SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
 issue36Cases of tuberculosis coinfectedwith HIV in a state in the Brazilian NortheastThe phenomenon of the conspiracy of silence in patients in palliative care: an integrative review author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

Journal

Article

Indicators

Related links

  • Have no similar articlesSimilars in SciELO

Share


Enfermería Actual de Costa Rica

On-line version ISSN 1409-4568Print version ISSN 1409-4568

Enfermería Actual de Costa Rica  n.36 San José Jan./Jun. 2019

http://dx.doi.org/10.15517/revenf.v0i36.33657 

Artículo

Acidentes de trabalho: percepção do adolescente

Accidentes en el Trabajo: percepción del adolescente

Accidents at work: perception of the adolescent

Luciene Aparecida Muniz1 

Cezenário Gonçalves Campos2 

Márcia Christina Caetano Romano3 

Patrícia Pinto Braga4 

1 Fisioterapeuta, Especialista em Saúde do adolescenteUniversidade Federal de São João Del Rei. UFSJ. Correio eletrônico: lucieneaparecidamuniz@yahoo.com.br

2 Fisioterapeuta, Especialista em Saúde do adolescente, Universidade Federal de São João Del Rei. UFSJ. Correio eletrônico: cezenario@yahoo.com.br

3 Professora Adjunta, Universidade Federal de São João Del Rei. UFSJ. Correio eletrônico: marciachristinacs@gmail.com

4 Professora Adjunta, Universidade Federal de São João Del Rei. UFSJ. Correio eletrônico: patriciabragaufsj@gmail.com

Resumo

Pesquisa que objetivou analisar a vivência de adolescentes trabalhadores acerca de acidentes de trabalho. Tratase de um estudo qualitativo com intervenção educativa, realizada em uma escola estadual, com 19 adolescentes que desempenhavam atividade laboral, comidades entre 14 e 18 anos. Para a coleta de dados utilizou-se um questionário e roteiro de entrevista aplicado em duas etapas, antes e após a intervenção por meio de rodas de conversa. Os dados foram analisados com base na análise de conteúdo temática de Bardin (2011) que permitiu identificar a vivência dos adolescentes sobre acidentes no trabalho no que se refere ao comportamento de risco e pensamento mágico, além de demonstrar suapercepção sobre o tema a partir da experiencia nas rodas de conversa. Conclui-se que este trabalho é importante para os adolescentes, pois oportunizou a construção de um novo conhecimento acerca dos riscos de acidentes de trabalho ao qual possam estar expostos e assim tomar decisões acerca do cuidado com a sua saúde.

Palavras-chave: accidentes-de-trabalho; adolescente; prevenção-de-acidentes

Resumen

Esta investigación tuvo como objetivo analizar la vivencia de adolescentes trabajadores sobre accidentes de trabajo. Se trata de un estudio cualitativo con intervención educativa, realizado en una escuela estatal, con 19 adolescentes que desempeñan actividad laboral, con edades entre 14 y 18 años. Para la recolección de datos se utilizó un cuestionario y una entrevista aplicada en dos etapas, antes y después de la intervención a través de ruedas de conversación. Los datos se analizaron con base en el análisis de contenido temático de Bardin (2011) lo que permite identificar la vivencia de los adolescentes en accidentes en el trabajo en lo que se refiere al comportamiento de riesgo y el pensamiento mágico; además, de demostrar su percepción en el tema a partir de la experiencia en las ruedas de conversación. Se concluye que este trabajo es importante para los adolescentes, pues se creó la construcción de un nuevo conocer sobre los riesgos de accidentes de trabajo al cual puedan estar expuestos y así, poder tomar decisiones sobre el cuidado con su salud.

Palabras clave: accidentes-de-trabajo; adolescente; prevención-de-accidentes

Abstract

The objective of this research was to analyze the experience of adolescent workers about work accidents. It is a qualitative study with educational intervention, carried out in a state school, with 19 adolescents who work, with ages between 14 and 18 years. For data collection, a questionnaire and an interview applied in two stages were used, before and after the intervention through conversation wheels. The data was analyzed based on the thematic content analysis of Bardin (2011), which allows identifying the experience of adolescents in accidents at work in terms of risk behavior and magical thinking; in addition, to demonstrate his perception in the subject from the experience in the conversation wheels. It is concluded that this work is important for adolescents, because it created the construction of a new knowledge about the risks of work accidents to which they may be exposed and thus, be able to make decisions about the care with their health.

Keywords: accident-prevention; teenager; work-accidents

Introdução

A adolescência caracteriza-se comoum período de transformação entre a vida infantil para a adulta, em que acontecem intensas e profundas mudanças, físicas, biológicas, psíquicas e sociais. São considerados adolescentes segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) sujeitos que estão na faixa etária de 10 a 19 anos e segundo o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), entre 12 e 18 anos 1,2.

Observa-se que nesse período, é comum ocorrer a inclusão do adolescente no mercado de trabalho. Porém, quando estes desenvolvem atividade laboral com funções de riscos e sem nenhum treinamento, há repercussões desfavoráveis em suasaúde, podendo ocasionar doenças e acidentes que, muitasvezes, resultam em sequelas3.

As causas referentes aosAcidentes de Trabalho (AT) neste grupo etáriopodem estar associadas à imaturidade, desatenção, circunstancias inadequadasdo trabalho, falta de prevenção e o não uso de equipamentos de segurança4.

O comportamento de risco para AT nessa população podem estar relacionado a algumas características psicológicas comuns à adolescência. Onde observam-se atitudes de conduta contraditórias e sensação de estar protegidos de qualquer evento. Permitindo-nos compreendermelhor este período da vida, o qual alguns adolescentes sentem o desejo de vivenciar o novo e expor-se ao risco5.

Em algumas regiões do Brasil, o trabalho pode ser visto culturalmente como forma de retirar os adolescentes da rua e com objetivo de evitar possíveisenvolvimentoscom a delinquência e criminalidade. O trabalho também tem o intuito de tornar o adolescente mais responsável e contribuinte da renda familiar6.

De acordocom os dados do “Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010, há 3,4 milhões de crianças e adolescentes de 10 a 17 anos de idadetrabalhando no Brasil”. Torna-se importante ressaltar o que significa esta atividade laboral na vida do adolescente, visto que essadiminui o tempo disponível para o lazer, a família e a educação7.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) configura como proibido o trabalhoaos adolescentes menores que 14 anos, sendo que entre 14 e 16 anos as atividadeslaboraissão permitidas em regime de aprendiz, e, acima de 16 anos o trabalho é lícito no Brasil, desde que seus direitos trabalhistas e previdenciários sejam respeitados2.

Porém, observa-se que muitos adolescentes executam atividade laboral na informalidade, sem nenhuma vigilância, sujeito a funções que podem gerar transtornos em sua saúde3, 4.

Dados referentes ao ano de 2013, do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), registraram 24.401 ocorrências de acidentes no emprego com jovens de até 19 anos, sendo 77,57% homens. Contudo sabe-se que há subnotificações nessa faixa etária, relacionada possivelmente, aoemprego informal3,8.

Nesse sentido, é importante ressaltar que as consequências de umacidente laboral na vida de um adolescente podem acarretar em agravos e sequelas permanentes em suasaúde, como incapacidades, limitaçõesfuncionais, morte entre outros que podem modificar seu futuro. No entanto, estestranstornospodem ser evitados através de ações de prevenção como programas educativos3,4.

Em função disso, faz-se necessárioum programa educativo e preventivo, a fim de se evitar que adolescentes sofram AT. O processo educativo se verifica quando o que se foiensinado resulta em aprendizado, tornando o aprendiz capaz de recriar e refazer o ensinado. Sendo assim, a roda de conversa, uma modalidade de prática educativa, que possibilita o exercício do pensar compartilhado, permite que os presentes reflitam sobre suas experiências transformando o conhecimento adquirido em prática9,10.

Assim acredita-se que investigar a vivência de adolescentes que exercem atividade laboral, no que se refereaoacidentesinalizou para medidas de proteção e minimização destes. Aliado a isso esta pesquisa possui relevância, pois permitiu aos adolescentes que vivenciaram as rodas de conversa, intervenção realizada durante a coleta de dados, uma reflexão acerca dos riscos que estãoexpostos e como minimizá-los.

Considerando o exposto, o estudo teve como objetivo analisar a vivência de adolescentes trabalhadores acerca de acidentes de trabalho.

Materiais e métodos

Trata-se de umestudoqualitativo, comintervenção, realizado em umaescola estadual de ummunicípio do centro oeste de Minas Gerais. Participaram na primeira etapa do estudo 19 adolescentes e na segunda e terceira etapa 18. Um adolescente abandonou a escola para trabalhar em tempo integral. Os critérios de inclusão dos participantes incluemalunos que desempenham atividade laboral renumerada há, no mínimo, 6 meses realizada no setor formal ou informal, comfaixaetária de 10 a 19 anos regularmente matriculados naescolacenário. E os que apresentaram Termo de ConsentimentoLivre e Esclarecido TCLE assinado pelos pais, juntamente com o Termo de Assentimento assinado pelo adolescente, os participantes com 18 ou 19 anos, somente apresentaram o TCLE assinado por eles. A coleta de dados foi composta por três etapas, sendo todas no ambiente escolar, em ambiente privativo, no horário de aula, no qual o aluno se encontrava (Figura 1). A primeira etapa da pesquisa constou da aplicação de umquestionário (Q1) contendo 28 questões com informações sobre os dados pessoais, socioeconômicos e anamnese ocupacional. Neste momento tambémfoi realizada uma entrevista utilizando-se um roteiro semiestruturado, com perguntas sobre a percepção do adolescente sobre acidentes de trabalho, suas causas, como evitá-los.

Na segunda etapa, foi realizada a intervenção que aconteceu por meio de três rodas de conversa. Esta é umprocesso educativo no qual o educador aprende enquantoensina pelo diálogo de seus educandos, por meio do pensar compartilhado, onde ambos refletemcriticamente, contrapondo o modelo tradicional onde o educador é detentor do conhecimento e tem a função apenas de transmitir. Alémdisso, esse método educativo possibilita a participação dos presentes e fortalece o vínculo grupal, forte característica da adolescência. Para guiar as rodas de conversa seguiu-se aabordagem da relação dialógica em Pedagogia do Oprimido proposta por Paulo Freire9, que preconiza o diálogo como forma de aprendizagem e reflexões, possibilitando que o individuo construasuaprópriahistória. Os temas das rodas de conversa foram sobre conceito de acidentes detrabalho, identificação de fatores de riscos e prevenção de acidentes, sendouma roda por semana. Todas elasforam gravadas e posteriormente construiu-se narrativas11.

A terceira etapa ocorreuuma semana após a intervenção, onde realizou-se nova entrevista, utilizando-se o mesmo roteiro semiestruturado da primeira etapa, porém com perguntas adicionais a respeito da avaliação do adolescente acerca das rodas de conversa. Todas as entrevistas foram gravadas, usando o aplicativo Smart Voice Recoder versão 2.3, baixado pelo android no celular.

Para garantir o anonimato, os adolescentes participantes da pesquisa foram nomeados com nomes de personagens adolescentes de filmes juvenis da atualidade, como Harry Potter, Hermione, Percy Jackson.

A análise dos dados obtidosnas entrevistas e durante a intervenção seguiu a orientação de Bardin (2011). Foi feitaanálise temática de conteúdo, respeitando os seguintes passos: pré-análise, leitura exaustiva e identificação de núcleo de sentidos que agrupados permitiram identificar categorias12.

Os dados oriundos doquestionário como sexo, idade, renda familiar, entre otros foram analisados a partir de estatística descritiva, através do programa Microsoft Excel. Com a construção das categorias os resultados interpretados foram discutidos a partir de literatura sobre o tema.

Considerações éticas

A pesquisa foi autorizada pelo comitê de ética e pesquisa da Universidade Federal de São Del Rei Campus Dona Lindu, CAAE: 38850314.5.0000.5545

Figura 1 Desenho do Estudo 

Resultados

Os participantes estavam na faixaetária de 14 a 18 anos e cursavam ensino médio no período matutino em umaescola do município de um centro oeste de Minas Gerais no ano de 2015.

A maioria dos participantes é homem (13), possuem vínculo empregatício (11) no setor formal, 11 declararam renda familiar de 1 a 3 salários mínimos e contribuemcom o orçamento doméstico.

Sobre ter recebidotreinamento para o trabalho, a maioria dos adolescentes (10) disse que nãorecebeuinstrução. Referente ao uso de algum equipamento de segurança individual 12 respondeu não utilizar.

Entre os participantes do estudo, 4 relata já ter sofridoalgum tipo de acidente ou doença decorrente do trabalho e 18 deles disseram gostar do serviço. A tabela 1 apresenta as características dos participantes do estudo.

Tabela 1 Características dos participantes do estudo, Divinópolis, MG,Brasil, 2015. (Frequências absolutas = fi, n=19) 

Características Frequências fi
- -
Idade (anos) -
14-16 11
17-18 8
Mulher 6
Homem 13
Vínculo empregatício -
Formal 11
Informal 8
Renda Familiar -
1-3 11
3-6 6
6-10 2
Contribui na renda Familiar -
Sim 11
Não 8
Ocupação -
Auxiliar administrativo 3
Auxiliar de escritório 1
Auxiliar de serviços gerais 2
Ajudante de instalação 1
Ajudante de lanternagem 1
Ajudante de serralheiro 2
Caixa 1
Embalador 1
Envernizador 1
Estoquista 1
Auxiliar de lava Jato 1
Manicure 1
Servente 1
Técnico de Refrigeração 1
Vendedora 1
Recebeu treinamento para o trabalho -
Sim 9
Não 10
Utiliza equipamento de proteção individual (EPI) -
Sim 7
Não 12
Sofreu doença ou acidente decorrente do trabalho -
Sim 4
Não 15
Gosta de seu trabalho -
Sim 18
Não 1

Fonte: elaboração própria

A análise das entrevistas foi composta por 18 adolescentes trabalhadores que compareceram na terceira etapa, esta permitiu identificar a vivência dos adolescentes sobre acidentes no trabalho no que se refere ao comportamento de risco e pensamento mágico, além de demonstrarem sua percepção sobre o tema a partir da experiencia nas rodas de conversa. Tal análise resultou em 3 categorias, sendo: comportamento de risco para acidentes de trabalho, pensamento mágico sobre acidentes de trabalho e percepção sobre acidentes de trabalh oconstruída a partir das rodas de conversa.

Comportamento de risco para acidentes de trabalho

Em seus discursos, os adolescentes relataram o que pensam sobre o comportamento de risco para acidentes de trabalho, principalmente no que se refere à falta de atençãon as atividades e ao descumprimento de regras.

Nesse sentido, foipossível identificar a falta de atençãonasatividadeslaborais. Segundo os participantes, o comportamento acidental está associado à desatenção que pode ocorrer durante as tarefas realizadas, seja por brincadeiras, distraçãoou descuidos relacionados ao uso de celular no ambiente de trabalho e conversas paralelas, como é possível verificar nos enunciados:

Ficar brincando no horário de serviçoaoinvés de estar concentrado no que tem que fazer. (Harry Potter) Falta de atenção no que está fazendo, àsvezes por está no celular não presta atenção. (Hermione) Aconteceu acidente comigo por causa de distração... (Rony)

A análise apontou há um descumprimento de regras durante a execução do trabalho, onde os adolescentes afirmam que frequentemente nã outilizam os equipamentos de segurançadevido à rapidez da tarefa, desânimo, esquecimento, por causaremdesconforto e por nãoterem o desejo de utilizar, como é possível verificar nos fragmentos de discurso:

Tem vez que fico compreguiça de pegar a luva, porque as vezes é só pegar umtrem e passar para o outro lado. (Luke) Comigo igual os doisfalaram, umcortezinhopequeno, umquemadinho. Nãoestava utilizando as luvas, nãogosto de usar luvas porque elassãomeio duras. (Nico) Na hora do serviçonão entra nacabeça que tem que usar os equipamentos, a gente esquece, nãoquer usar. (Jazon)

Pensamento mágico sobre acidentes de trabalho

A sensação de invulnerabilidade, ese pensamento mágico de que nada vai acontecer consigo mesmo é uma característica da própria fase da adolescência, o que aumenta a chance da ocorrência de accidentes ocupacionais, somadoao fato do desconhecimento sobre acidentes de trabalho e prevenção. Os enunciados a seguir demonstram essa percepção:

[ ...] no meutrabalhoeu mexo maiscom papéis essascoisasassim, eu até nãosei o que é para prevenir, porque lánãotem como acontecer. (Luna Lovegod) Lá onde trabalho não temperigo, nãotem nada de mais. (Thyler) [ ...] no meu serviçon ão tem riscos, a gente mexemaiscom computador esses trens. (Margo)

Percepção sobre acidentes de trabalhoconstruída a partir das rodas de conversa

A análisepermitiu identificar que alguns estudantes desconsideravam os AT comconsequências leves como sendoacidentes, reforçando a necessidade de instruções sobre AT. Após as rodas de conversa os adolescentes demonstram ter adquirido conhecimentos sobre o assunto, podendo ser verificado nos enunciados a seguir:

“No começo eu pensava que acidente de trabalho era só quando eu precisava ir ao médico”. (Percy Jackson) [ ...] porque antes, já aconteceu um acidente comigo, um cortezinho assim, eu não sabia que era um acidente de trabalho. (Harry Potter) [ ...] antes eu não sabia que um corte era um acidente de trabalho e que muitos pequenos accidentes geram grandes, foi de muitaajuda. (Dina)

O estudo evidenciou que as trocas de experiências entre os participantes nas rodas de conversa proporción aramreflexões sobre a percepção do adolescente acerca do comportamento que pode geraracidentes de trabalho, contribuindo para que os mesmos tomem atitudes e decisões para prevenção. Podemos perceber a contribuição do aprendiza do neste espaço de diálogo nos enunciados a seguir:

Foi boa, porque a gente viuopiniões dos outros, viu como as ou tras pessoas pensam a respeito de acidente de trabalho. (Margo) [

...] tipo antes eudeixava faca no bolso, agachava sem nem mesmo pensar que poderia me cortar, descia a escada correndo, àsvezesnemia de tênis, ia de sapatilha mesmo. (Dina) [

...] me ensinou muitas coisas que eunão sabia, mostroualique àsvezes até umaluva é eficiente, para estar fazendo aquele debido trabalho, para que não ocorra acidentes. (Anabeth) Aprendi a prestar maisatenção, usar os equipamentos que tem que usar tomar cuidado sempre, descansar bem antes de trabalhar. (Rony) [ .. .] aprendi muita coisa sobre segurança no trabalho. Agora a gente sabe mais, presta maisatenção no serviço. (Luke) [ ...

] eu pensava que só de estar ciente do que eu estaba fazendo e de ter prática bastante tempo, não poderia acontecer acidente comigo, maseu vi que a qualquer momento você está sujeito a ter um acidente e o equipamento de segurança os EPIs é preciso mesmo, para te assegurar de problemas futuros e antes eu não pensaba nisso, pensava que era bobagem, só mai sum alei”. (Jazon) [

...] foi uma maneira para eu adquirir mais conhecimento sobre o trabalho, como me prevenir, para não acontecer acidente comigo. (Harry Potter)

Discussão

Em relaçãoàs características dos participantes, os homens estão em maior proporção no mercado de trabalho, demostrando que eles inserem-se mais precocemente no meio laboral e desempenham ocupaçõ escommaior risco para accidentes ocupacionais como evidenciadas na presente investigação. Este resultado corrobora com outros estudos em que se identifica maior predominância do homem entre os adolescentes que trabalham, e que os mesmos desenvolvem funções de maior risco para accidentes debido ao perfil de emprego ofertados para homens13,14.

Ainda sobre características dos participantes da presente pesquisa, identificou-se uma grande parcela de adolescentes trabalhando na informalidade, sem nenhuma fiscalização. Resultados de um estudo15 com adolescentes trabalhadores na faixa de 14 a 18 anos, evidenciaram que a maior parte dos accidentes ocorreucom participantes que não possuíam carteira assinada, demonstrando a necessidade de formalização do trabalho no sentido de se prevenir os AT.

A maioria dos adolescentes desta investigação informou contribuir na renda familiar e que o trabalho em sua vida possibilita independencia financeira e ocupa o tempo ocioso. No entanto um estudo recente16 refere que o trabalho precoce e a pobreza estão relacionados àsquestões de desigualdade social. Neste sentido, um estudo evidencia que indivíduos de clases económicas médias e altas possuem chances de preparar-se e retardar sua entrada nas responsabilidades da vida adulta 17. Ao passo que a população com baixa renda pode ter a escolaridade prejudicada por ingressarem precocemente no mercado de trabalho. Nessa perspectiva a baixa escolaridade os submete a mão de obra que não exige qualificação e que fornece baixa renumeração, gerando um ciclo de pobreza, já vivenciado por seus pais. Nesse seguimento o estudo18 destaca que trabalho na adolescência é complexo e que o principal determinante é a pobreza aliada a componentes secundários sendo eles a educação e a estrutura familiar. Por tanto, país com baixo nível de educação tem rendimento mensal insuficiente para assegurar o consumo de bens e serviços básicos para todos. Em relaçãoà estrutura familiar, famílias chefiadas somente pelo pai ou pela mãe ou situação de desempregosão fatores que também justificam a entrada do filho no trabalho. Contudo, pesquisas justificam que as atividades laborais na adolescencia podem representar uma experiência positiva e relevante, sobretudo, quando o púbere experimenta umprocesso de aprendizado, contribuindo para que ele desenvolvas entimentos de independência e alta valorização. E que também sejam asseguradas condições que possibilitam o exercício ocupacional sem prejuízo à saúde, escolaridade e lazer19,20.

Em relação aos acidentes de trabalho e doenças decorrentes, 4 alunos dessa amostra referiram ter sofrido esas situações, problemática essa, bastante preocupante, principalmente quando se trata dessa faixa etária em que a repercussão de um AT pode modificar completamente sua trajetória social. De fato, um estudo realizado na Província de Cusco (Perú), com 375 alunos trabalhadores situados na faixa etária de 10 a 17 anos, 72% referiramjá ter sofridolesões leves (cortes e abrasões), 3% relataram ter-se envolvido em lesões graves (amputações, luxação e fraturas)21.

A análise desta pesquisa revelou os accidentes laborais relacionados ao comportamento de risco expresso pela distraçãoou descuido por estar brincando, conversando ou utilizando o celular no horário de trabalho. O crescente envolvimento dos adolescentes com as novas tecnologías influenciam seu padrão de comportamento, os celulares são vistos como atraentes por permitir fácil acesso ao meio externo, no entanto, pode-se tornar problemático quando se é utilizado em ambientes ocupacionais, pois estes podem causar distração, resultando em um acidente 22,23. Sobre o fator descuido, pesquisa realizada em São Paulo, com 53 estudantes, sendo separados em dois grupos: 32 alunos com experiência laboral e 21 sem experiencia demostrou que os adolescentes com experiência de trabalho relatam que os AT ocorrem devidoao descuido do trabalhador, correlacionando com o presente estudo, onde se verificou o mesmo resultado24.

Ficou evidente nesta pesquisa a percepção dos adolescentes sobre o comportamento de risco frente ao descumprimento de regras. Uma pesquisa realizada com 312 adolescentes, 70 trabalhadores explicitaram ter se acidentado e afirmam a necessidade do uso de EPI no ambiente de trabalho, no entanto, a maioria não usa qualquer tipo de EPI4. Aindaneste contexto a neurociência explica que a área do cerebro responsável pelo juízo, tomada de decisões e controle dos impulsos, no adolescente encontra- se emprocesso de maturação. Por isso, algunsi ndivíduos são impulsionados a correr riscos, sem nenhuma consciência do perigo iminente 25.

A análise permite inferir que o adolescente demonstra um pensamento mágico diante do AT. A sensação de invulnerabilidade, imortalidade e riscos à saúdesão características muitofortes no adolescente, podendo agravar o risco para AT nessafaixa etária5,26. Nessa direção, um estudo sobre accidentes ocupaciónais na adolescência relata que o gênero influencia nessa sensação de onipotência ao afirmar que os meninos expõem-se a maior comportamento de risco para acidentes por apresentar características como ousadiaperante a ameaça, imunidade frente aoperigo e intrepidez. Nesse aspecto, eles vivenciam aindamais o pensamento mágico de risco para AT, tendo também um processo de socialização diferente das meninas15.

A análise revela que os adolescentes reconstruíram sua percepção sobre AT após as rodas de conversa. Resultados semelhantes foram encontrados em uma pesquisa com 61 estudantes entre 14 e 15 anos, que participaram de um programa educativo sobre AT. Para avaliar o impacto do programa foifeitaanálise pareado de questionários aplicados em três etapas. Os resultados demostram que na segunda etapa dos 58 alunos que no início responderam incorretamente, 56 passaram a responder de forma correta27. Outroestudo realizado com meninas entre 10 a 19 anos, abordando o tema sobre gênero e sexualidade, evidenciou que o espaço das rodas de conversa possibilita que as participantes percebam-se como protagonistas de suas vidas e, por isso, capazes de questioná-las e reescrevê-las28. Assimsendo, autores reafirmam a importância de utilizar as rodas de conversas como prática educativa, pois essa metodologia é um instrumento que permite o compartilhamento de experiências e o desenvolvimento de reflexão, e que a escola se torna um ambiente propício para se abordar varios assuntos referentes aosinteresses dos alunos e dos professores29,30,31.

As rodas se mostraram realmente eficazes para ampliar o conhecimentodestes adolescentes sobre AT e contribuíram paramudanças de comportamento conforme expressona fala dos participantes envueltos nesta investigação.

Conclusões

A responsabilização dos accidentes laborais atribuídos ao comportamento dos trabalhadores, deixa invisível as condições inseguras nos ambientes de trabalho, configurando-se de grande risco ao tratar do adolescente trabalhador. São necessárias ações para tornar o trabalho do adolescente mais seguro, além de estratégias que abrangam aspectos nutricionais, lazer e esportes, estratégias para minimizar a evasão escolar e rendimento escolar, pensando que estes se encontram em um processo de desenvolvimento biopsicossocial. Considerou-se estetrabalho importante para os adolescentes, pois oportunizou a construção de um novo conhecimento acerca dos riscos de AT aoqualpossam estar expostos e assim tomar decisõescom o cuidado de sua saúde. É importante ressaltar que é necessário o favorecimento de maisespaços de diálogo no ambiente escolar, envolvendo não somente profissionais de saúde, mas os próprios educadores que estão em convívio diario com osalunos, para que ambos possam discutir assuntos diversos que envolvam o adolescente.

Referências bibliográficas

1. Arias MJF, SanabriaVM. Educação para a saúde no início da adolescência para enfrentar mudanças físicas e emocionais. Revenf. 2018; 1. [ Links ]

2. Fernandes RFM, Meincke SMK, Soares MC, Emília M, Bueno N, CorrêaACL, Alves CN. MaternidadenaAdolescência: Motivos para planejá-la. Rev enferm UFPE. 2017; 11(5): 1776-1782. [ Links ]

3. Pimenta AA, Freitas FCT, Mendes AMOC, Navarro VL, Robazzi MLCC. Acidentes de trabalho ocorridos entre adolescentes. Texto contexto - enferm. 2013; 22(2): 279-284. [ Links ]

4. Costa CPM, Oliveira DC, Gomes AMT, Pontes APM, Santos CCE. A ocorrência de acidentes de trabalhonaadolescência e o uso de equipamentos de segurança. Revenferm. 2012; 20(4): 423-428. [ Links ]

5. Silva ACA, Andrade MS, Silva RS, Evangelista TJ, Bittencourt IS, Gilvânia Patrícia Paixão GPN. Fatores de risco que contribuem para a ocorrência da gravidez naadolescência: revisão integrativa da literatura. Rev Cuid. 2013; 4(1): 531-539. [ Links ]

6. Torres CA, Paula PHA, Ferreira AGN, Pinheiro PNC. Adolescência e trabalho: significados, dificuldades e repercussõesnasaúde. InterfaceComunicSaudeEduc. 2010; 14(35): 839-850. [ Links ]

7. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo 2010: Mais de 3 milhões de crianças e adolescentes trabalhavam no Brasil. Rio de Janeiro : IBGE. 2012. [ Links ]

8. Ministério da Previdência Social. AnuárioEstatístico de Acidentes do Trabalho. Brasília: Subseção A; 2013. [ Links ]

9. Freire P. Pedagogia do oprimido. 57 Edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 2014. [ Links ]

10. Bezerra ARR. Contribuições da pedagogiafreireana à roda de conversa sobre textos literários. VIII Colóquio Internacional Paulo Freire. 2013 Set 19-21; Recife, Brasil. Campus UFPE: Pernambuco. 2013. [ Links ]

11. Cavalcante FG, Minayo MCS. Estudoqualitativo sobre tentativas e ideações suicidas com 60 pessoasidosas brasileiras. Ciência & Saúde Coletiva. 2015; 20 (6): 1655-1666. [ Links ]

12. Bardin L. Análise de conteúdo. 7º Edição. São Paulo: Edições 70. 2011. [ Links ]

13. Resende MP, Cano MAT, Mauro MYC, Oliveira DCO, Marziale MHP, Robazzi MLCC. Ocupaçõ esexercidas por adolescentes e sua relação com a participação escolar. Act Paul Enferm. 2012; 25(6): 873878. [ Links ]

14. Mota PT, Carvalho RLR, Duarte MEL, Rocha AM. Análise dos acidentes de trabalho do setor de atividadeeconômicacomércio no município de Belo Horizonte. Rev Min Enferm. 2011; 15(3): 427-433. [ Links ]

15. Santos MEA, Mauro YC, Brito CG, Machado DC. Trabalho precoce e accidentes ocupacionais na adolescência. Esc Anna Nery. 2009; 13(4): 824-832. [ Links ]

16. Helal DH. Crianças e Adolescentes no Mercado de Trabalho Brasileiro: Padrões e Tendências. Pesq e Prát Psicossoc 2010; 5(1): 83-93. [ Links ]

17. Thomé LD, Telmo AQ, Koller SH. Inserção laboral juvenil: contexto e opiniões sobre definições de trabalho. Paidéia. 2010; 20(46): 175-185. [ Links ]

18. Mota TS. Uma análise dos determinantes do trabalho infantil no estado de Santa Catarina. Revista Necat. 2016; 5 (10): 97-124. [ Links ]

19. Sousa H, Frozzi D, Bardagi MP. Percepção de Aprendizes Sobre a Experiência do PrimeiroEmprego. PsicolCiênc e Prof. 2013; 33(4): 918-933. [ Links ]

20. Silva RDM, Trindade ZA. Adolescentes aprendizes: aspectos da inserção profissional e mudançasnapercepção de si. Revista Brasileira de Orientação Profissional. 2013; 14(1): 73-86. [ Links ]

21. Schick C, Joachin M, Brinceño L, Moranga D, Radon k. Occupational injuries among children and adolescents in Cusco Province: a cross-sectionalstudy. BMC Public Health. 2014; 14: 1-8. [ Links ]

22. Picon FA, Moreira LM, Spritzer DT. Dependência de tecnologia: o desenvolvimento de umwebsite psicoeducativo. Rev Bras de Psicoterapia. 2012; 14(3): 18-24. [ Links ]

23. Balbanil APS, Krawczyk AL. Impacto do uso do telefone celular nasaúde de crianças e adolescentes. Rev Paul Pediatr. 2011; 29(3): 430-436. [ Links ]

24. Nagai R, Lefèvre AMC, Lefèvre F, Steluti J, Teixeira LR, Zinn LCS, Soares NS, Fischer FM. Conhecimentos e práticas de adolescentes naprevenção de acidentes de trabalho: estudoqualitativo. RevSaúdePúbl. 2007; 41(3): 404-411. [ Links ]

25. Giedd JN. Maturação do cérebro adolescente. Enciclop sobre o Desenvolvna Prim Infânc. 2013:1-5. [ Links ]

26. Araújo TME, Carvalho KM, Monteiro RM. Análise da vulnerabilidade dos adolescentes à hepatite B em Teresina/PI. RevEletrEnf. 2012; 14(4): 873-882. [ Links ]

27. Lima MIM, Câmara VM. Umametodologia para avaliar e ampliar o conhecimento de adolescentes do ensino fundamental sobre acidentes de trabalho. CadSaúdePúbl. 2002; 18(1): 115-120. [ Links ]

28. Sampaio J, Santos GC, Agostini M, Salvador AS. Limites e potencialidades das rodas de conversa no cuidado em saúde: uma experiencia com jovens no sertão pernambucano. Comunic Saúde Educ. 2014; 18(2): 1299-1312. [ Links ]

29. Moura AF, Lima MG. A Reinvenção da Roda: Roda de Conversa: Um Instrumento Metodológico Possível. Rev Temas em Educação. 2014; 23(1): 98-106. [ Links ]

30. Melo MC, Cruz GC. Roda de Conversa: Uma Proposta Metodológica para a Construção de umespaço de Diálogo no ensinomédio. Imag da Educ. 2014; 4(2): 31-39. [ Links ]

31. Gomes RMV, Câmara VM, Souza DPO. Modificação do conhecimento sobre acidentes de trabalho entre escolares residentes de uma área impactada por aterro sanitário. RevBrasEpidemiol. 2016; 19(3): 632644. [ Links ]

1Institución: Universidad Federal de São João del Rei

2Institution: Federal Universityof São João del Rei

3Instituição:Universidade Federal de São João del Rei

Recebido: 19 de Junho de 2018; Aceito: 20 de Dezembro de 2018

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons