Introdução
O aumento da esperança média de vida, resultante dos avanços tecnológicos e científicos na área da saúde, promovem uma crescente necessidade de cuidados paliativos.1,2
A Organização Mundial de Saúde3 define cuidados paliativos como os cuidados que procuram melhorar a qualidade de vida das pessoas doentes e suas famílias, que encaram problemas resultantes de uma doença incurável e/ou grave e com prognóstico reduzido, através da prevenção e alívio do sofrimento, com recurso à identificação precoce e tratamento rigoroso dos problemas não só físicos, nomeadamente a dor, mas também dos psicológicos, sociais e espirituais.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde, os cuidados paliativos são tanto mais eficazes quanto mais precocemente integrados no decurso das doenças, não só melhorando a qualidade de vida dos doentes e das suas famílias, como reduzindo hospitalizações desnecessárias e a (sobre) utilização de serviços de saúde.3 Defende-se hoje que o acesso a estes cuidados deve ser determinado pelas necessidades da pessoa e da sua família e não apenas pelo prognóstico sendo que é nessa linha que a evolução futura deve prosseguir.4
Uma das principais causas do sofrimento humano é a dor, tendo claras implicações na qualidade de vida das pessoas, influenciando o seu bem estar físico e psicossocial. Os enfermeiros, designadamente pela proximidade e tempo de contacto que têm com a pessoa doente, desempenham um papel fundamental no controlo da dor.5,6
Esse papel é fundamental dado que a dor se constitui uma fonte de desconforto em cuidados paliativos.7
Estima-se que afete cerca de 40% dos doentes em estadios iniciais e intermédios e até 70-80% em estadios mais avançados. Considera-se ainda que 70% da dor está relacionada com a própria progressão da doença e os restantes 30% estão relacionados com tratamentos e patologias associadas. Assim, é importante avaliar periodicamente a dor e a sua evolução através de escalas e reavaliar as causas e fatores que influenciam a sua perceção, bem como implementar intervenções ajustadas que culminem num alívio da mesma.8
Com efeito, no âmbito das suas competências e no domínio da prática profissional, ética, legal e de desenvolvimento profissional, um dos focos de atenção do enfermeiro é a dor, procurando contribuir para a satisfação da pessoa, promoção do bem¬ estar e desenvolvimento das suas potencialidades.9
Neste contexto, as intervenções não farmacológicas constituem-se um importante recurso no controlo da dor em Cuidados Paliativos,10 sendo recomendada, como boa prática, que o enfermeiro implemente intervenções não farmacológicas em complementaridade com a terapêutica farmacológica.9 As técnicas não farmacológicas não substituem as opções farmacológicas, porém, são adjuvantes úteis, dado que a eficácia da intervenção é por vezes limitada, existindo ainda a preocupação crescente sobre os efeitos adversos do controlo farmacológico da dor.11,12
A Ordem dos Enfermeiros9 define intervenções não farmacológicas como a ''aplicação de métodos ou técnicas para prevenção e/ ou tratamento da dor que não envolvem a administração de fármacos''.
Assim, recomenda que o enfermeiro tenha um papel ativo na promoção de cuidados direcionados para a eliminação ou redução da dor utilizando intervenções não farmacológicas em complementaridade com a terapêutica farmacológicas e considerando as vontades da pessoa, os objetivos expectáveis do tratamento e a evidência científica existente.
Entre as mais valias do recurso a intervenções não farmacológicas encontra-se o seu baixo custo, os reduzidos efeitos secundários,6 e a possível modificação do significado da dor, sendo que com a sua utilização, obtém-se uma reestruturação cognitiva, direcionada às cognições, expectativas, avaliações e construções que estão presentes na vivência da dor, transformando as cognições responsáveis pelas reações de ansiedade, medo e depressão.13
As intervenções não farmacológicas podem ser categorizadas como cognitivos-comportamentais, físicas e de suporte emocional com objetivos específicos direcionados para cada área de atuação.14
Decorrente de uma pesquisa preliminar na MEDLINE (via Pubmed), na CINAHL (via EBSCOhost), na JBI Database of Systematic Reviews e na Cochrane Database of Systematic Review, não foram identificadas revisões da literatura (publicadas ou em curso) neste âmbito temático específico.
Nesse sentido, decidiu-se realizar uma scoping review norteada pela metodologia proposta pelo Joanna Briggs Institute para Scoping Reviews15 com o intuito de mapear a evidência relativa às intervenções não farmacológicas implementadas por enfermeiros no âmbito do controlo da dor , da pessoa em situação paliativa.
Mais concretamente, esta revisão pretende dar resposta às seguintes questões:
1. Quais as intervenções não farmacológicas implementadas pelos enfermeiros no âmbito do controlo da dor?
2. Quais as características destas intervenções (duração, frequência)?
3. Em que contexto são implementadas?
4. Em que população foram implementadas?
Qual a perspetiva do enfermeiro, utente e família relativa à implementação das intervenções não farmacológicas?
Materiais e métodos
A opção pela scoping review tem como fundamento o seu principal objetivo: mapear as evidências subjacentes relativo a um foco de investigação, identificando lacunas e constituindo um paço prévio que possa justificar a realização de uma revisão sistemática da literatura.15 Pode constituir, adicionalmente, uma ferramenta informativa no suporte da tomada de decisão e prática clínica dos enfermeiros.
Estratégia de pesquisa e identificação dos estudos
De acordo com a metodologia proposta pelo Joanna Briggs Institute,15,16,17serão definidos critérios de elegibilidade com base nos participantes, conceito e contexto (PCC).
Assim, relativamente aos participantes (P) serão considerados estudos cujas intervenções não farmacológicas tenham sido implementadas por enfermeiros do género feminino e masculino, a pessoas com idade superior a 18 anos.
No que concerne ao conceito (C), pretendem-se estudos cujo foco sejam as intervenções não farmacológicas implementadas com o objetivo de aliviar a dor.
Quanto ao contexto (C), serão incluídos estudos realizados no âmbito dos cuidados paliativos (unidades/serviços de cuidados paliativos e hospice care)
Relativamente ao tipo de estudo, esta revisão irá considerar estudos quantitativos e qualitativos. Serão consideradas ainda revisões da literatura, dissertações e literatura cinzenta.
Relativo à estratégia de pesquisa e identificação dos estudos, serão utilizadas as bases de dados eletrónicas CINAHL Complete (via EBSCOhost), MEDLINE (via Pubmed), Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Scielo, JBI Library of Systematic Reviews, Scopus. A pesquisa de estudos não publicados irá incluir o Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP) e o OpenGrey.18
A estratégia de pesquisa abrangerá os artigos publicados em espanhol, português e inglês, nos últimos 5 anos.
As palavras-chave e expressões de pesquisa iniciais que serão utilizadas são:
''nurs*'', ''pain'', ''nonpharmacological'', ''complementary therapies'', ''hospice'', ''palliative care''.
A pesquisa será realizada em três fases. Inicialmente, será realizada uma pesquisa nas bases de dados MEDLINE (via PubMed) e CINAHL Complete (via EBSCOhost), de modo a identificar as palavras mais usualmente utilizadas nos títulos e resumos dos estudos, assim como os termos de indexação (Tabela 1). De seguida, as palavras e termos identificados serão conjugados numa estratégia de pesquisa única, ajustada de acordo com as especificidades de cada base de dados/repositório incluída na revisão. Para finalizar, a lista de referências de cada trabalho selecionado será analisada de modo a incluir potenciais estudos adicionais.
Estratégia | Número de achados encontrados |
---|---|
((((pain(MeSH Terms)) OR (pain(Title/Abstract))) AND ((((hospice(Title/Abstract)) OR (palliative care(Title/Abstract))) OR (hospice(MeSH Terms))) OR (palliative care(MeSH Terms)))) AND ((((nonpharmacological(Title/Abstract)) OR (non-pharmacological(Title/Abstract))) OR (complementary therapies(Title/Abstract))) OR (complementary therapies)MeSH Terms)))) AND ((nurs(Title/Abstract)) OR (nurses(MeSH Terms))) | 71 |
Dois revisores extrairão os dados de forma independente, com recurso ao instrumento de extração elaborado pelos investigadores (Tabela 2), de acordo com o objetivo e questões de revisão. No decurso do processo de extração de dados, o instrumento pode sofrer modificações de acordo com as necessidades de revisão sentidas pelos investigadores.
Durante este processo, os autores dos estudos poderão ser contactados para explicação de possíveis dúvidas ou pedido de informação suplementar. Possíveis divergências entre os dois revisores serão decididas pelo diálogo ou recorrendo a um terceiro revisor.
Instrumento de avaliação |
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Título de revisão Intervenções de Enfermagem não farmacológicas no controlo da dor em cuidados paliativos: protocolo scoping review |
Questão de revisão Qual a evidência relativa às intervenções não farmacológicas implementadas por enfermeiros no âmbito do controlo da dor, da pessoa em situação paliativa. |
Critérios de inclusão (PCC): População: Estudos cuja intervenção seja implementada por enfermeiros do género feminino e masculino, a pessoas com idade superior a 18 anos. Conceito: Estudos cujo foco sejam intervenções não farmacológicas implementadas no âmbito do controlo da dor. Contexto: Estudos realizados em unidades/serviços de cuidados paliativos, hospice care. |
Extração de detalhes e características do estudo Autores:___________________________________________________________________ Ano de publicação: _________________________________________________________ País de origem: ____________________________________________________________ Objetivo do estudo: _________________________________________________________ Intervenção não farmacológica implementada: ___________________________________ Características da intervenção não farmacológica: ________________________________ Contexto específico de implementação: _________________________________________ População em estudo (doentes oncológicos, não oncológicos):_______________________ Tamanho da amostra: _______________________________________________________ Perspetiva dos diferentes intervenientes (doente, enfermeiro, família)________________ Resultados obtidos: _________________________________________________________ |
Os dados serão expostos em formato narrativo, recorrendo a tabelas, de acordo com o objetivo, foco e questão de revisão. Este processo será efetuado através de consenso entre dois revisores. Divergências existentes serão decididas com recurso a um terceiro revisor. Para a questão de revisão, ''Quais as intervenções não farmacológicas implementadas pelos enfermeiros no âmbito do controlo da dor?'', as tabelas poderão incluir os dados apresentados na Tabela 3.
Para a questão de revisão, ''Quais as características destas intervenções?'' as tabelas poderão incluir os dados apresentados na figura Tabela 4.
Para a questão de revisão, ''Em que contexto são implementadas as intervenções não farmacológicas?'' as tabelas poderão incluir os dados apresentados na figura Tabela 5.
Para a questão de revisão, ''Em que população foram implementadas?'' as tabelas poderão incluir os dados apresentados na Tabela 6.
Para a questão de revisão, ''Qual a perspetiva do enfermeiro, utente e família relativa à implementação da intervenção não farmacológica?'' as tabelas poderão incluir os dados apresentados na Tabela 7.
Conclusão
O mapeamento da evidência disponível sobre intervenções não farmacológicas implementadas por enfermeiros, no âmbito do controlo da dor em cuidados paliativos contribuirá para a disseminação da evidência disponível sobre o tema.
Sustentará a possível realização de uma revisão sistemática da literatura de eficácia no âmbito da temática e permitirá identificar lacunas na literatura. Esta identificação sustentará a realização de um futuro estudo primário.
As intervenções não farmacológicas implementadas por enfermeiros no âmbito do controlo da dor em cuidados paliativos, são cruciais no âmbito da promoção do conforto, alívio do sofrimento e maximização da qualidade de vida da pessoa em situação paliativa.
É esperado que, como contributo para a prática clínica, o mapeamento da evidência científica existente relativa a esta temática, constitua um suporte à análise das intervenções não farmacológicas em prática vigentes, promovendo a sua implementação e consequente melhoria da qualidade dos cuidados de enfermagem.
Como contributos para a investigação espera-se que esta scoping review se torne um exercício prévio que justifique a formulação de questões específicas e desenvolvimento de revisões sistemáticas, sobre a eficácia de intervenções não farmacológicas. Adicionalmente esta revisão permitirá identificar lacunas na literatura e sustentará a realização de futuros estudos primários.
DECLARAÇÃO DE CONFLITOS DE INTERESSE
Os autores declaram que não há nenhum tipo de conflitos de interesse.