiátricos e tendência à depressão16,17.
Outra variável importante relacionada à saúde e ao bem estar das pessoas é a prática de atividades físicas. Com o contexto do distanciamento social, realizar exercícios físicos tornou-se um desafio12. Compreendendo a necessidade de expressar como os fatores fisiológicos interferem no organismo dos indivíduos que se encontram em distanciamento social devido à pandemia COVID-19, evidencia-se a necessidade de fazer uma correlação entre o consumo alimentar e a prática de atividade física durante esse período, visto que é descrito que a relação do excesso de peso com a prática insuficiente de atividade física também parece afetar a qualidade do sono18.
Reconhece-se que o consumo alimentar e a prática de atividade física são considerados fatores que impulsionaram ou dificultaram a adequação de estilos de vida saudáveis. Investigações em estudantes demonstraram que o aumento do número de refeições por dia observando a quantidade e qualidade da montagem dos pratos, o número de horas em frente à televisão e o baixo nível de atividade física poderiam ter efeito promovedor de sobrepeso e obesidade19,20.
Nesta linha de raciocínio foi evidenciado que neste estudo 54,6% dos participantes não estavam efetuando qualquer tipo de atividade física, o que pode ser mais um dos fatores para o aumento de estresse, ansiedade e desânimo durante esse período. É comprovado que a prática de atividades físicas regularmente traz inúmeros benefícios à saúde do ser humano e ainda contribui para a redução dos níveis de estresse, ansiedade, depressão, aumento do humor, do bem estar e da disposição física e mental20-22.
Conclusão
Sendo assim, entendeu-se que os resultados obtidos demonstraram que os aspectos emocionais e fisiológicos do distanciamento social durante a pandemia da COVID-19 possuem potencial significativo para impactar diretamente na saúde física e mental dos indivíduos. Neste sentido, acredita-se que é necessário a implementação de ações de orientação e intervenção precoce dos possíveis riscos e agravos para saúde dos indivíduos, respeitando-se as imposições de distanciamento social e as peculiaridades inerentes ao período vivenciado.
A contribuição principal para a prática e implicação deste estudo, foi a demonstração dos fatores de risco para a saúde da população. Esta pesquisa possuiu limitações por tratar-se de estudo de corte transversal, no qual não é possível estabelecer relação de causa e efeito, entretanto, o estudo apresentou razões para investigações futuras na população em distanciamento social, a fim de melhor compreender a relação entre aspectos emocionais e psicológicos dos indivíduos.
Conflito de Interesses: Os autores declaram não haver conflito de interesses.